TRICKY FATHER
Sua família era toda de Marseille, sul da
França, seu pai era o único estranho no ninho como dizia sua avô, ninguém sabia
de aonde tinha saído, tinha aparência, sabia se vestir, bom papo, uma lábia
incrível.
Tinha um filho com cada uma das mulheres
que tinha se apaixonado por ele. Sempre
os reconhecia como seus filhos, dizia aos amigos na hora da cerveja que queria
ter um time de futebol ganhador.
Ele era o filho que destoava de todos os
outros que eram parecidos ao pai, era loiro, magro, muito branco, olhos verdes
como os de sua avó. Na verdade a partir
dos cinco anos quando sua mãe finalmente mandou seu pai as favas, ele passou a
ser criado pela sua avó, ela foi viver em Paris, trabalhando numa grande loja
Le Bon Marche, começou como vendedora, acabou com gerente de uma área da
loja. Nunca o levou com ela, vivia uma
vida de mulher solteira, como dizia sua avó.
Mas sua paixão pela moda, quem despertou
foi justamente sua velha Marie, essa sempre tinha se virado na vida, chegavam
fardos de roupas de segunda mão no porto, para serem mandadas para o “Terceiro
Mundo”, sempre tinha um fardo que vinha assinalado, que devia ser entregue a
ela.
O abriga num armazém que tinha ao fundo da
casa, ali separava as roupas, tirava as etiquetas que podia a comprometer,
iniciava um processo de revitalização da roupa, dizia sempre “em moda nada se
cria, se copia ou recria”.
Era o que fazia, analisava cada peça, imaginava
como ficaria de uma outra maneira, tirava a parte de cima, colocava de outra
roupa, ou simplesmente tirava as mangas, as remontava num casaco, ou seja
recriava tudo, depois levava para uma boutique que tinha na parte antiga da
cidade, colocava a venda com sua etiqueta.
Sempre tinha novidades, o que nunca tinha
era quantidade da mesma roupa, se a cliente queria uma parecida, a fazia
também, tinha permanentemente duas mulheres como ela, Argelinas, costurando sem
parar.
Ele acompanhava tudo isso, sentado com as
pernas cruzadas em cima da imensa mesa de corte, as vezes, se levantava, fazia
outra combinação, que sua avó gostava sempre, esse menino vai longe dizia.
Seu pai aparecia para pedir dinheiro para
ela, o afugentava com uma vassoura, sai daqui sem-vergonha. As vezes chegava a realmente bater nele.
Ameaçava de retirar a guarda que tinha
dele, ela ria as gargalhadas, que juiz vai acreditar em ti, se não trabalhas,
vives de dar calotes, experimente e verás.
Realmente era isso, vivia dos calotes que
dava.
Uma vez foi me buscar na escola, queria que
eu o ajudasse a convencer um homem que lhe emprestasse dinheiro para um projeto
que tinha.
Tu não tens que fazer nada, fique só
quieto, eu o queria ver em ação, o tinha totalmente desmitificado com pai. Tinha outros dois irmãos que estudavam na
mesma escola, reclamava dele por isso, que os metia sempre em alguma confusão.
Quando chegamos na frente do sujeito, ele
me usava como pretexto para fazer seu novo projeto.
O deixei falar, quando vi que o homem ia
soltar dinheiro, interrompi.
Se o senhor for pesquisar, vai ver que esse
sujeito é o meu pai, mas não tem a minha guarda, é um embusteiro, não o vejo a
meses, apareceu hoje na escola, para isso, enganar alguém.
Vai tirar o seu dinheiro, nem sei se me
levara realmente a casa de minha avó, ou me colocara dentro de um ônibus. Mas seu dinheiro senhor, nunca mais o verá,
se esconderá algum tempo com alguma mulher que vai enganar, viver na boa vida,
aparecera com a cara mais inocente desse mundo dizendo que não deu certo. Por isso pense bem.
O homem ficou de boca aberta, sabia da
fama, mas tinha caído na lábia dele, esse me deu um cascudo, por duas vezes
tentou colocar a mão na minha boca, para que não falasse nada.
Mas era tarde, o mal estava feito. Pelo menos nunca mais tentou me usar.
A maioria de seus filhos, aprenderam com
ele.
Eu agora trabalhava direto com minha avô,
queria ir fazer um curso de moda, o mais longe dali, para escapar, que volte e
meia aparecia para alguma coisa errada.
Minha mãe quando vinha, era num vap-vupt,
chegava num final de semana me beijava, me dava dinheiro, ia embora no dia
seguinte.
Minha avô desde cedo colocava esse dinheiro
numa conta no banco. Nessa época fez
amizade com o dono de uma loja de Londres, que a descobriu, o levou ao seu
ateliê como chamava a garagem. Agora
vendia uma parte do seu trabalho para ele. Reformava tudo, mandava para
Londres.
Eu comecei a estudar inglês, com 16 anos,
me mandou passar as férias de verão com esse homem, vi como ele se apanhava,
vendia tudo, como moda francesa, eterna, as chamava de fundo de armário, pois
serviriam para sempre.
Ele mesmo saia pelos mercados de coisas
antigas buscando peças de roupa que se pudesse reciclar, fui com ele duas
vezes, pelas cidadezinhas pequenas, ele colocava um cartaz dizendo que comprava
roupa de segunda mão, pagava uma mixaria, mas sempre conseguia coisas
interessantes.
Me disse se eu quisesse estudar em Londres,
me ajudaria. Me levou a Saint-Martin
School, para dar uma olhada, eu fiquei apaixonado.
Agora dirigia o velho carro da minha avó,
que os alemães tinham deixado em frente de sua casa, ela guardou na
garagem. Meu tio mais velho, era da
polícia, impostos, multas tudo isso ela se negava a pagar, o carro não era seu,
sim de algum maldito alemão. Ele lhe
dizia, mamãe, um dia me colocaras numa bela situação.
Era um sujeito formidável. Ria muito com sua postura, maneira de falar,
tinha uma risada que era um estrondo.
Quando tinha 16 para 17, um dos meus irmãos
aparecia sempre me pedindo o carro emprestado, eu não o fazia, alegando ter que
ir pelas vilas, buscando material para minha avó.
Ela estava muito velha, tinha sérios
problemas de artrites, de coração, se eu fosse embora, meu tio a ia colocar
numa residência de pessoas de idade.
Nas vésperas de ir embora, nunca comentava
nada com ninguém, sabendo o pai que tinha, bem como eram meus irmãos, tudo com
eles significava complicações.
A estava atendendo, pois tinha passado mal
a noite, uma espécie de chantagem, pois sabia que eu ia embora, não queria
ficar sozinha, pois sabia o que isso significava.
Meu irmão entrou como um furacão, com seu
pai, tentou me convencer a lhe emprestar o carro. Lhe disse que nem pensar, o
tinha acabado de lavar, na verdade pensava atravessar a França inteira, o túnel
até Londres, ao mesmo tempo, que pensava aonde vou deixar esse carro, não tinha
dinheiro para pagar uma garagem.
Quando dei por mim, o filho da puta tinha
saído, pegou as chaves na entrada da casa, se mandando com o carro, eu sabia
que isso significava problemas.
Voltou no dia seguinte de manhã, o vi pela
janela, o carro estava todo sujo de um barro branco, pensei esse sem-vergonha
está fazendo tráfico de drogas.
Telefonei para o meu tio, lhe contei tudo,
ele me disse, não toque no carro. Mas
minha curiosidade era grande, ele tinha deixado o carro aberto, bem como a
chave na direção, peguei umas luvas na cozinha, tinha visto isso num filme de
detetives.
Fui dar uma olhada, o banco detrás, estava
cheio de sangue, bem como se via dois furos de balas no mesmos. Sem querer olhei para baixo, vi que o tapete
estava mais alto.
Abri a porta com cuidado, levantei o
tapete, ali estava um saco plástico, cheio de merdas, drogas, outras coisas que
não sabia, mas também tinham dois rolos de dinheiro, notas de cinquenta euros, as
enfiei nas minhas calças, corri para dentro de casa.
Essas notas, escondi no fundo da minha
mochila que tinha preparado para no dia seguinte sair da cidade.
Meu tio chegou, com um grupo de policial,
justo quando um sujeito tinha tentado sair com o carro, alegava que tinha ordem
de levar o carro para uma oficina.
O levaram preso. Em seguida meu irmão chamava pelo celular,
para avisar que um homem ia levar o carro, que me dariam um novo.
Deixei meu tio escutar o que ele
falava. Lhe disse com sua voz
impostada, agora é tarde o sujeito já está preso.
Meu irmão gritava que agora estava fudido.
Uma grua levou o carro, eu disse ao meu tio
que agora corria perigo. Ele mandou um
homem buscar sua mulher para ficar com sua mãe, me fez entrar escondido, com a
mochila no seu carro, me levou para a delegacia. Dormes aqui, amanhã, te levo a estação de
trem.
Um dos seus ajudantes, aliás seu braço
direito, era um homem que me despertava desejo, era um tesão de homem.
Disse que era melhor eu dormir na sua casa,
me deixaria ele na estação, pois se vais tu, saberão para aonde ele foi.
Quando chegamos na sua casa, vi que vivia
sozinho, me insinuei para ele, ria muito comigo, quando vi que estava de pau
duro, meti a mão. Acabamos na cama,
dormi agarrado a ele, era minha primeira experiencia, ele ao contrário sabia
muito, quando viu o meu caralho avantajado, o engoliu inteiro.
No disse seguinte, queria me levar a
estação de trem, eu lhe disse que lá estariam me esperando, que me deixassem no
aeroporto, tinha estudado bem as opções.
Havia um avião da Ryanair, que saia a primeira hora da manhã para
Londres.
Nos levantamos muito cedo, tomamos um banho
juntos, fazendo sexo, ele reclamava, merda agora que encontro alguém a minha
justa medida, vai embora. A justa
medida claro era meu caralho.
Me deitei no banco detrás, para ninguém me
ver, ele estacionou no estacionamento embaixo do aeroporto, coloquei um gorro
velho dele na cabeça, comprei o bilhete, apresentando meu passaporte, neste não
tinha o sobre nome do meu pai, mas sim da minha avô, Terence Balmain, como um
dos grandes costureiros franceses. Me
chamariam posteriormente de Terry Balmain.
Se perguntavam se éramos parentes, nunca
explicava.
Cheguei a Londres, foi direto para me
encontrar com o amigo de minha avó, ele pensava que chegava dois dias depois.
Logo estava trabalhando, com o dinheiro que
tinha economizado, o da minha conta no banco, o que tinha encontrado no meu
carro, depositei tudo num banco, aluguei um pequeno apartamento, se é que se
podia chamar assim, mais parecia um quarto grande. Paguei a matricula na escola.
Iria uma parte do dia, de tarde para noite,
trabalhar para ele.
Comecei justo no dia seguinte, separei umas
quantas roupas, que estavam bem, eram todas negras dessas de ir a enterro,
soltei minha criatividade, ele como minha avó tinha duas costureiras,
Montei quatro vestidos brancos com negro,
fazendo uma mistura, os chamaria depois OP Art, mal chegaram na loja, eu mesmo
os coloquei na vitrine, se venderam em seguida.
Assim fui trabalhando, quando começaram as
aulas, fui modificando minha aparência também, convivia com gente de todos os
lugares do mundo, do pais, alguns com uma cabeça privilegiada. Alguns criavam roupas absurdas, que eu
olhava, pensava quem vai usar isso.
Ao contrário da maioria, eu tinha
experiencia, em sentar-me numa maquina de costura, reconstruir uma roupa
inteira, sabia cortar, desenhar, pensava de outra maneira, ser moderno, poder
fazer roupas práticas que se usassem.
Um dos professores, implicava comigo,
dizendo que eu era francês demais, que pensava na moda de uma maneira
comercial.
Olhei para ele, respondi que todos precisam
viver, comer, sobreviver, que fazendo coisas que não se usam, morreria de fome.
Nunca falava do que fazia a maior parte do
tempo.
Quando chegou o final do primeiro ano,
tinha que preparar uma pequena coleção de roupas, haveria um desfile na escola,
iria muita gente.
Desenhei roupas muito modernas, mas de
fácil uso.
Uma coisa que sempre tinha amado das roupas
antigas, eram as saias justas negras, com uma abertura atrás, preparei umas
quantas, algumas com botões de strass, outra com um fecho éclair todo de metal
prateado largos. Umas blusas, que eram
um escândalo, uma criava na frente um motivo geométrico que caiam por cima da saia. Ao mesmo tempo, sempre trabalhando em branco
e negro, que depois existiriam sempre em minhas coleções, OP Art, me lembrei de
uma coisa que tinha aprendido na escola, matelassê, cruzei fitas de seda branca
com negras, mas todas costuradas com fios de prata, fiz vários tipos de tops, ou
com saias justas ou largas assimétricas.
Saltos altíssimos, com meias de seda negra,
chapéus, que um amigo meu fazia, com um véu negro caindo sobre a cara dos
manequins, quando chegam no meio da passarela, subiam o véu, se via uma
maquilagem pesada negra, com um batom vermelho sangue. De uma certa maneira, eu sabia que o publico
que aparecia, vinha atrás das roupas escandalosas, deixei para o final, cinco
peças negras quase totalmente transparente, mas eram vestidos que me deram um
trabalho incrível. Como não tinha prática
de alta costura, para a fazer invisível, fiz todas costuradas com fios de
prata, que davam um toque diferente.
Quando entraram, sabia que era agora ou
nunca, se não aplaudissem eu estava lascado, tiraria uma nota baixa.
Fiquei como um louco, quando a plateia
aplaudia de pé. O professor ao que não
caia bem, não gostou muito.
Mas fui o único aluno que recebeu convites
para desenhar para lojas, alguns costureiros da equipe do júri, me convidaram
para trabalhar com eles, fiquei de fazer contato.
Dois me interessavam, pois era os melhores
da Inglaterra.
As peças ficaram em exposição, todo tempo
das férias.
Eu fui fazer nesse tempo práticas num dos
que tinham me consultado, ele estava no meio da preparação de sua coleção.
Era um sujeito completamente louco, mas com
uma ideia cênica para o desfile que era fantástica. As roupas eram super
usáveis, mas os acessórios que colocava por cima depois se vendiam a parte.
Trabalhei ombro com ombro, com ele, me
elogiava, pois as vezes encontrava a solução de como executar seu desenho
perfeitamente.
Depois do tempo de práticas, ele apresentou
suas roupas na Inglaterra, depois me levou com ele para Paris, para a semana da
Moda.
Quando perguntavam por que algumas roupas
tinham um toque diferente, ele me indicava dizendo Terry Balmain me sugeriu
isso ou aquilo.
Estive com minha mãe, ela quase não me
reconheceu, entrei na loja, ela estava dando ordens, me olhou pediu que alguém
me atendesse, que estava ocupada.
De repente se virou, ficou pasma, seu
garoto agora era diferente, tinha uns cabelos compridos, com um corte moderno,
minhas roupas desenhadas por mim mesmo, ela olhou uma foto em que estava a
coleção do desenhador inglês, eu ao lado.
Só faltou me levantar do chão, tua avó ia
adorar saber disso, ela tinha morrido a meses antes, farta segundo meu tio, de
não fazer nada, segundo ele tinha entregado os pontos.
Falou que meu pai tinha andado atrás de
mim, pelo que tinha acontecido com meu irmão, queria que testificasse a favor
dele. Contei a história, que devia
estar sendo julgado era eu, pelo que ele aprontou com meu carro.
Se ele te visse nunca reconheceria. Me perguntou por que não ficava em Paris,
afinal era a capital da moda.
Lhe disse francamente que estaria ao
alcance dele e dos meus irmãos, melhor longe.
Voltei para Londres, o desenhador, ria
muito, tinha contado minha história para ele, mas só dava entrevista falando
inglês, quando me perguntava dizia que era de lá.
Terminei a escola trabalhando ainda para o
mesmo, quando tive uma proposta para lançar minha própria coleção, pensei
muito, pois via o financeiro, levando o melhor, controlando tudo, não queria
isso para mim.
Queria um sócio que pudesse confiar, vi que
nesse mundo era muito difícil, com meu dinheiro economizado, consegui uma loja,
com a parte de cima livre para montar um ateliê, foi o que fiz, assim era
responsável de mim mesmo, tinha feito uma boa amizade com os melhores
divulgadores de moda, jornalistas, o pessoal das revistas, então foi de uma
certa maneira fácil, lancei T. Balmain, essa era minha marca. Rebusquei em muitos desenhos guardados,
modelos fácil de vestir. Lancei uma
coleção, recuperei as saias que gostava tanto, que representavam uma época das
mulheres sexis, conjugando com casacos modernos, pedia para os manequins
posarem de uma maneira que se fazia antigamente. Chamei essa coleção de Decô, pois era como
uma revisão do antigo. Depois fiz uma
já para o verão, em cima do que fazia minha avó.
Um verdadeiro patchwork, com tecidos
estampados, misturando cores, uma releitura da época da famosa liberação
sexual. Embora muitos tivessem explorado
isso, misturei saias largas, com minissaias, calças largas coloridas em
crepe. Quando me entrevistavam não
tinha vergonha de reconhecer nisso uma releitura de todo já feito.
Falei da minha avô, do muito que tinha
significado para mim.
Minha mãe veio passar as férias comigo,
acabou ficando administrando a boutique, ela tinha gosto para isso, para ser
rápida na venda, administrar tudo. Mas
arrumei um apartamento para ela, a sua maneira.
Seguia vivendo sozinho, honestamente tinha
medo de relacionamentos, via como era minha família, sabia pelo meu tio, que
meus irmãos seguiam os exemplo de meu pai, todos tinham filhos com várias
mulheres sem se casar.
Na verdade, acho que estava dessa maneira,
por trabalhar muito, conviver com gente superficial, com a que não gostaria de
conviver num dia a dia. Odiava gente que
falava demais, que de uma certa maneira me fazia me descentrar.
Na preparação de um desfile de moda,
apareceu um manequim, negro como a noite, de uma certa maneira não encaixava
com os demais. A coleção era muito mais
escura, talvez pelo que sentia emocionalmente no momento.
Fiquei olhando para ele, pedi que ficasse
parado, pensei, se as mulheres estão com roupas mais escuras, com algum detalhe
de cor, porque não faço uma serie masculina com muita cor, manequins negros,
que entrem com roupas supercoloridas, mesmo sendo de inverno.
George era da Jamaica, estudava justamente
na Saint Martin School.
Se engajou comigo, criando a parte masculina,
reconhecia que não tinha uma certa experiencia, em feminina, seu forte era o
masculino.
Funcionava, trabalhamos como loucos,
contratamos dois alfaiates, para executar casacos, durante 20 dias batalhamos
por isso.
Foi um sucesso, agora teríamos que dividir
a boutique em duas partes, alugamos uma ao lado que o dono se aposentava.
Só depois de algum tempo, começamos a nos
relacionar, principalmente porque gostávamos das mesmas coisas. Como sair do trabalho, ter a tranquilidade
de uma casa, nada de festas, de confusões, ele como eu vinha de uma família
trabalhadora, fomos a uma festa na casa do desenhador com quem tinha
trabalhado, que vivia no meio do luxo de um apartamento que tinha mandado
decorar, mas ao qual mal tinha tempo para viver.
Os dois fizemos o mesmo comentário,
comodidades sim, mas esse luxo para aparentar, nem pensar.
Partíamos do carinho para o sexo. Gostávamos
dos dias de chuva de Londres, quando todo mundo odeia isso. Na loja ampliada, colocamos uma parte de
roupas para o dia a dia, inclusive com gabardines modernas, para as pessoas saírem
nesses dias.
A coleção masculina funcionava desde os
mais jovens ao de uma idade que chamávamos da quarentena.
Mantivemos os alfaiates, fazíamos para
alguns clientes, trajes exclusivos, para atores de teatro, de cinema, que
queriam algo diferente para algum evento, mesmo para o dia a dia.
Com George sabia aonde estava pisando, ou
pelo menos pensava. Tinha um ator de
teatro, famoso nesse momento, que o vivia cortejando.
Eu lhe dizia para ir com cuidado, esse
homem quer algo mais.
Um dia entrei no provador, ele tinha
abaixado as calças do George, estava chupando seu piru, claro estava gostando
da situação. Fiquei furioso, mas
discretamente fechei a cortina.
Depois em casa falamos no assunto. Lhe deixei livre, não queria ao meu lado uma
pessoa que não me respeitasse.
Ele foi honesto, disse que de minha parte,
faltava paixão. Que me amava, mas que
faltava algo no nosso relacionamento.
No fundo era verdade, o medo de me
entregar, fazia isso.
O Ator tanto fez que George foi viver com
ele, de uma certa maneira recuperei uma certa liberdade que sentia falta.
Quando o mesmo anunciou que iria fazer um
filme em Hollywood, contratei um aluno da escola de moda, que tinha visto desde
a banca, tinha sido convidado, examinava sua coleção.
Meu antigo protetor desenhador de moda
sabia o que tinha acontecido, disse que no nosso meio um relacionamento como eu
queria era impossível.
Abdul, era de descendência Palestina, seu
pai tinha vindo se refugiar em Londres com a família, não aceitava que o filho
trabalhasse com moda.
Ele vivia de favor com uns amigos, estava
magro, meio desnutrido.
Minha mãe o tomou sobre suas asas, cuidava
dele como não tinha feito comigo, um dia disse que estava recuperando o que
tinha perdido comigo, mas sabia que minha avó era melhor do que ela nisso.
Encaixava em bem com Abdul, me dizia que
quando criança, no meio de tanta miséria, as vezes se refugiava em revistas de
modas, que nem sabiam como tinha ido parar aonde vivia.
Elas foram minha salvação, tinha um dos
irmãos mais velhos, que tinha uma agressividade impressionante, mas antes foi
visitar Abdul na loja, ele me apresentou, num dado momento, me disse encarando,
meu irmão está apaixonado por ti, nem se atreva a fazer nada que o prejudique,
volto aqui, explodo todo seu mundo.
Fui honesto, o fiz sentar-se comigo, lhe
contei o que tinha acontecido, aquele homem bruto, ficou me olhando, me soltou
sinto muito por ti, imagino como deve ser difícil confiar em alguém.
Creio que Abdul confunde o fato de estares
o ajudando a sair adiante, num mundo difícil.
Ele tinha aprendido o oficio de alfaiate,
pois isso era uma tradição familiar.
Precisávamos de um, pois um dos que
tínhamos, dizia que estava velho demais para tanta confusão de coleções, por
isso chamei Abdul, lhe expliquei a situação, vê se consegue que teu irmão
entenda a nova coleção masculina, tínhamos os dois introduzido um sistema de
corte, na roupa masculina, que lhe dava um certo ar de novidade, ao mesmo tempo
de versatilidade.
Comigo Bashar funcionava, lhe explicava o
corte, como queria a costura, ele o fazia imediatamente, lhe chamei a atenção,
pois as vezes parecia discutir com o Abdul.
Mas depois descobrir que falavam em árabe, daí minha impressão.
Abdul entendeu antes de mim que seu irmão
me queria, creio que isso o fez entender que o que sentia por mim era uma forma
de agradecimento.
Basicamente vivia na casa da minha mãe.
Quando a nova coleção ficou pronta, ele
ficou deslumbrado, normal, mas claro era ingênuo, lhe avisei, receberas propostas,
pense bem converse com teu irmão, eu gosto de ter-te ao meu lado trabalhando,
mas a vida é tua. Minha mãe falava muito
com ele, mesmo assim, para quem saiu da miséria, ser convidado para festas, que
eu nunca ia, com seus clientes ricos, o deslumbrou.
Bashar se preocupava, mas ao mesmo tempo
entendia, a principio tinha dormido numa parte do armazém, até que eu descobri,
tinha me mudado para um apartamento novo, de dois quartos, ele achou divertido,
porque tudo era muito simples, confortável.
Eu tinha escolhido esse apartamento, pois
ficava no último andar, tinha uma varanda que pensava usar nas noites de verão,
mas da sala uma das janelas dava para o Rio Támises, me relaxava de noite
sentado no escuro olhando o rio.
Quando ele foi compartir apartamento
comigo, pegou esse hábito, as vezes nos sentávamos ali quietos, um dia ele me
beijou, foi como se um fogo me estivesse abrasando, o mesmo acontecia com
ele. Me disse ao ouvido, nunca fiz sexo
com um homem, mas estou apaixonado por ti.
Finalmente entendi o George, o que ele
reclamava de mim. Faltava isso
justamente paixão.
Nos devoramos essa é a crua verdade. Fiquei louco por ele.
Mas durante o dia ele era o rei da
discrição. Apenas seu irmão percebeu,
disse que ele estava diferente, que seus olhos negros brilhavam.
Quando Abdul, recebeu um convite para ir
trabalhar em Paris, lhe alertei, qualquer coisa nos grite socorro. Mas quando o fez, era basicamente tarde,
tinham se passado dois anos, ele seguia deslumbrado por um mundo que tinha
sonhado em criança, mas não via os perigos das drogas, das bebidas.
Fomos os dois busca-lo num hospital, agora
o violento era ele, tinha uma linguagem que não tinha antes, os médicos nos
avisaram que não sabiam como, tinha Aids, que o tratamento tinha que ser
severo, pois ele não tinha tomado cuidado.
Ele se desesperou, Bashar tinha ocupado o lugar que ele tinha antes
comigo, desenvolvendo roupas masculinas, mesmo na última coleção, fiz uma parte
feminina, de roupas que as mulheres adoraram, tínhamos ido a convite a uma
caçada, fizemos a coleção em cima disso.
As tradicionais roupas femininas, vista de outra maneira. Minha mãe ria, dizendo que as clientes
finalmente tinha jogado fora o corset.
Abdul, as vezes desaparecia, ela ficava como
louca, um dia o encontraram morto com um seringa num braço.
Estive ao lado do Bashar, com toda sua
família, esse baque fez o pai, aceitar os filhos diferentes.
Quando saiu o matrimonio gay, Bashar me
pediu em casamento, não pensava em ter mais ninguém em sua vida.
Apesar de não fazer grandes coleções, pela
primeira vez me convidaram para fazer parte da semana da moda de Paris.
Ele tinha feito um curso para aprender a
trabalhar como couro, com materiais sintéticos, compramos maquinas de costura
especiais para isso.
Ele me ajudou, fiz uma coleção toda voltada
para isso, o underground, mas com toques finos, era uma homenagem ao Abdul, que
tinha voltado assim de Londres.
Os acabamentos era primorosos, contratamos
mais um alfaiate, um jovem árabe também, que pegou o truque todo com Bashar.
Eu sentia ciúmes pela primeira vez na vida,
o amava com paixão. Nossas noites eram
luxúria pura, me dizia, estou fazendo com ele, o que fizeste pelo meu
irmão. Quando percebeu algo no rapaz,
falou diretamente na cara dele, que era meu marido, que não admitia
interferências.
Foi como um neto para minha mãe, que lhe
deu abrigo em seu apartamento, dizia que se sentia sozinha.
A coleção foi um sucesso, foi toda comprada
pelos grandes armazéns, que nos ofereceram para montar uma boutique com nosso
nome como franquia, eu disse que ia estudar, sentamos os três, para isso. Minha mãe se preocupava, pois como
administrava tudo, dizia que era muito para ela, por causa da idade.
Tinha conhecido a pouco tempo a irmã
pequena dele, que estava fazendo universidade de administração de empresas,
Bashar pagava para ela, já que não tinha podido estudar.
Veio trabalhar com minha mãe, a mandei se
informar como funcionava tudo isso, fazer inclusive um estagio numa empresa que
se dedicava a isso. Para na próxima
temporada, podermos estudar as ofertas.
Contratamos um advogado especialista na área para nos orientar, não
queria expandir muito, pois temia perder o controle de tudo.
Um dia Bashar me pegou sentado na minha
poltrona pensando, não tinha desfrutado da vida, tinha agora quase cinquenta
anos, mas nunca tinha um dia de folga, invés de uma franquia, me ofereciam para
comprar minha marca.
Acreditava que isso era um horror, pois
tinha me mantido a margem desse tipo de negocio por isso, nunca tinha aceitado,
conversamos os dois, resolvemos que continuaríamos como estávamos até cansar,
agora alugávamos algum lugar para passar o final de semana, até nos atrevemos a
sair de férias.
A ele encantava a França, mas a mim não, lhe
contei minha juventude, meus problemas com meus irmãos, que várias vezes tinham
tentado se aproximar por dinheiro. Isso
sempre é uma merda, nunca me deslumbrei com nada disso.
Quando descobrimos o Pais de Gales, foi um
amor à primeira vista, adorávamos uma casa, que alugava agora constantemente,
numa pequena vila, fazia parte de uma grande propriedade, mas tinha sido
durante muitos anos, casa da proprietária, que se isolava da grande mansão.
Agora já com idade, tinha que viver com os
filhos que odiava.
Essa propriedade tinha adquirido para ter
tempo para ele, tinha uma estrada particular, nenhuma ligação com a Mansão,
precisava de dinheiro por isso alugava.
A compramos os dois. Era agora nosso ninho de amor, comentava
sobre a gente, mas não me importava.
Quando chegou o momento que pensei em
trabalhar em pequena escala, minha mãe tinha falecido recentemente com quase 90
anos, nunca tinha pensado em viver tanto, eu estava a caminho, já não queria me
matar de trabalhar.
Resolvi vender tudo, em Londres, com os
anos a propriedade dos dois locais era minha. Quem comprou alugou, para manter
o nome, bem como o local. Assim só o
aluguel nos bastava.
Um dia contei ao Bashar o que minha avô
fazia, começamos a procurar esse tipo de roupa por ali, íamos pelas vilas
parávamos um furgão, procurávamos roupas antigas, que ninguém mais quisesse, dizíamos
as senhoras, revisem seus baús, com duas viagens, que fizemos, compramos muita
coisa.
Na capital Cardiff, conseguimos uma loja
antiga que já tinha um ateliê em cima, começamos a trabalhar, sua irmã se tinha
casado, queria uma vida mais tranquila, vieram viver ali, eles, agora tinha
sobrinhos a quem cuidar.
Conseguiam fazer maravilha, ele agora como
não podia usar mais o nome da sua marca, usava Terence B, ou TB, as pessoas
procuravam coisas diferentes, eles tinham, roupas recicladas tanto masculinas
como femininas, sua irmã cuidava da loja.
Assim era como fechar um círculo, voltava a
trabalhar como quando era jovem, sentia-se revigorado com isso, sem motivo para
criar coleções, estar sempre como um louco.
Algumas clientes vinham de Londres, algumas
as vezes traziam um baú, que tinham descoberto em sua casa, cobravam uma
fortuna, para reciclarem todas essas roupas a sua medida. Esse boca a boca, resolvia muito, as vezes
tinham que esperar meses para conseguir que eles olhassem o que tinham.
Quando uma Duquesa apareceu numa festa no
Palacio, com um vestido que tinha sido de sua avó totalmente reciclado, a
afluência virou uma coisa de louco, mas tinham o firme proposito de seguirem
trabalhando como sempre.
Ismael se fartou da antiga empresa, a
pressão era muita, veio passar uns dias, só voltou a Londres para pedir as
contas, trouxe com ele seu companheiro, assim éramos mais, mas nem por isso
aceitávamos pressão.
Os preparei para um dia nos substituírem.
Uma princesa árabe que vivia em Londres, um
dia nos convidou, tinha comprado uma mansão, de uma família falida, tinha
descoberto no sótão, um lugar cheio de caixas de roupas, queria recuperar
tudo. A coitada estava na lista a muito
tempo, com paciência, em três furgões transportamos tudo, levamos mais de uma
ano, dividindo o tempo entre manter a loja que tinha clientes sempre, como
preparar tudo para ela. Separou uma
série de roupas que gostava, era como restaurar toda uma coleção, posteriormente
doou ao museu do traje.
Saiu uma ampla reportagem, falando do
tempo, vídeos de como tinha sido feito essa recuperação, algumas era como
reconstruir uma roupa, fizemos grande sucesso, mas avisávamos que ela tinha
estado esperando mais de um ano para isso, que os clientes tinha que seguir
nosso ritmo.
Uma velha atriz de cinema, tinha todos os
trajes que tinha usado no teatro, no cinema, queria fazer o mesmo, foi uma
coisa fantásticas, era reconstruir a história do cinema também, toda a coleção
ao final foi para o museu do cinema inglês.
Assim chegamos a uma idade, que funcionávamos,
mais como assessores do Ismael, a quem tínhamos ensinado a trabalhar.
Bashar era atendo aos detalhes, com os anos
tinha uma verdadeira paixão pelas roupas suas histórias, pois tanto o fazíamos
com roupas femininas como masculinas.
Agora gozavamos mais da vida, eu o seguia
amando como sempre, só tinha gostado de duas pessoas na vida, mas a ele tinha
paixão.
Anos depois soube do George, tinha
desenvolvido uma carreira em Hollywood, agora era consultor de series de época,
nos descobriu, vinha buscar roupas para as mesmas, queria emprestadas, mas a
irmã do Bashar era dura na queda, o máximo que fazia era alugar, mas isso de
emprestar nada.
Com os anos, resolvemos passar a empresa
para ela, bem como ao Ismael, assim tinha um futuro. Os meninos tinha assegurado sua universidade,
pois o tio os amava.
Nenhum seguiu por esse caminho, um foi
estudar medicina, a garota, foi mais além fez literatura, hoje escreve para
jornais, revistas, até revista de moda, por ter crescido no meio disso.
Nos dois na nossa casa romântica, agora
temos um casal que vem todos os dias nos ajudar a cuidar da mesma, não temos
idade para cuidar de um jardim, em que o vento marítimo faz coisas caprichosas.
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