EAD - RETORNADO - RETALHOS
EAD
RETORNADO
Hoje em dia sou um retornado, pois depois
de muitos anos retornei a minha terra de origem, no meu caso Marrocos. Nasci aqui, por um descuido, como dizia meu
pai, pois tinha nascido antes do tempo, ele queria que nascesse em Paris, para
ter nacionalidade francesa, mas de qualquer maneira conseguiu através de alguém
isso. Fui registrado em Casablanca e
posteriormente em Paris, assim tiver dupla nacionalidade sempre.
Quando era criança todos os anos nas férias
vinhamos a uma pequena vila, entre Rabat e Casablanca, era para visitar uns
parente de minha mãe, ele dizia que não tinha família no Marrocos. Nas verdade nunca falava nem de sua
juventude, nem sua infância.
Minha irmã mais velha Fatma era de uma
beleza extraordinária, alta, morena, cabelos lisos, olhos negros, uma cara de
modelo, era mais velha do que eu, quase 10 anos, depois vinha minha outra irmã,
uma chata de galocha, vivia reclamando da vida, não era bonita, tinha os
cabelos crespos, nariz árabe, uma boca de quem comeu alguma coisa azeda, sempre
lutando contra ser gorda. Por último
eu, minha irmã mais velha me adorava, fazia o papel de mãe, enquanto a nossa
trabalhava, limpava casas, edifícios de escritório, tudo estava sempre bem,
usava um lenço na cabeça, que escondia uma tatuagem Berbere que tinha na testa.
Era uma mulher diferente, branca, olhos
esverdeados escuros.
Eu era o mais claro da família toda, cabelos
crespos, olhos verdes, fui crescendo segundo meu pai que me adorava de maneira
assustadora.
Também era o saco de pancadas de minha irmã
do meio, pois sempre me detestou, pois queria a atenção que meu pai me dava. Mirian, de um lado tinha inveja da Fatma, de
outro de mim, como era o menor fazia maldades, mas era sempre defendido por
minha irmã mais velha.
Fatma era excelente na escola, tirava as
notas mais altas de sua turma, estava sempre metida nos livros, dizia, quero
ser alguém, as duas tinham algo em comum, odiavam ir ao Marrocos, eu ao
contrário amava.
Adorava estar pela praia, jogando bola com
os garotos, mergulhar, tentar acompanhar o ritmo deles nadando, por isso um dia
pedi ao meu pai, se podia ir a um club ali perto, para aprender a nadar, ele
sempre conseguia tudo.
Enquanto seus companheiros, era mecânicos,
ele era o chefe, tinha começado de baixo, mas tinham plena confiança nele, como
chefe ganhava mais, isso ajudava em casa, economizava para a Fatma poder ir à
universidade. Adorava a inteligência
dela, foi ela quem ensinou aos dois, a ler e escrever em francês. Liam as noticias do jornal de domingo, depois
conversavam a respeito. Mirian ficava
morta de ciúmes.
Só fui entender anos mais tarde, porque ele
a desprezava.
Só posse dizer que minha mãe tinha
verdadeira paixão pelo meu pai. Ele era
seu deus, se lhe dissesse que devia se jogar pela janela, ela o faria.
Quando fiz 16 anos, fomos só os três ao
Marrocos, as duas não queriam ir. Minha
mãe nunca insistia. Foi a melhor viagem
que fiz, pois eles iam conversando relaxados, não tinham que ficar chamando
atenção das meninas, com as implicâncias.
Quando cheguei, corri para a praia, a
maioria dos meus amigos de lá tinha desaparecido, o Abdul, com quem me levava
bem, me falou que todos tinham escapado para Espanha, para trabalhar, conseguir
uma boa vida. Me perguntou que tal a
vida na França, eu dava um duro desgraçado na escola, queria ter a mesma sorte
de Fatma, que foi a universidade com bolsa de estudos por causa de suas boas
notas. Mas não tinha definido ainda o
que queria fazer.
Ele falou que adoraria estudar, para ser um
professor, ou um escritor no futuro, mas que as chances ali eram poucas, teria
que um dia ou ser pescador, ou emigrar para trabalhar em alguma indústria. Eu lhe animei quanto pude. Agora nadava com ele, como um peixe, ele
elogiou meu corpo, um dia no final do dia, nos escondemos detrás de barcos já
preparados para sair de madrugada, fizemos sexo, para mim era a primeira vez,
ele me contou que tinha feito com turistas, homens mais velhos.
Aquilo mexeu comigo, quando me penetrou,
fiquei como louco, queria mais. Foi
assim durante uma semana. Antes de ir
embora me contou que tinha conversado com seu pai, ele iria para Casablanca,
viver na casa de um tio que era professor.
Quem sabe, mais tarde conseguiria ir Paris.
Esse último dia, fizemos sexo várias vezes,
nos revezávamos, embora eu adorasse ser penetrado por ele.
Passei a viagem de volta mal-humorado, mas
a coisa ficou feia quando chegamos a Paris, Mirian tinha coisas para contar,
que Fatma, tinha dormido fora de casa, várias noites, se via que tinha prazer
em contar, exagerar tudo. Quando essa
chegou em casa, minha mãe lhe perguntou por quê?
Ela contou tranquilamente, que tinha um
namorado francês, que dormia na casa dele, que não pensava em se casar por
enquanto, pois primeiro queria ser alguém.
Não era nada sério, nem o queria para isso. Tomo todos os cuidados necessário para não
ter filhos.
Depois se sentou com meu pai, falou tudo
isso, mais alguma coisa. Tinha acabado a
universidade, tinha conseguido um emprego, mas lhe disse, o senhor sabe como é,
com um nome árabe, fica difícil, me darão sempre um trabalho, pagando menos, se
o senhor permitir, eu passaria usar o nome de Tina, ele concordou, pois tinha
experiencia nisso.
Meu pai de uma certa maneira era muito
moderno para um marroquino, ou um árabe, ele não seguia nada do pessoal de
lá. Quando íamos se vestia igual, mas
inclusive deixava a roupa na casa dos parentes de minha mãe.
Mas chegava a Paris, se vestia como os
franceses. Mirian que esperava um
escândalo por parte dos seus pais a respeito de sua irmã, ficou furiosa, levou
pela cara que era muito feio fazer isso, falar da vida dos outros.
Tina logo tinha um emprego, dava sempre
dinheiro em casa, comprava suas roupas, com um gosto apurado, mas discreto. Mirian
ao contrário, usava lenço na cabeça, se dizia mulçumana, faltava pouco para
usar as roupas que usavam algumas velhas marroquinas.
As pessoas falavam, mas em casa meu pai
ignorava, diziam que deviam se meter em suas próprias vidas.
Os vizinhos falavam sempre pelas costas,
pois ele era o chefe da maioria dos que viviam ali.
Um dia Tina saiu com minha mãe, a levou a
uma clínica dermatológica, conseguiu que lhe retirassem a tatuagem, minha mãe
foi ao sétimo céu, agora ia sempre ao cabelereiro, tinha sempre soltos como
gostava meu pai.
Dois anos depois, morreu num acidente
idiota, estava descendo do ônibus, um outro bateu no que estava por detrás, ela
caiu batendo a cabeça numa coluna da parada de ônibus, foi para o hospital, mas
não puderam fazer nada.
Meu pai, fez suas últimas vontades, ele não
queria ser enterrada no Marrocos, mas sim ali, aonde tinha sido tão feliz.
Para Mirian isso era um sacrilégio, mas
Tina cortou o mal pela raiz, vais levar tu o corpo para lá, ou as cinzas, não,
então não enche o saco.
Ela agora estava num emprego melhor, meu
pai ficou um tempo abalado, Mirian tinha acabado a universidade, muito
apertada, no fundo não gostava de estudar, arrumou um emprego de professora,
virou funcionária pública. O pior não
era o fato dela se vestir mal, as roupas nunca ficavam bem nela, mesmo que
colocasse uma roupa da Tina, ficava horrorosa nela.
Tina tinha um namorado, que a levava para
todos os lados, teatro, cinema, concertos de música, restaurantes finos, se
aprendeu a se comportar numa mesa, me ensinou tudo isso, meu pai ria horrores,
mas me dizia, faça como tua irmã, ele ainda gostava de certas comidas, comer
com os dedos. Quando conheci o namorado
da Tina, era um homem extremamente bonito.
Eu nunca tinha tirado da cabeça Abdul,
sonhava com ele.
Fiz a universidade como Tina, com uma bolsa
de Estudos, terminei cum laude a mesma, logo consegui bolsa para pós-graduação,
tinha feito literatura e línguas, talvez pelo fato de falar duas, ajudava, fui
fazer uma pós-graduação na Alemanha, meu pai insistiu muito que eu fosse.
Quando voltei no final do ano de férias, vi
que o ambiente em casa estava tenso, entre ele e Mirian, me chamou para irmos
tomar um café, ele nunca fazia isso.
Nos sentamos no seu bistrô preferido, ele
nunca ia aonde estavam os outros árabes.
Me contou sua infância e juventude, que
tinha nascido numa família numerosa, que trabalhavam todos no campo, ele não
encaixava, pois queira mais para sua vida.
Um dia um irmão dele o viu fazendo sexo com outro rapaz, fez um
escândalo tremendo. Nunca entendi isso,
pois sabia que ele também fazia.
Meu pai me colocou para fora de casa, esse
meu amigo, também foi colocado para fora de casa, fomos caminhando até
conseguir um caminhão que ia em direção a Casablanca, comecei a trabalhar em
qualquer coisa, ele ao contrário queria mais, começou a se prostituir com
turistas franceses, um dia desapareceu.
Fiquei como louco, até que um conhecido me contou que tinha tirado
passaporte, se mudado para França com um homem.
Me mudei para a vila aonde vivia tua mãe,
ficamos amigos, agora tens que saber, a verdade, ela tinha sido repudiada pelo
seu primeiro marido, pois tinha tido duas filhas seguidas uma da outra, sequer
as reconheceu, ou seja, tuas irmãs, não são minhas filhas. Mas só a Tina sabe disso.
Tua mãe era berbere, por isso tinha a
tatuagem na testa, a fazem quando se casam, na verdade ela era a segunda esposa,
por isso ele podia se divorciar tranquilamente.
Eu vinha embora para cá, lhe contei minha
paixão pelo meu amigo, ela entendeu, viemos juntos, mas nos casamos antes, os
dois trabalhamos duro, para conseguir uma casa decente, os chefes quando viram
que eu aprendia tudo, que tinha facilidade em organizar manter os homens
trabalhando contente, me fizeram de chefe.
Estou falando tudo isso, porque por um
acaso reencontrei meu amigo, ele viveu muitos anos com esse senhor francês,
conseguiu montar um negócio, voltamos a sair, conversar, tomar um café, como eu
ele odeia esses lugares que vão todos os marroquinos, contar suas mentiras que são
alguém na vida, reclamar das mulheres, dos filhos.
Falei muito de ti, meu filho querido. Sei que parece que não vejo as coisas, mas
saíste a mim, quando voltamos da última vez do Marrocos, vinhas triste, sei que
teu amigo desapareceu.
Quem sabe um dia, viva tua vida, não se
preocupe, quem sabe o tal destino os junte alguma vez.
Tua irmã Mirian, descobriu o que tenho com
meu amigo, mas nunca o levei lá em casa, me viu sim falando com ele, tomando
café, veio tomar satisfação, pois meu amigo não esconde o que é.
Falou horrores, quer contar isso a ti.
Mas antes me apresentou seu amigo, era mais
velho que meu pai, com os cabelos brancos, mas muito simpático, quando jovem
deve ter sido muito bonito.
Meu pai sabia que ele era uma pessoa
volúvel, mas aproveitou o momento, ou isso creio.
Quando voltei para Paris, ainda fiz mais um
curso, até conseguir um posto de assistente na universidade, me dava classes,
para jovens ricos, que vinham dos países árabes para estudar na universidade,
eu os devia preparar para terem classe em francês. Entendi que faziam isso por ser marroquino,
mas não me importei.
Nessa época Tina conheceu um homem uns 10
anos mais velho que ela, podre de rico, que era cliente da agência de propaganda
que ela trabalhava, ela levava sua conta.
Ele se apaixonou por ela, como uma criança. Era divorciado, sem filhos. Foi um casamento todo por alto, meu pai
pensou que não ia nos convidar, mas seu futuro marido quando conheceu meu pai,
o elogiou muito, pois sabia que ele não era o pai verdadeiro dela, mas que
tinha feito tudo para que ela tivesse estudos, mas o mesmo não suportava a
Mirian.
Fomos todos ao casamento, levei meu pai,
para comprar um fraque, mas resolvemos os dois alugar, que era mais prático, me
soltou enquanto provávamos, não creio que nunca mais vamos usar uma coisa
assim, melhor alugar. Só compramos uns
sapatos condizentes, fomos ao barbeiro, fizemos um serviço geral os dois,
tiramos fotos depois os dois juntos, ele estava feliz.
Meses depois quase morreu, seu amigo
querido, foi assaltado no seu negócio, reagiu, uns garotos dispararam nele.
Ele tinha sobrinhos que tinha trazido do
Marrocos, esses assumiram tudo, mal deixaram meu pai, se despedir do grande
amor de sua vida.
Quando se aposentou, estava sempre
irritado, eu apesar de já não viver com ele, ia todos os dias desde a universidade,
almoçar com ele, as vezes o levava para comer em algum restaurante árabe que
tinha descoberto.
Sei que por causa de uma discussão com
minha irmã Mirian, teve um enfarte, esteve muito mal entre a vida e a morte.
Quando voltou para casa, viu que ela tinha
mexido nas caixas de documentos dele, e de minha mãe.
Me chamou, perguntou se tinha muitas aulas,
preciso falar contigo urgentemente.
Fiquei preocupado, mal cheguei fiz com que
colocasse uma pastilha embaixo da língua, seja o que seja meu pai, não se
preocupe.
Tua irmã abriu as caixas de documentos que
eu tenho tudo guardado, esta louca para falar contigo, para com isso nos
separar, por isso prefiro contar eu mesmo essa verdade.
Não se preocupe meu pai, eu te adoro, nada
vai nos separar.
Então começou a me contar, me perguntando
primeiro se eu me lembrava que tinha me contado que tinha nascido antes do
tempo?
Sim, me lembro disso.
Na verdade meu filho, o filho que tua mãe
levava na barriga, nasceu morto, ela ficou entre a vida e a morte.
O médico que nos tinha atendido, me levou
com ele, para falar com uma senhora, esta já tinha oito filhos, tinha acabado
de te parir, não podia mais, mal dava conta de alimentar a todos, queria um
futuro melhor para ti, fizemos uma troca, para todos os efeitos, ela tinha
parido o que nasceu morto, o médico concordou em lhe fazer uma operação para
não ter mais filhos, coisa rara por lá.
Eu te registrei imediatamente, te amei
desde o momento que estiveste em meus braços, tua mãe também, mas nunca contei
a ela, que não era filho nosso. Ela te
adorava, sabes disso, a única que desconfiou foi a Tina, já era esperta, se
tinhas nascido antes do tempo, como era possível que fosses grande. Mas ela te quer igual, muito mais claro que
Mirian.
Eu se fosse o senhor, vinha morar comigo,
deixa esse apartamento.
Ele tinha suado sangue para comprar o
apartamento, mas ele tinha pena da Mirian, ficar sozinha, solteira, amargada
como era.
Segui indo ao apartamento, um dia ela
estava, estava louca para jogar isso na minha cara, eu estava preparado, quando
me disse, que não era irmão dela, lhe respondi, que sabia, mas que também sabia
que ela não era filha do meu pai, quando eles se casaram já existiam, era filha
do primeiro casamento de nossa mãe, pois o pai dela nunca a tinha reconhecido.
Ficou como uma fera, que aquilo não era
verdade, eu tinha avisado a Tina que apareceu, disse que era verdade, que ela
tampouco era filha do meu pai, mas o queria como tal.
Porque todo esse escândalo, só pelo prazer
de infernizar a vida de alguém. Por isto
estás sozinha, quem vai querer ter uma mulher chata como tu.
Meu pai continuou vivendo com ela, mas eu
ia todos os dias como sempre almoçar com ele.
Se tinha algum namorado novo, levava
comigo, ele se divertia. Tive um
namorado, que era muito afetado, mas tinham um humor incrível, meu pai se ria
horrores com ele.
Um dia Miriam chegou, estávamos os três na
cozinha, o almoço, tinha feito ele, estávamos tomando café. Ela ficou uma fera, a casa era dela, como eu
ousava trazer alguém tão viado.
Meu pai cortou rapidamente, ele que não
gostava de discutir, a casa é minha, não tua, se não gosta das pessoas que eu
gosto, podes tranquilamente arrumar tua bagagem, ir para aonde queira.
Ela tomou ao pé da letra, arrumou suas
coisas, foi embora.
O mais interessante, ele convidou meu
namorado para viver com ele, me dás alegria, como ele trabalhava ali perto, foi
ficando, um dia me disse cara a cara, estou apaixonado por teu pai, nunca
ninguém me tratou como ele.
Passaram a viver juntos, Nike saia de
manhã, para trabalhar, mas voltava para comer conosco, depois saiamos juntos,
vinha uma senhora limpar a casa, ficava até a hora dele voltar do trabalho.
Eu nunca perguntei como se relacionavam os
dois. Mas nunca vi meu pai tão feliz,
ria muito com o jeito dele, como Nike era carinhoso com ele, uma das coisas que
mais gostava de ver, ela como ele colocava a mão suavemente em cima da do meu
pai, como passava os dedos pelos seus cabelos brancos.
De uma certa maneira, nunca tinha feito
isso comigo, tudo era na cama.
Meu pai ficou doente, ele tirou uma licença
do trabalho, era professor numa escola ali perto, tinha se transferido e tudo,
para ficar perto. Cuidou dele, como
nenhum de nós poderia ter cuidado.
Miriam, me telefonou, bem como a Tina,
pediu para falar conosco.
Esse homem vai roubar nossa herança, fez um
escândalo, dois homens vivendo juntos, ele está explorando nosso pai.
Tina que não tinha papas na língua, soltou,
ajudavas alguma coisa em casa, contribuía com alguma coisa, eu deposito na
conta de nosso pai todos os meses, dinheiro para o final do empréstimo do
apartamento, sei que Jamil também o faz, tu fazes algo?
Ela abaixou a cabeça.
Vais visita-lo? Como eu vou pelo menos três
vezes por semana, meu marido adora seu companheiro, brinca me ameaçando que se
não me comporto, me troca por um igual, ficamos os quatro tomando café na sala,
nos trata bem.
Mas tu claro é a chata da família, a
idiota, solteirona, que se pode pedir, de criança já eras amarga, agora com a
idade estás pior, meta-se na tua vida que é melhor.
Meu pai durou ainda 10 anos, nunca foi
visita-lo.
No seu enterro, ia ficar junto com nossa
mãe, nunca vi tanta gente, muitos inclusive amigos de seu companheiro. Ele estava desolado, tinha perdido o amor de
sua vida.
Arrumou suas coisas, o levei para casa,
ficou vivendo comigo muitos anos, como amigo.
Meu pai tinha deixado por incrível que
pareça o apartamento para a única que nunca colaborou para pagar, tinha pena
dela Mirian. Ela sequer tinha ido ao
enterro.
A única coisa que levei do apartamento, foi
as duas latas de documentos deles. O
resto ficou como era.
Tina tampouco se interessou, vivia num belo
apartamento no Parque Monceau, a pouco tempo tinham adotado um garoto, acabou
tendo cinco filhos adotivos.
Sempre me convidava para os aniversários,
festas na sua casa, ela agora era diretora da agência que trabalhava. O marido recebia o companheiro de meu pai,
como se fosse mais um na família. No
fundo ele era o único que sabia da Mirian, pois ela acabou trabalhando na
escola que ele era diretor. Podia ter
negado que ela fosse para lá.
O pior dizia ele, que ela cai mal a todos
os outros professores, nunca a convidam para nada.
Anos depois, eu estava tratando da minha
aposentadoria, fui chamado pela polícia, a tinham encontrado morta no
apartamento, parece que teve um enfarte sério, sentada num sofá, com uma caixa de
bombons, já devorados, outra aberta.
Tiveram trabalho para retira-la, estava tão
gorda, que o corpo ficou preso na poltrona.
Avisei a Tina, a mandamos enterrar ao lados
de nossos pais.
Tinha com seu humor, disse, coitados, nem
mortos se livram dela.
Mandamos jogar fora tudo que havia no
apartamento, mandamos limpar, pintar, o vendemos, eu abri mão do dinheiro,
embora ela insistisse, quando lhe disse que era para os garotos irem à
universidade, ela riu.
A cada um que adotamos, meu marido cria um
fundo para o futuro dele, o administra perfeitamente.
Fica para ti, assim engordas tua
aposentadoria. Ela ao contrário, não
pensava deixar de trabalhar.
Fiquei sem saber o que fazer da minha vida.
Justamente quando pensava em um viagem,
conheceu um homem, a principio foi tudo bem, mas de repente começou a notar uma
certa manobra que fazia o mesmo.
Quando comentou que pensava talvez ir a
Marrocos, o mesmo soltou que tinha horror aos marroquinos, foi quando se deu
conta que era uma pessoa possessiva, que gostava que fosse tudo ao seu jeito.
Foi bom a sua maneira, pois lhe soltou em
plena cara, então o que fazia com ele, que era marroquino.
Não teus documentos dizem que eres francês.
Te engana, nasci no Marrocos, mas meu pai
também me registraram aqui, portanto caia fora da minha vida.
Depois se ia se rir muito disso, um idiota.
Pensou, posso pegar um avião, mas se
lembrou o quanto tinha se divertido na última viagem com os dois, pensou muito,
sempre tinha querido ter um 4X4, mas nada novo, conseguiu através de um conhecido
um. Se despediu de Tina e família, esta
rindo soltou, quando te estabeleça vamos te visitar.
Ele tentou dizer que era só uma viagem que
queria fazer a muito tempo, ela lhe soltou na cara que ele seria um EAD, um
retornado em árabe.
Arrumou uma bagagem com suas roupas mais
simples, coisas confortáveis, fechou o apartamento, seu advogado ficou de
mandar uma pessoa, a cada 15 dias, para abrir o apartamento, bem como limpar.
Resolveu fazer um roteiro diferente, foi
até Toulouse, aonde conhecia algumas pessoas, visitou a cidade, depois
Carcassonne, entrou por Barcelona, fazia ao contrário dos seus pais, parava um
dia ou dois em cada cidade, para ver como eram, foi descendo até chegar aonde
estava o ferry.
Depois fez a mesma coisa no Marrocos, ele
em qualquer caso podia dormir no banco detrás.
Quando chegou a vila, nada mais era o que
conhecia, a família não existia mais ali, os filhos tinham emigrado para
Espanha a muitos anos, o casal que os acolhia, tinha vendido a casa, retornado
ao sua vila de origem. Ninguém sabia
dizer aonde.
Ele arrumou por enquanto um lugar num
pequeno hotel familiar, de frente para a praia aonde costumava tomar banho.
Foi o que fez, nada mais ao registrar-se, colocou
uma sunga de nadar, uma toalha no ombro, nada mais que faria um turista.
A muito tempo não pegava sol, estava quase
branco. Deixou a toalha pendurada na
proa de um barco que estava ali na areia, se jogou no mar. Foi como tirar uma carga dos seus ombros,
relaxou imediatamente, ficou ali nadando, boiando as vezes para respirar.
Pensou, caralho, precisava disso a muitos
anos.
Quando saiu, viu um homem ao lado da
toalha, o reconheceu imediatamente, as pernas tremeram, ficou parado de boca
aberta.
O outro se aproximou com a toalha, continuas
como sempre, essa maneira de nadar, de boiar, recuperando a respiração, só
conheci uma pessoa que fazia isso, meu amigo de alma Jamil.
Se abraçaram, uma coisa demorada, como
matando a saudade.
Não queria se separar, estava
excitadíssimo.
Que coisa feia Jamil, abraças um amigo
ficas de pau duro.
Adorava esse humor que ele tinha, se
sentaram no chão ali mesmo.
Tinhas razão, como sempre, eu devia ter-me
preparado para ser alguém, mas escolhi a via mais fácil, me prostitui, fui para
Paris, me deslumbrei, fui trocando de homens, até que um deles me viu como me
vias, um rapaz assustado.
Me deu estabilidade, me fez estudar, dizia
sempre tens que pensar em ser alguém.
Mas lá é um mundo nunca te encontrei.
Quando ele morreu, pensei que ia ficar
fazendo lá, vim para cá, primeiro comprei um barco, logo dois, hoje tenho
cinco, mais é para me ocupar.
Jamil seguia sem falar nada.
Não me diga que esqueceste do meu nome?
Jamais, estiveste sempre em meus
pensamentos, não troquei tanto assim de homens, mas em cada um te procurava,
claro isso era impossível
Me aposentei a pouco tempo, resolvi fazer
uma viagem como fazia com meus pais, quando criança, depois a última que foi
maravilhosa, quando estivemos juntos, com 16.
Não fiz o mesmo roteiro, mas fui parando, conhecendo as cidades, os
marroquinos, fazem essa viagem de uma vez só, pois querem chegar à mãe pátria.
Eu sempre te chamei de ABE, de Abdulá mas
nunca me disseste teu sobrenome.
Aonde estas hospedado?, na casa da mesma
família.
Lhe contou o panorama que tinha encontrado,
estou nesse hotel aí atrás.
Então, iras comigo para minha casa.
Não estas casado, ou tem um amante?
Não, creio que desde que estou aqui, estou
te buscando.
Foram ao hotel, a dona se lamentou perder
um cliente para tantos dias, mas conhecia o Abe, sua casa ficava mais abaixo,
em cima de umas pedras, dava para o mar, era um Riad diferente, com muitas
janelas virada para o mar, mesmo o pátio se expandia até uma grande janela.
Eu a comprei, depois reformei, adoro
dormir, no verão com as janelas abertas, para sentir o mar, quando chove, para
sentir o cheio da chuva.
Se lembra aquela vez, que estávamos na
praia, esta ficou vazia, ficamos tomando banho de chuva, nos escondemos atrás
dos barcos para fazer sexo.
Sim nunca me esqueci dessa imagem, do
cheiro da tua pele, me lembro que eu que não tinha experiencia, passei a língua
por todo teu corpo, nunca mais fui capaz de fazer isso com ninguém.
Depois de um banho, viu que ele o esperava
nu na cama, tinha um corpo maduro, estava como um louco, se jogou em cima dele,
se saciaram um do outro. Abe soltou,
como perdi tempo meu Deus.
Depois foram os dois a cozinha pequena da
casa, aonde prepararam juntos uma salada, bem como peixe na brasa.
Faziam isso, procurando se tocar, se olhar,
para ver se era verdade.
Um ano depois Tina cumpriu o que tinha
prometido, veio com os filhos, com o marido, faziam sucesso, pois cada filho
era de uma maneira, um era loiro, outro negro, outro chinês, era uma família
misturada, quando seu marido ia à praia com os garotos, se divertiam a
mil. Agora vinham todos os anos, mas de
uma maneira moderna, de avião até Casablanca, eles iam busca-los.
Uma vez, foram passar natal e ano novo, com
eles em Paris, mas na verdade, era para mandar suas coisas para lá. Vendeu o apartamento, ampliaram a casa.
Abe, já tinha uns 12 barcos, para os dali,
ele era um milionário, mas viviam simplesmente.
Foram envelhecendo juntos, cuidando um do
outro, nunca falavam do tempo perdido, não queriam o passado, apesar da idade,
queriam sempre falar do futuro.
Ele dava aulas para os melhores alunos da
escola, para ajudar a traçar um futuro para eles.
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