BAYRON
Meu nome é Bayron, creio que quiseram me
registrar como Byron, como o poeta Lord Byron, mas algo saiu errado, eu não
estranharia, meu pai devia estar bêbado como sempre, vivia para isso. Tinha sido mineiro, no interior, quando a
mina que trabalhava fechou foi para Liverpool, pensando em encontrar uma vida
melhor, mas tudo que conseguiu foi ser estivador no porto.
Minha mãe, limpava a casa de gente rica,
para ajudar, tinham se mudado nada mais ao se casar, ela acostumada a um pai
bruto e bebedor, quando ficou gravida do primeiro filho, foi uma das primeiras
vezes que ele lhe deu uma surra. Claro
perdeu a criança, ao invés de abandona-lo pensou que ele precisava dela, quando
eu nasci, foi toda uma surpresa, pois ela manteve em segredo o mais tempo
possível.
Nunca saberei se ele me odiou desde o
princípio, pois deixava de ser o número um da casa, sempre estava falando isso
na frente dos amigos, que ele era o primeiro da casa, sem ele nada
funcionava. Era uma grossa mentira,
dávamos graças a deus quando ele não estava, quando nasceu minha irmã, foi a
mesma coisa.
Reclamava de tudo, nada mais ao colocar os
pés dentro de casa, se não estava bêbado, logo saia para fazer isso.
Vivíamos numa dessas casas estreitas dos
bairros populares, graças a minha mãe, que tinha que apertar o cinturão como
ela dizia para comermos.
Quando chegou a hora de ir à escola, ele
não queria, dizia que me ensinasse a escrever meu nome, era o quanto bastava
para sobreviver. Mas ela que só sabia
fazer isso, bateu o pé, levou uma surra de fazer gosto, comigo e minha irmã
olhando, ele só não lhe pegava na cara, pois senão ela não podia trabalhar. Mas fui a escola, sem querer descobri meu
paraíso, passava o dia inteiro na escola, era católica, como ela queria. Pelo menos lá comia duas vezes ao dia, uma
boca menos para alimentar, dizia ela, minha irmã, foi para um jardim de
infância, na mesma escola, no final do dia quando vinha nos buscar, estávamos
juntos na porta.
Com isso ela podia trabalhar em mais casas,
aconselhada por uma das freiras da escola, que foi com ela, abriu uma conta no
banco, sem que ele soubesse nada. Ali
depositava o dinheiro que ganhava, para alguma emergência. Os anos foram passando, o grande problema,
bem como sonho dela, era que fossemos a universidade, mas isso só com bolsa de
estudos.
Eu que era gordinho, um dia comecei a
crescer, a freira dizia que era pela comida da escola, até podia ser, fui
crescendo, fazia todos os esportes do colégio, mas um dos padres, tinha sido
campeão de boxe, nos ensinava a lutar, o que de certa maneira me fez ter
músculos.
Um final de semana que ele chegou em casa
bêbado, a primeira pessoa que encontrou foi minha irmã, sem motivo nenhum
começou a pega-la, minha mãe não estava tinha ido comprar comida. A sacudia por um braço só, com o outro lhe
pegava, eu a tirei das mãos dele, lhe dei um soco no estomago, ele caiu
sentado, me olhando com os olhos arregalados.
Acabou seu reinado nessa casa, a partir de
hoje, mando eu, se não gosta, a porta da rua é ali.
Nisso chegou minha mãe, para nossa
surpresa, ficou do lado dele.
Mas quando ele chegava, me via, ficava
quieto, um dia me pegou na rua, com dois amigos dele, lhes dei uma surra nos
três, claro tinha uma vantagem, estavam bêbados, mal se aguentavam em pé. Nunca mais encheu o saco.
Mas bastava eu não estar o pau comia,
descarregava em minha mãe, o que não podia fazer comigo, nem com minha irmã.
Um dia cheguei, ele estava sentado numa
cadeira, com a cabeça apoiada na mesa, bêbado demais, minha mãe jogada no chão,
com o braço quebrado, além de uma costela, eu não tive dúvida, chamei a policia
tinha escutado alguém na escola falar disso, quando o pai chegava bêbado,
chamava a polícia.
Levaram minha mãe para o hospital, ele
repetia sem parar ao policial, que não a pegava na cara, para poder trabalhar,
afinal as mulheres eram para isso.
Passou dois dias na cadeia, abaixando a bebedeira.
Voltou para casa furioso, mas o enfrentei,
a partir de hoje, qualquer merda que faças, chamo a polícia, quero ver quem vai
vencer essa batalha. Eu poderia ter
virado um marginal, como acontecia com a maioria dos rapazes da minha idade,
com pai como o meu.
Traficante de drogas, abusadores etc., mas
ninguém se metia comigo, pois sabia que eu era o campeão da escola de
boxe. Os que aproximavam era para me
chamar para lutar com alguém para ganhar dinheiro, tirava o corpo fora e claro.
Uma das últimas vezes que chamei a polícia,
normalmente era sempre o mesmo, lhe tocava o bairro, pois o conhecia bem. Quando colocaram meu pai no carro de
patrulha, com minha mãe o defendendo.
Ele me disse na cara, escape daqui quando possa, pois isso nunca acaba
bem.
Fui até a delegacia, pedi se podia me
orientar, acabaria a escola dentro de nada, mas não tinha nenhum futuro, apesar
das boas notas, só existia uma bolsa de estudos, os dois melhores alunos a
disputavam entre si.
Ele me sugeriu me informar da escola de
polícia, tens sorte não ter cara de garoto, já tinha um pequeno bigode que
cultivava bem, barba que me tinha saído cedo.
Volte amanhã, vou me informar. Ele foi a escola, se informou a meu respeito,
boas notas, bom comportamento, campeão de boxe, mas nem por isso o que mais
brigava na escola. Bom filho segundo a
freira, o problema dele o senhor deve saber, esse pai alcoólatra, que
descarrega na mulher e na filha, pois com ele não pode.
Quando voltei no dia seguinte, me contou
que tinha ido à escola, me indicou para o curso. Falei com minha mãe, ela ficou
apavorada, soltou sabes o quanto teu pai odeia a polícia, não vai gostar nada.
Realmente não gostou, mas teve que engolir,
pois lhe disse na cara, que dentro em breve, eu o podia mandar para a cadeia,
cada vez que passasse da raia.
Os primeiros meses passei interno na
escola, posso dizer que me parecia que estava no paraíso, pois fazia as aulas,
me saia bem em todas, inclusive tiro, lutava boxe, fazia exercícios, meu corpo
se desenvolveu mais ainda.
Mas claro tudo que é bom dura pouco, um dia
o policial foi me buscar, ele tinha agredido minha mãe outra vez, se sentia o
galo do terreiro, o pior minha irmã tinha se atrevido a defende-la, levou uma
surra também.
Estavam as duas no hospital, ele tinha
escapado quando chegou a polícia. Passei
a fazer uma coisa, era longe, mas me levantava de madrugada, para chegar à
escola a tempo, voltava de noite, vinha dormindo no ônibus de cansado. Ele levou um bom tempo para aparecer.
Minha irmã, coitada agora se abria comigo,
tampouco tinha boas perspectiva de vida, um dia falou conosco, minha mãe, meu
irmão, vou ser freira, é a única maneira de escapar desse inferno, pelo menos
poderei seguir meus estudos de alguma maneira.
Foi embora uma semana depois, antes que ele
voltasse para casa.
Quando perguntou por ela, lhe disse que a
tinha matado na surra que lhe tinha dado, pois tinha escolhido o caminho da
morte, pois para mim era isso, eu também poderia ter escolhido ser padre, mas
tinha um grande pecado, nunca poderia o perdoar, tampouco deixar de pegar
quando ele passava dos limites.
Aprendi truques na escola, quando ele
chegava bêbado, cantando de galo, o reduzia, chamava a polícia, me
identificava, o mandava ficar de molho, o ódio dele por mim, claro aumentou.
Passou a vir a casa quando sabia que eu não
estava. Seguia aprontando, eu nunca
entendi isso, pois minha mãe no fundo o defendia, levei anos para conseguir
compreender, que ela tinha sido educada assim, a ser submissa.
Quando acabei a academia, fui trabalhar, no
cu do mundo, tive que me mudar, ela agora ficava à mercê dele, mas claro as
paredes entre as casas eram finas, se escutava tudo, eu pedi as vizinhas quando
os gritos fossem muito alto, chamassem a polícia, algumas vezes ele escapava,
mas quando estava bêbado demais, ia dormir na delegacia, ficou até conhecido
por lá.
Passei três anos nesse lugar, vinha sempre
que podia a casa, tinha um companheiro que sua mãe vivia perto, tinha o mesmo
problema. Infelizmente, ele com isso,
tinha um ódio imenso a todos os bêbados, eu tinha que o controlar, quando íamos
apartar uma briga de bêbados, queria descer logo o porrete.
Na escola, eu tinha conhecido um tipo, Sam
Smith, era o homem mais bonito que tinha visto em minha vida, nunca permiti que
se aproximasse, tinha medo pela atração que sentia por ele,
Ele por sorte, foi trabalhar em outra
cidade, o que me permitiu de certa maneira o tirar da minha cabeça.
Eu tinha formado a minha cabeça num sentido,
não queria romances com ninguém, tampouco me casar, para levar a vida como os
demais, via na própria policia isso. O
homem que foi meu primeiro instrutor nas ruas, falava muito nisso, estava no
seu segundo divórcio, dizia que casamento e polícia eram duas coisas que não se
casavam.
Eu vivia num quarto alugado, apesar de ter
uma entrada diferente, nunca levava ninguém para lá, fosse homem ou mulher, eu
tinha que ir para a casa da pessoa. Mas
até nisso, eu era complicado, eu era o famoso da foda de algumas horas, nem de
uma noite, pois ia dormir no meu quarto.
Tinha colocado na cabeça, que se passasse do tempo regulamentar de uma
foda, significaria romance, tampouco me envolvia com nenhum companheiro, isso
era tabu.
Fui sendo promovido, cada vez mais me
aproximando da cidade.
Agora conversava com minha mãe, para ela ir
para uma casa de mulheres maltratadas, existiam muitas pela cidade, cheguei a
levar a uma, justo na zona que trabalhava.
Ela gostou como as mulheres viviam, eu lhe
disse que podia ajuda-la. Mas ela se
resistia, seu argumento, quem ia cuidar dele.
Eu agora era inspetor, ia bem, tinha um
excelente companheiro, ia sempre que possível a casa, um dia uma vizinha me
avisou que ela estava no hospital.
Desta vez a coisa tinha sido feia, ele
tinha dado um murro na cara dela, com isso ela perdeu a visão do lado
esquerdo. Além de ter hematomas no corpo
inteiro, outra vez costelas quebradas, quando ela o começou a defender, dizendo
que estava nervoso, pois tinha perdido o emprego, levei uma assistente social
para falar com ela.
Finalmente aceitou ir para uma casa de
mulheres, consegui com um juiz que conhecia, uma ordem para ele não se
aproximar dela.
Mas nunca soube como ele descobria aonde
ela estava, ia aprontava o maior escândalo, um dia um policial, descobriu que
era meu pai, me chamou, lhe disse que se estava fazendo isso bêbado, que o
devia levar preso, alteração de ordem.
Fez no mesmo lugar umas três vezes, a mudei
de casa, para o outro lado da cidade, inclusive melhor da que estava antes.
Meses depois a mesma coisa, ele agora era
famoso por isso, alteração de ordem, como nunca podia pagar as multas a cumpria
na prisão, um juiz me chamou, para falar do meu pai, porque eu nunca fazia nada
para defende-lo.
O senhor me desculpe, mas o pai do senhor é
alcoólatra, pega sua mãe, ou o senhor?
Meu pai tinha contado uma outra versão, eu
disse ao juiz, que falasse com os vizinhos, como ele sempre tinha se
comportado, minha mãe, perdeu a visão no olho esquerdo por culpa dele.
Nessa época meu companheiro pediu
transferência para uma delegacia em Londres, pois sua mulher era de lá, não
suportava Liverpool.
Comecei a ter como companheiros jovens
recém saídos da academia, devia treina-los, odiava isso, pois alguns, saiam
como eu dizia, com síndrome de heróis.
Se esqueciam de todas as regras que tinham aprendido na academia.
Nessas alturas, já tinha trocado minha mãe
quatro vezes de residência, acabei descobrindo que era ela que dizia aonde
estava, o chamava porque se preocupava por ele.
Um dia fui chamado, por um inspector,
quando cheguei, ele tinha lhe dado um tiro no outro olho, a tinha matado,
estava ali, bêbado como uma gambá, se valorizando, tinha liquidado essa família
de merda que tinha lhe tocado.
Quando me viu, ria as gargalhadas, dizendo
que pena que eu não estava ali, pois teria me acertado outro tiro.
O inspetor me perguntou o que deveria
fazer, sorri triste para ele, só respondi, o teu trabalho, é um assassinato.
Fui falar com minha irmã, ela me sorriu
triste, tinha que acabar assim, por isso resolvi ser freira, os homens são
sempre assim, ela tinha se formado em enfermaria, iria em breve para uma missão
na Africa, sei que lá as coisas não são melhores, mas irei cuidar de crianças
abandonadas, ver o que posso fazer por ela.
Ficamos de nos escrever.
Estava de uma certa maneira arrasado com o
que tinha acontecido, meu superior me perguntou se queria ir a um psicólogo da
polícia, agradeci, mas sabia que se ia, todos saberiam, viravas uma pessoa com
problemas.
Comecei a ir a um, que eu mesmo pagava,
minhas despesas eram mínimas, acostumado a simplicidade com que sempre tinha
vivido, sem família para sustentar, mulher ou filhos, podia pagar. Fui me abrindo com ele, contando tudo que
tinha guardado dentro de mim, desde criança.
Meu novo auxiliar, era um rapaz impetuoso,
era difícil controlar o mesmo.
Fomos chamados para um enfrentamento de
gangs de drogas, eu estava nesse momento no cemitério, enterrando minha mãe,
ele veio me chamar, que pediam a ajuda de todo mundo, falei com o padre que
fazia a cerimônia, pedi desculpas, fui com ele.
Chegamos no meio do maior tiroteio, os
filhos da puta, tinham reféns, estavam de tal maneira atrincheirados, que era
quase impossível chegar perto, eu procurava uma maneira de chegar até eles,
para tentar liberar as duas mulheres que estavam ali.
O muito idiota, metido a macho, apesar de
lhe avisar, temos que esperar mais reforços, estava falando com quem levava a
situação, quando ele resolveu avançar, no que ia gritar para ficar, o filho da
puta levou um tiro no meio dos olhos, caindo para trás.
Maldição, comentei com o supervisor que
levava tudo, eu agora estava sozinho nesse lateral, pedi reforços, pois
tentaria sair por aonde eu estava.
Não deu outra, embora chegassem dois
policiais para me ajudar, acabei levando um tiro no ombro direito, que me jogou
longe, com isso bati a cabeça num carro que estava atrás de mim, não vi mais
nada.
Fiquei sabendo depois que tinham me
operado, tinham me induzido ao coma, por causa da contusão na cabeça, esta
estava inflamada.
Não tinham ninguém para chamar, minha irmã,
estava a caminho da Africa, meu pai na prisão aguardando julgamento. Tudo que ele falou, depois me contaram,
finalmente esse idiota morre.
Eu sentia que via tudo desde longe, mas
minha cabeça funcionava, como lembrando de tudo, desde minha infância, a primeira
vez que o vi batendo na minha mãe, que ela não fazia nada para se defender,
depois como o fazia comigo, com minha irmã, que era muito pequena na
época. Um dia, parecia ver o homem me
tinha apaixonado na academia, estava ali, no quarto me visitando, segurava
minha mão. Me dizia, vamos fique bem.
Depois me parecia o ver pelas noites ali,
sentado ao meu lado, as vezes dormindo, outras segurando minha mão, como que me
confortando.
Nunca mais tinha sabido dele, a não ser que
era inspetor como eu, que tinha começado de baixo patrulhando as ruas como
todos.
Mas nunca mais o tinha visto pela frente,
aliás se o visse, tenho certeza de que me esconderia, nunca o tinha tirado da
minha cabeça.
Como sabia que me dopavam para dormir,
achei que era imaginação minha.
Quando finalmente me tiraram do coma, o vi
aparecer no final do dia, soltou finalmente, o senhor despertou.
Fiquei sem graça, ele me explicou, como eu
ele, não tinha ninguém, tinha vivido sua vida num orfanato, por isso tinha
entrado para a polícia, isso é muito triste, não termos ninguém para nos fazer
companhia.
Agradeci, eu achei que era um sonho meu,
que estivesses aqui.
Rindo me disse, quer dizer que sonhavas
comigo, nada de escapar como fazias antes, como se tivesse medo do que podia
acontecer.
Merda, soltei, o que sabias de mim?
Que fugias de mim o tempo todo, evitavas
fazer qualquer exercício comigo, com medo que acontecesse algo entre nós.
Caramba, como ele era direto.
Passamos a nos conhecer, ele contando sua
vida, eu a minha. Soube através dele que
meu pai tinha sido julgado e condenado a mais de 20 anos de prisão.
Que o mesmo tinha tentado através de seu
advogado, desestimar a causa, porque eu não estava presente. O juiz que já o conhecia, isso não tem nada
a ver com seu filho que está no hospital, mas sim com que o senhor fez com sua
esposa.
Disse ao Sam Smith que adoraria estar lá
para ver sua cara, finalmente indo pagar pelas coisas que fazia mal.
Ainda fiquei um tempo no hospital, fazendo
fisioterapia, pois precisava do meu braço direito para atirar.
Quando voltei a trabalhar, me colocaram por
um tempo, atrás de uma mesa, ia fazer exercícios todos os dias, duas vezes por
semana, de tiro, para ver como me saia.
Me deram um trabalho, que eu fazia muito
bem, analisar relatórios que iam para o Fiscal do distrito, se estavam bem
fundamentados ou não.
Foi quando descobri, através de um presente
do Sam, uma celular que gravava muito bem as conversas.
Estava analisando um processo, alguma coisa
não encaixava, era contra um traficante de drogas, o mesmo de alguma maneira
saia com não culpado do caso.
Analisei os relatórios iniciais dos dois
policiais, que posteriormente tinham mudado tudo.
De o terem pegado em flagrante, a
simplesmente a uma pessoa que estava por ali.
Chamei os dois policiais, mal comecei a
conversar, entendi, os dois tinham sido corrompidos, com dinheiro, fui falar
com o fiscal, esse ficou furioso, sempre é assim com esse sujeito.
Lhe perguntei se uma conversa gravada valia
para o caso.
Depende do juiz.
Propus a ele fazer o seguinte amedrontar os
policiais, esse claro correriam ao traficante, quase certeza que viria atrás de
mim.
Foi o que aconteceu, eu era um homem de
hábitos, comia sempre ao meio-dia, num restaurante perto da delegacia, mas ao
qual nunca iam policiais. Me sentava
sempre na mesma mesa, ao final, quase na entrada da cozinha. Coisas que tinha aprendido com o detetive que
me tinha ensinado a trabalhar.
Não deu outra, senti de repente uma pessoa
em pé na minha frente, o reconheci de imediato, tinha sido colega meu na
escola, seu pai era igual ao meu, trabalhava no cais, mas se deu bem deixando
passar as drogas.
O convidei para sentar, depois que levei
esse tiro no ombro, tenho dificuldade de ficar olhando para cima, enquanto
perguntava pela sua mãe, fingi que recebia uma chamada, mas ao mesmo tempo
acionava a gravadora.
O muito idiota, me ofereceu dinheiro, que
eu iria deixar de viver com esse salario de merda que ganhavam os polícias, que
eu merecia uma vida melhor, como ele.
Por isso convenci os teus companheiros, além de ter como meus
empregados, disse o nome de um juiz, bem como de um fiscal. O deixei falar tudo, ao final, somente lhe
disse que ia pensar. Afinal eu só estava
revisando o caso.
Claro, por isso, deves deixar passar, para
esse fiscal, ver que não tem nada contra mim.
Fiquei de lhe dar resposta no dia seguinte,
almoço sempre aqui, venha e conversamos mais, pois necessito saber quanto vais
me oferecer, para saber se vale a pena.
Ele me soltou uma coisa que depois borrei,
não só porque fiquei furioso, mas porque sabia da minha vida particular. Me falou que Sam estava na sua folha, que
recebia subornos.
Sai do restaurante aturdido, Sam se vestia
bem, bem como vivia num belo apartamento, em comparação com o meu, era todo um
luxo.
Já tinha me perguntado como ele podia viver
assim, me tinha respondido que vivia ao dia, que tinha passado muita miséria no
orfanato para viver como eu vivia.
Tanto é que nos encontrávamos em sua casa,
nunca na minha.
Eu seguia igual, ele queria que fossemos
viver juntos, mas eu tinha me acostumado, quando estudava um caso, ficar
sozinho. Tampouco gostava de compartir
nada disso.
Mal cheguei aonde trabalhava, lhe chamei,
marquei num lugar discreto, ele queria que fosse a sua casa, lhe disse que não.
Quando toquei no assunto, ficou branco, me
perguntou o que ia fazer.
Fazer, vou seguir em frente, limpei no
computador esse pedaço que fala de ti, mas se fosse tu, encontrava uma solução.
Dois dias depois levei uma surpresa,
cheguei em casa tinha uma bolsa encostada na porta, com algumas roupas minhas
que tinha deixado em sua casa, com um bilhete, iria trabalhar em Glasgow,
sentia muito tudo isso, mas não queria me colocar em situação difícil.
Fiquei arrasado, mostrei a gravação para o
Fiscal, o jeito foi uma reunião com o juiz, que levaria o caso. Era considerado uma pessoa dura, que seguia a
lei firmemente.
Quando escutou a gravação, me disse,
teremos um problema aqui, será como mexer num ninho de vespas, pois ele fala de
muita gente. Isso pode te criar
problemas, aonde trabalhas.
Foi quando o fiscal, me ofereceu para
trabalhar com ele, era uma saída, mas teria que depor no julgamento.
Quando o homem, tornou a me procurar, mal
entrou pela porta, eu já estava com a gravadora pronta. Se sentou comodamente na minha frente,
colocou um envelope que eu deduzi ser dinheiro, tinha preparado meu cometido, tinha
dois policiais na cozinha, esperando para entrar, bem como um que se fazia de
garçom.
O deixe falar tudo que quisesse, inclusive
me dizendo que com esse dinheiro, poderia melhorar, mudar para um apartamento,
como os policiais que faziam vista gorda para ele, o muito idiota, falou em um
que eu conhecia, que atualmente trabalhava na polícia portuária. Que estava bem
de vida, no fundo ele tinha certeza de que eu iria aceitar, principalmente por
causa do Sam, eu não podia abrir o envelope, tinha que ser ele, como não me
mexia, ele abriu, me dizendo, não me diga que é pouco.
Eu chamei o garçom, que tirou uma algemas,
lhe dando ordem de prisão. Ficou furioso, teu amigo vai pagar por isso. Mas o problema não era meu, além de que, se
Sam tivesse sido esperto não teria aceitado, ou se mandado para Glasgow como
dizia.
Tentaram me matar duas vezes, mas agora eu
estava esperto, nunca fazia o mesmo roteiro para casa, tampouco, ia sempre aos
mesmo lugares, se o fazia me sentava perto da porta da cozinha, pronto para
escapar.
A última vez, foi por pouco. Estava lendo uma carta de minha irmã que
estava no Congo, em um orfanato no meio do nada. Eu tinha férias para tirar, pensei, vou para
lá, assim passo um tempo fora de toda essa merda.
Foi quando me abaixei, a carta tinha caído
no chão, justo nesse momento, um tiro através da janela, quase me atingiu, o sujeito
não sabia que estava sendo seguido todos os dias por policiais do fórum.
Conseguiram pegar o pistoleiro, que disse
quem o tinha contratado, o julgamento foi um espetáculo, pois o traficante, era
um idiota, falou o nome de todos a quem ele pagava, seu advogado tinha tentado
trocar de juiz a toda custa, mas o mesmo não conseguiu.
Quando tudo acabou, me disse que se
vingaria de mim.
Sua vingança foi na prisão, era a mesma
aonde estava meu pai, só que esse como era, era o braço direito de um rival do
mesmo, tudo virou uma grande confusão, matou meu pai, ao mesmo tempo que o
outro o matava.
Quando me falaram, eu que nunca tinha ido
ver meu pai lá, disse, pelo menos o governo gasta menos dinheiro sustentando um
alcoólatra.
Em seguida tirei férias, fui passar um
tempo com minha irmã, no Congo, sair do inverno da Inglaterra, chegar no verão
da Africa, foi uma sensação impressionante.
Era esperado no aeroporto, por um padre,
esse ia em direção a missão, me levou com ele, eu fui fazendo como um
strip-tease, pois fui tirando a roupa, era muito branco.
Quando chegamos fui cercado por um grupo de
crianças, minha irmã já tinha comentado isso, como era alegres, viviam com o
mínimo, mas eram alegres.
Ela logo me arrumou coisas para fazer,
ajudava o médico com as crianças, eu como tinha sido bom nos esportes, fazia exercícios
com os meninos, corríamos em volta da missão, ajudava na hora de dar de comer a
tantos, alguns pequenos eu dava comida na boca, coisa que nosso pai nunca tinha
feito. Ao final, estava integrado ali,
mas claro a missão não podia me sustentar, mas de pensar em voltar a Liverpool,
era uma coisa difícil.
Escutei falar da Africa do Sul, o médico
era de lá, me deu um contato, foi o jeito, arrumei um emprego na cidade do
Cabo, mas claro tive que ir a Liverpool, pedir as contas, sabia que nunca mais
voltaria, nada me prendia ali, nem família, nem um romance, nada. Tinha o telefone do Sam, pois este tinha me
chamado muitas vezes.
O chamei para me despedir, lhe disse que ia
embora do país, ele tinha se adaptado a vida de Glasgow, lhe disse que andasse
na linha, para não ter que fugir outra vez.
Me perguntou para aonde ia, lhe disse que
para o Congo, não ia dizer que estaria na Cidade do Cabo.
Com os anos passando, eu cheguei a
conclusão que tinha feito a melhor coisa da minha vida, era sério no trabalho,
quando cheguei me olhavam desconfiados, o que faz esse inglês, aqui, depois
elogiavam minha maneira de trabalhar, de investigar algum caso, tentaram me
subornar, mas tinha aprendido, dizia logo na cara da pessoa, estas sendo
gravado falando isso, posso usar contra ti, melhor ires cantar em outra
freguesia.
Dava certo, nas férias ia para aonde estava
minha irmã, isso ninguém entendia, além de ser minha única família, eu
respeitava o que ela fazia.
Anos mais tarde, veio trabalhar em uma
missão mais perto, me facilitava, cada vez que tinha uma folga, ia até lá.
De uma certa maneira ela tinha encontrado
uma família com as crianças que cuidava, eu nunca iria formar uma, sabia
disso. Vivia da mesma maneira, jamais
ter um romance com alguém do trabalho, seguia sendo o homem de uma foda nada
mais.
Falavam de mim por isso. O que se tornou meu melhor amigo, quando
tocava no assunto, eu lhe respondia, para quem teve uma família como a minha, é
o melhor, lhe contei que tinha mandado meu pai a prisão, contei toda a
história, agora para mim, era como uma coisa muito longe, era como contar uma
historieta.
Nunca mais voltei a Inglaterra, não tinha
interesses lá.
Quando me aposentei, juntava uma parte de
lá, outra da Cidade do Cabo, comprei uma casa na praia, aonde inclusive apesar
da idade aprendi a surfar. Com isso era
a pessoa que escutava todos os rapazes, com seus problemas, procurava orientar,
sem nunca me envolver.
Creio que acabarei morrendo de velho, numa
residência de pessoas de idade, ou então sairei um dia ao mar com minha prancha
de surf, remarei mar adentro, que ele me leve para aonde queira.
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