LOST

 

      

 

Viu o recado no celular, quando na parada seguinte, o colocou para carregar, só o usava quando estava em alguma cidade, que parava, para um bom banho, arrumar roupas novas, fazer compras, encher seu carrinho do supermercado, para abastecer seu velho jeep, aonde estava tudo que necessitava.  Claro suas compras a maioria eram latas que ele usava para comer, as comidas enlatadas eram mais difícil de se estragarem.

Na traseira, estavam uma barraca do exército, além de sacos de dormir, uma bolsa com roupas, material de higiene, coisas assim.

Viu que a mensagem era da Anita, ou Nita como a chamavam ele bem como seu irmão gêmeo Paul.  Não se podia dizer quem tinha nascido primeiro, pois os tiveram que tirar através de uma cirurgia, uma cesárea, de última hora, que não estava planejada.

Chamou, imediatamente Nita, contestou, disse que estava no hospital, que sua mãe tinha tido um enfarte muito grave, a tempo que devia estar se cuidando, mas sabes como ela é, nunca dá o braço a torcer.

De uma certa maneira era o mesmo problema que tinha seu irmão Paul, algo congénito, os médicos não sabiam como ela tinha aguentado a tanto tempo.

Nita perguntou aonde ele estava, mas como sempre escutou um silêncio, mas tinha certeza de que ela controlava isso, pois administrava as contas da família, bastava olhar aonde ele tinha usado o cartão de crédito, mas claro, isso ele fazia no momento que deixava a cidade, ao mesmo tempo se abastecia de gás para cozinhar, bem como de gasolina.

Lhe disse que tomaria o primeiro avião até Sacramento, que lhe avisaria da hora, sabia que sua mãe estava justamente aí, pois era o hospital que usavam.

Desligou o celular, perguntou no supermercado se podia devolver a mercadoria comprada, tinha que pegar um avião.   A mulher do caixa o olhou de cima a baixo, como dizendo, um mendigo que vai pegar um avião.  Muito séria disse que nem pensar.

Saiu outra vez, viu uma mulher com os filhos pedindo dinheiro, chamou a mesma, bem como os dois meninos que estavam com ela, pegou antes um carrinho de supermercado, colocou tudo dentro, façam bom proveito, foi tudo que disse.

Dali foi para o aeroporto, estava em Daytona Beach, queria aproveitar o verão, foi até Orlando, conseguiu um voo para Sacramento, claro como sempre, o olharam de uma maneira superficial, aquele homem alto, magro, barbado, cabelos imensos, mal cortado, a roupa nem se fala era de segunda mão, um pouco maior no seu corpo, a bota que usava, estava suja.

Tinha tido o mesmo problema ao deixar o carro no estacionamento, foi seguido pelo policial da área até aonde se vendia as passagens, para sacanear, pediu uma de primeira classe, lhe faltava uma hora e meia ainda para o embarque, comprou roupas novas no Free shop, mas simples como sempre, nada de luxo, foi ao banheiro, tomou um belo banho, prendeu os cabelos num rabo de cavalo, penteou a barba, lhe dava já outra cara.

Quando saiu do banheiro o policial, lhe perguntou se queria fazer a barba, lhe disse que não tinha como.

Espere, voltou em um minuto, lhe trouxe uma navalha, riu muito, sabe, se vê que eres um homem desse que vão pelo mundo.

Ele fez a barba, só deixando um bigode imenso.

Vi seu jeep no estacionamento, acho um perigo, ficar todas essas coisas nele.

Tirou as chaves, entregou para o homem, tens aonde guardar isso para mim, já não posso sair daqui.

Confias em mim, assim sem mais nem menos.

Olhou a placa dele, leu seu nome, James Macthur, pronto já sei quem eres.

Mas trocaram o número de celular, foram até o bar, precisava tomar uma coca cola, para se relaxar, contou ao James, que estava indo de emergência a Sacramento, pois sua mãe tinha tido um enfarte, não sabia quanto tempo estaria fora.

Vou guardar tuas coisas na minha casa, nós iremos falando, me chame quando chegue, antes de embarcar foi ao banheiro outra vez, aproveitou para dar um beijo na boca do James.

O outro riu, esse bigode te deixa charmoso, se deram um abraço, o acompanhou para o embarque em primeira classe, não se preocupe com o jeep.

Se relaxou, a senhora que o acompanhou ao seu assento, estranhou que estivesse com os cabelos molhados, sem bagagem de mão nenhuma.   Lhe trouxe uma toalha, para assim não molhar o encosto do assento.

Fechou os olhos, foi como se ante ele passasse toda sua história.

Sua mãe era filha única de um fazendeiro, daqueles duro na queda, ela aprendeu o básico com sua mãe, mas nunca foi a uma escola, trabalhava desde jovem, como se fosse mais um dos cowboys da fazenda.  Era muito masculinizada, andado parecia um homem, ombros largos, quadril estreito, musculosa dos trabalhos do campo, enfim, para ninguém botar defeito.

Quando o velho disse que ela precisava pensar em ter um herdeiro, queria que ela se casasse, nem que fosse com alguns dos cowboys.

Um dia na cidade, falou com um médico, que a conhecia desde criança, qual era o problema do pai, não penso em me casar, aguentar um homem me enchendo o saco, basta ter que obedecer meu pai.

Tinha visto na sala de espera uma revista falando de inseminação artificial, perguntou a ele sobre isso?

Ele lhe explicou, tem uma clínica em San Francisco muito boa, quem a dirige é uma sobrinha minha.

Sem avisar ninguém, só a senhora que cuidava da cozinha, que basicamente a tinha criado, disse que ia até San Francisco, resolver um problema, mas sem dizer o que.

Foi para lá, se informou direito sobre como fazer, usando o banco de esperma.

Foi separando as pessoas que tinha doado, sem querer ao ver a cara de um deles, escolheu um, que dizia que estava no exército.

Se preparou com mandava a clínica, fez todos os exames, depois de tudo feito, a médica a avisou que seu tio, podia acompanhar a gestação.

Voltou para casa, sem dizer aonde tinha ido, nem porque, seguiu trabalhando como se nada, foi quando começou os problemas naturais de uma gravidez, vômitos, enjoos, essas coisas tão normais, mas escondeu bem, quando começou a crescer a barriga, no quarto mês, o médico lhe disse que eram gêmeos, riu quando fez o escâner, parece que estão de mãos dadas.

Seu pai, quando soube, a chamou de louca, como podia pensar nisso.

O mandou tomar no cu, a vida era dela, fazia o que lhe dava ganas.

Meses depois, no dia que rompeu águas, foi para Sacramento, se internou no hospital, sem avisar ninguém, o médico depois avisou seu pai.

Os trabalhos de parto estavam difícil, pois tinha o quadril estreito, quando viu que os meninos estavam de mãos dadas, achou melhor fazer uma cesária.

Riu muito, quando os retirou, pois seguiam assim, mas bastou uma enfermeira separar as mãos os dois romperam num berreiro infernal.

Foram juntos para o berçário, eram relativamente pequenos, por isso podia ficar no mesmo berço.

O médico depois me contaria que meu avô ficou babando no vidro do berçário, lhe perguntou como iam se chamar os dois?

Nada mais simples que John e Paul, mas como vais diferencia-los?

Num ponto era fácil, eu era um pouco maior, mas quem me segurava a mão era o Paul.

Se as separassem, ele imediatamente agarrava.

A senhora mexicana que cuidava da casa, ficou louca, quando nos viu, arrumou logo duas sobrinhas para cuidar dos dois.

Nem para o banho podiam nos separar, minha mãe, logo se fartou de dar as tetas, disse que isso não era com ela, o jeito foi a Naná, nos dar mamadeira, as duas que a ajudavam, se sentavam juntas, mas sem nos separar.

Talvez daí, que eu usasse a mão direita, ele a esquerda, assim não nos separavam.

Com o tempo, sim encontraram uma diferença, Paul tinha os olhos negros, eu azuis como da minha mãe.

Ela quando voltava no final do dia, do trabalho no campo, tomava um banho, se jogava com a gente no chão, brincando, nunca tinha tido uma boneca em sua vida, parecia que erámos isso para ela.   Dava graças a deus, não sermos meninas, pois a vida de uma mulher no campo, não era fácil.

O mais interessante, que encontrou ouvintes, pois falava conosco, como tinha ido as lides do campo.

Meu avô reclamava, pois queria ter pelo menos um no colo, mas claro, se nos separassem, os dois choravam.

Num dos exames médicos, o mesmo disse que Paul tinha algum problema, com o tempo descobriram que era autista, então a única pessoa com quem se comunicava era comigo.

Foi quando minha mãe que cada vez assumia mais o controle da fazenda, contratou a Anita, ou Nita, fazia as contas, nos ensinava a escrever, a juntar palavras, na verdade eu aprendia, depois ensinava ao Paul.  Não era nada complicado, entendi logo, que ele parecia estar olhando para outra coisa, mas se lhe dizia para montar seu nome, o fazia rapidamente, o meu igual, era como ser mais adiantado, mas numa coisa ele era melhor, nas matemáticas, quando aprendemos os números, ele o fazia rapidamente.

Uma vez por ano, quando ficamos maiores, Nita nos levava a escola para fazer as provas do curso vigente, eu fazia a prova, ao lado dele, depois repetia as perguntas para ele, com dois professores prestando atenção, ficavam era espantado com as provas de matemática, pois ele as resolvia rapidamente.

Estávamos crescendo, meu avô que era teimoso, resolveu que não podíamos seguir dormindo na mesma cama, comprou duas sem minha mãe saber, o jeito foi juntar as duas, era complicado, pois seguíamos dormindo de mãos dadas.

Com 16 anos, ele ficou doente, se descobriu que tinha um problema congênito de coração, o seu parecia um papel, eu não podia sair de seu lado, pois chorava, se ia ao banheiro, tinha que lhe dizer o que ia fazer, mesmo assim ele ficava assustado me esperando.

Um dia de manhã, notei que sua mão estava fria segurando a minha, não conseguia me soltar, chamei gritando a Nita, que veio correndo.

Tinha morrido durante a noite, tranquilamente, seu coração tinha parado.   Eu sempre tive um sono pesado, por isso, não escutei se ele tinha me chamado ou não, mas normalmente se despertava, apertava minha mão.

A sensação que tive, foi horrível, era como se tivesse construído um buraco imenso, aonde eu estava metido, nunca tinha pensado na vida em perde-lo. Alias minha mãe nunca deixava que nos aproximássemos de um enterro, ou um velório.

O pior, era que os animais da fazenda, estavam acostumados com ele, todos quando o viam, corriam para que ele lhes fizesse uma festa.  Agora me olhava na distância, como dizendo, aonde está o que queremos.

Talvez nesse momento, comecei a odiar a fazenda, ela era o refugio perfeito para ele, mas para mim, agora parecia uma prisão.

Todos os dias, Nita me levava até a entrada da fazenda, para pegar o ônibus da escola, eu ia contente, pois estava fora dos limites que me pareciam uma prisão, mas em contrapartida não estava acostumado a me relacionar com os da minha idade.

Minha notas eram sempre as melhores, mesmo em matemática, era como se o Paul me ensinasse a pensar para resolver os problemas.

O duro era dormir, pois ficava procurando sua mão, isso virou um problema, pedi a Nita se podia trocar de quarto, um que fosse menor, só com minhas coisas, mas não adiantou, eu sempre procurava sua mão.    A solução, foi que durante a noite, eu segurava minha mão esquerda.

Quando meu avô morreu, descobrimos, que no dia que nascemos, ele abriu uma conta, para podermos ir à universidade, ele nunca tinha estudado, minha mãe tampouco, mas queria que nos dois ou pelo menos um fosse a universidade.

Quando conversava comigo, tentava me convencer que o melhor que eu fazia, era agronomia, ou aprender a administrar a fazenda.

Eu lhe soltava que a Nita fazia isso muito bem, era dura na queda com os gastos.

Na verdade, era ela que se preocupava por mim, roupas, sapatos, tudo era ela quem me comprava, mesmo para minha mãe, antes de ir à universidade, descobrir que entre elas existia algo.

Pelo menos pensei, minha mãe não estará sozinha, já que meu avô tinha morrido meses antes.

Eu na verdade estava indeciso sobre o que fazer, conversei com a Nita a respeito, pois gostava de muitas coisas, tinha facilidade para línguas, pois desde criança, falava o espanhol, pois metade dos homens, as mulheres da casa, falavam.

Mas Nita me fazia pensar, no depois, tens que estudar alguma coisa, que depois possa ser uma profissão para ti.    Eu pensava, mas posso ser professor, pois tinha facilidade de ensinar, o fazia com meu irmão.

Mas até a véspera de ir, não tinha nada definido, fui até San Francisco com a Nita, minha mãe deixou tudo nas mãos dela como sempre.   Que não a tirassem de sua zona de conforto que era a fazenda.

Nita foi reclamando disso, depois da morte do Paul, minha mãe de uma certa maneira se afastou, disse a Nita que isso lhe doía, pois me olhava, ficava procurando minha outra parte.

Como tinha dinheiro, alugamos um pequeno apartamento, perto da universidade, eu iria de bicicleta, se chovesse podia ir de ônibus.  Consegui me matricular em filologia, no último momento resolvi fazer direito.

Meu tempo livre eu ia a biblioteca estudar, sai para conhecer a cidade, pelo menos tinha uns limites maiores.

A primeira vez que voltei, foi para passar Ação de Graça e Natal, para minha surpresa, minha mãe tinha encontrado um Jeep velho, o mandou restaurar para mim, foi num leilão do exército, tinha uma capota de metal, é o mesmo que tenho até hoje.

Voltei para a universidade com o Jeep, os rapazes vinham falar comigo, com uma certa inveja, só os que eram ricos, que tinham carro, a maioria último lançamento.

Tentei, porque um professor me forçou a isso, compartir grupo de estudos, mas eu acabava fazendo o trabalho sozinho, pois os outros só queriam aproveitar a vida.

Num desses grupos, escutei falarem de irem a uma praia para fazer surf.   Eu só tinha ido olhar a Ponte tão famosa, como ver a água, nunca tinha ido tomar um banho de mar.

Fiquei curioso, perguntei a um rapaz da biblioteca, se podia me conseguir um mapa, ou mesmo um guia.  

Ele riu, dizendo que eu devia conversar com meus amigos.

Acostumado a falar tudo que pensava, lhe soltei que tinha colegas de turma, mas amigos não tinha nenhum.

Ele ficou parado me olhando, soltou, mas para um tipo como tu, bonito, não tens nem namorada.

Fui honesto de dizer que nem tinha pensado nisso, que essas conversas sobre sexo que os outros tinham, me enchiam o saco.

Sem querer me vi falando com ele, sobre o vazio que sentia após a morte do Paul.

Ele me disse que ia sempre com seu namorado, a uma praia, que no momento estavam sem carro.

Eu disse que podíamos ir no meu jeep.

Tudo saiu espontâneo, pois era a primeira pessoa que eu falava sobre mim.

Seu namorado, era um dos professores de arte.

Lá fomos nós num final de semana, para mim foi um delírio, tinha aprendido a nadar a pouco tempo na piscina da universidade, aonde ia nos horários entre o meio-dia e a tarde, quando estava vazia.  Um professor me ensinou a dar braçadas, vamos dizer os primeiros movimentos, depois foi como cair num elemento que sempre gostaria.

A viagem foi excelente, embora o professor só falasse besteiras, quem estava com quem, coisas assim, até que o meu conhecido da biblioteca, começou a falar comigo sobre livros.

Chegamos no meio da tarde, depois de comer alguma coisa, eles foram dormir, eu me sentei na praia, vendo o pessoal fazer surf.

Uns rapazes se aproximaram, perguntando se eu não sabia fazer surf.  Fui honesto dizer que estava admirando, mas que não sabia.

Logo dois deles me ensinavam na areia os primeiros passos, depois a prova dos nove, entrar na água, remar, tentar o equilíbrio.   Nunca me diverti tanto, uma das primeiras vezes que me equilibrei, acabei caindo, pois senti que o Paul me segurava pela cintura, dizendo ao meu ouvido John, isso é bom demais.

Levei um susto, me cai, depois um dos rapazes me perguntaram por que eu tinha olhado para trás.

Não podia explicar, isso sempre acontecia quando estava só no Jeep, as vezes me virava para falar com ele, seguia dormindo, segurando minha mão esquerda, como se ele estivesse ali, algumas vezes sonhava que conversava com ele, mas de manhã não me lembrava de nada.

Na praia, tive minha primeira aventura sexual, com outro surfista, o que me emprestava sempre uma prancha, que tinha a mais.

Num primeiro momento, fiquei procurando o Paul, para saber se estava junto, mas não consegui me relaxar, de uma certa maneira foi frustrante, o rapaz se virou para mim, me perguntou o que eu estava procurando, se eu queria fazer sexo a três.

Fiquei literalmente horrorizado, pois nunca tinha pensado nisso, como explicar o do meu irmão.

Acabei lhe contando, ficamos muito tempo abraçado, lhe contei a falta que me fazia meu irmão.

Era como se ele estivesse nos vendo fazer sexo.

Me ofereceu marijuana, agradeci, mas me lembrei do que me dizia a Nita, como não sabiam nada a respeito do meu pai, se ele fosse um sujeito que usasse drogas, eu facilmente cairia na dependência, isso eu não queria.

Meu azar foi que no dia seguinte todo mundo da praia sabia da minha história, o sujeito que eu tinha dormido, contou para os outros surfista, que entre pena, como se eu fosse um sujeito desequilibrado, já não fazia parte do grupo.

Por sorte, o meu conhecido da biblioteca, discutiu com seu namorado, quis voltar, a casa estava no nome do outro, voltamos os dois em silêncio.

Quem rompeu foi ele, dizendo que era duro confiar numa relação a largo prazo, pois no momento que o sexo, ficava repetitivo, as pessoas se cansavam, iam buscar outras.

Me contou que tinha ido ao supermercado, quando voltou o namorado estava na cama com outro, queria que ele participasse, que isso para ele era complicado.

Sem querer lhe contei o que tinha me acontecido, creio que não me relaxei, foi frustrante.

Ele me aconselhou uma coisa, devias procurar um psicólogo, não ficar contando minha história para todo mundo, as pessoas não entendem.

Foi o que fiz, comecei a ir uma vez por semana a um psicólogo, contei tudo que sabia sobre como tínhamos sido concebidos, a vida dos dois juntos, que eu as vezes por costume, estava conduzindo, olhava para o lado, era como se Paul estivesse ali, acabava conversando com ele, como sempre tinha feito, falei do problema de dormir, pois sempre o fizemos de mãos dadas.

As vezes sinto uma falta dele imensa, quando comentei de que fiquei procurando na hora que fazia sexo como o surfista, como se eu precisasse que ele estivesse ali comigo nesse momento, isso eu não entendia.

Quando ele me perguntou se descobrimos o sexo juntos, lhe disse que honestamente não, pois Paul nunca pensava nisso, que sabíamos da concepção, por causas dos animais, porque Nita nos tinha explicado, como as pessoas nasciam.

Mas entre os dois, nunca falávamos nisso.

Quando falei dos sonhos que tinha conversando com o Paul, comentei que dificilmente me lembrava do que falávamos um com o outro nesses momentos.

Agora dormia com um bloco na mesa de cabeceira, por se acaso sonhasse, me lembrasse de algo.

Passei a ir a outra praia sozinho, fazia surf, mas não me entrosava com ninguém.

Estava para terminar Filologia, quando um dia fui ao banheiro da universidade, saiu de um dos reservados, um sujeito, foi lavar as mãos, quando se olhou no espelho, ficou assustado, eu era uma exata cópia dele.

Ficamos conversando, ele me levou a falar com seu pai, foi como me ver mais velho, abriu o jogo com os dois, quando era jovem, tinha realmente vendido esperma numa clínica, precisava de dinheiro para fazer a matricula da universidade, um amigo dele comentou a respeito, pelo menos completei o dinheiro da matricula.  Não tinha bolsa de estudos, nem nada no gênero.

Lhe falei do Paul, mostrei a fotos dos dois juntos.

Pela primeira vez uma pessoa, me soltou em plena cara, como devia ser difícil isso, ter a vida inteira compartido tudo com alguém, de repente ficar sozinho.

Nos contou mais ou menos sua vida, seu filho sempre reclamava disso, não sabia nada do pai.

Se chamava Sherader, sua família era da Alemanha, quando entraram aqui escreveram o sobrenome errado, ficou por isso mesmo, viviam numa sociedade fechada numa vila do interior, ele quando pode escapou para San Francisco.  Por isso para pagar a universidade, pois estava atrasado nos estudos, tinha vendido seu esperma.

Trabalhava num jornal, era o editor a anos, antes estive por aí, viajando o mundo, escrevendo sobre qualquer coisa.  Foi como realizar um sonho, a mãe do meu filho ficou doente, por isso aceitei o cargo de editor, ela já tinha horror a ficar mudando de lugar.

Creio que como todos a principio gostamos, mas o tempo cansa, James, meu co-irmão, como ele dizia, tinha horror a isso, quando muito escapava para fazer surf.

Ainda fomos durante um tempo, ele sempre reclamava que o pai, sempre estava voltado para si mesmo, pois passou a curiosidade natural de me conhecer, passei a ser um a mais da multidão.

Nunca me perguntou sobre minha mãe, sobre meus sonhos, tampouco fazia isso com o James, dizia que o que ele escolhesse estaria bem, pois era sua vida.

A única coisa que o surpreendeu, foi meu jeep, o examinou detalhadamente, disse que tinha usado um quase igual na guerra do Vietnam, aonde foi jornalista.

Quando comentei com a Nita sobre ele, me disse para não comentar nada com minha mãe.

Na hora não entendi por quê.

Quando ia para as férias de Natal, lhe perguntei se podia levar o James?

Me disse para pensar, tua mãe ultimamente não para de falar no Paul, isso pode ser complicado.

Acredito que nessa época já sabia que podia morrer de uma hora para a outra.

Quando cheguei, até levei um susto, pois me abraçou, me beijou, coisa que nunca fazia, passou as mãos pelo meu rosto, senti muito a tua falta, sonho muito com teu irmão.

Depois um dos dias soltou, que acreditava que não tinha sido muito boa mãe, pois nos tinha tido, para que seu pai parasse de falar em herdeiros.

Se Paul não tivesse morrido, ele claro tomaria conta da fazenda, mas tu eres mais de cidade.

Foi quando resolvi, sair para conhecer o mundo, sem falar com ninguém, tampouco consultar, apenas comuniquei a Nita, que ia sair de viagem.

Carreguei bem o jeep com o que necessitava, nada demais, tomei a decisão de não ter bagagem, além do necessário.

A principio ainda, tentava lavar as roupas, mas planejava melhor, comprava duas calças jeans, iguais, camisetas, pacotes de cuecas, se podia tomar banho bem, senão, conseguia lavar a cara, escovar dos dentes, fui deixando os cabelos, crescerem a barba, pela primeira vez, não voltei em Ação de Graça, tampouco Natal, fui pela parte debaixo seguindo toda a linha da fronteira com o México, era interessante, apesar de ser alto, claro, como falava espanhol, as vezes pensavam que eu era mexicano.

Mas tinha sempre escondido, um cartão de crédito, documentos, para o caso de ter problemas, convivi com todos os tipos de pessoas.

Mas o que gostava mesmo era de dormir, no campo, no deserto, olhando as estrelas, as vezes dormia num motel desse da beira da estrada, mais para tomar um bom banho, mas acabava sentido falta de dormir ao ar livre.   Me perguntava as vezes, porque nunca tinha feito isso na fazenda, apesar que esta tinha uma varanda imensa, Paul sempre queria dormir fora, para olhar as estrelas, por isso seu lado da cama era perto da janela, esta estava sempre aberta para isso.

No meio desse largo caminho, algumas vezes tive aventuras, principalmente com motoristas de caminhão, diziam que eu tinha um corpo duro e enxuto.  Era uma verdade, talvez por causa do que comia, que nunca era muito, mais para me manter fisicamente.

Quando chegava a alguma cidade grande, primeiro comprava roupas novas, sempre nesses grandes mercados, fora da cidade, ia para algum Motel, tomava um banho, vestia roupas novas, jogava todas as anteriores fora.  Conhecia a cidade, escutava as pessoas falando, o sotaque das mesmas, que pela sua maneira de falar fui identificando.

As vezes passava mais tempo em algum lugar, porque tinha gostado, ou porque era verão queria aproveitar a praia.  Levava sempre na parte de cima do capô, uma prancha de surf, assim aproveitava.  Se parava em algum lugar, era inclusive capaz de dormir ali em cima, deitado na mesma.

Nas praias, os rapazes vinham sempre conversar comigo, descobri assim que em cada lugar esses mesmos rapazes, usavam termos diferentes para mencionar alguma coisa relativa ao surf.

Eu como era curioso, perguntava o que queria dizer.

Se nessa época tivesse um psicólogo, ele diria que eu alimentava o sentimento, de que quando fazia surf, era como se Paul, estivesse junto comigo, se me deitava em cima da prancha, esperando uma boa onda, conseguia conversar com ele, mas com o tempo deixei de falar em voz alta, pois podia me chamar de louco.   Em cada lugar que parava, no último dia, antes de ir embora, chamava minha mãe, claro quem atendia sempre era a Nita, soltava logo, que estava cada vez mais fechada em si mesmo, que sua única alegria era estar montada num cavalo, ajudando os cowboys, esta sempre dizendo o mesmo, que nasceu errado, que teria que ter sido homem, para ir de rodeio em rodeio.

Sem que ela me dissesse nada, sabia que ficava na fazenda, por isso, pela minha mãe, que segundo ela tinha sido o melhor da sua vida.

Minha mãe ao contrário, quando se colocava no telefone, nunca perguntava aonde eu estava, sabia que não ia lhe dizer, resmungava que a vida estava muito chata, que se não pudesse montar, não sabia como seria, a realidade era que nunca tinha tirado umas férias em sua vida, dizia que já vivia de férias o tempo todo.

Mas sempre ao final dizia que tinha sonhado com o Paul, ele sempre está presente aqui comigo.

Um dia soltou que tinha sonhado com ele, que dizia que amava fazer surf comigo.

Eu nunca tinha comentado isso com nenhuma das duas, então tive certeza de que ele realmente aparecia em seus sonhos.

Estava dormindo numa praia deserta, deitado em cima da prancha, quando ele apareceu nos meus sonhos, dizendo que realmente a prancha era uma coisa interessante, inclusive servia de cama, mas os dois juntos na mesma era impossível.   Me disse que minha mãe estava muito fraca, que não aguentaria muito tempo.

Foi quando na cidade seguinte, falou com a Nita, sabia que tinha que correr, poder ver sua mãe viva.

Se fosse de outra maneira ele teria ficado com o James Macthur, tinha gostado imensamente do sujeito.

Meio sonolento, ainda pensou se devia avisar seu pai, ou seu meio irmão, mas pensou, para que, nunca conviveram, nem sabe da existência um do outro.

Ele mesmo pensava as vezes que tinha sido somente um encontro, pois nunca mais se procuraram.

Deveria ter voltado a San Francisco, para terminar a universidade de Direito, lhe faltava fazer as práticas, mas sabia que nunca seria um advogado, realmente el poderia ser muitas coisas, pois para ele era fácil, mas agora se pensava, trabalhar de terno, gravata, fechado o dia inteiro num escritório, isso não seria com ele.

O dinheiro que recebia da mesada que a Nita lhe depositava, serviam para comprar comida, gasolina, algo de roupa, quando a anterior já estava uma merda.

Sempre achava interessante, quando chegava a algum lugar, que arrumava um quarto para dormir, as pessoas o olhava de cima a baixo, tinha sempre que apresentar seus documentos, esperar a confirmação do cartão de crédito.

Retirava sempre uma quantidade de dinheiro, não muita, só para uma emergência, as tinha bem escondida no Jeep.

Sem querer ao longo desses anos de estradas, tinha agora um jeito de caminhar, relaxado, nas cidades, fazia longas caminhadas para conhecer as mesmas, gostava da sensação de se perder, como se isso o fizesse conhecer a mesma.

Se lembrou sem querer que em New Orleans, parecia uma pessoa mais, com suas roupas relaxadas, mais parecia um vagabundo, tinha ido parar num desse lugares cheio de casebres, a beira de um pântano, uma senhora lhe perguntou se estava perdido.

Sem pensar muito lhe disse que não, sua única reclamação era que o sol estava forte, tinha sede.

Ela lhe ofereceu um copo d’agua, ali na sua varanda, de uma casa velha de madeira.

Começou a falar com ele, disse que dias deste sua penitência ia terminar, vê, saíste pelo mundo, esperando se livrar do fantasma de teu irmão, mas ele sempre esta contigo, na verdade era que eram um só, que nasceram divididos em duas pessoas, por isso terás que viver até os fins de teus dias, com essa sensação de fazia, sem o ter ao teu lado segurando tua mão.

Mas graças a deus, ele não é um fantasma que traz problemas, ele é o teu protetor.

Ficou olhando para a mulher, ela inclusive falou o nome do Paul, ele está sempre ao teu lado esquerdo, assim tens liberdade para o lado direito.

Falar com essa mulher de idade não definida, foi um balsamo para ele, sabia que não estava louco.

Ela ainda comentou que sua vida, sempre séria perto da água, o campo não é para ti, riu muito dizendo que Paul estava dizendo que adorava fazer surf com ele.

Abriu a boca, pois não tinha comentado nada com a mulher.

Ficou ali na sua casa uns quantos dias, ela lhe avisou que lhe estavam procurando, pois tinha deixado o jeep, na garagem de um hotel, pensam que aconteceu alguma coisa contigo.

Se despediu dela, quem sabe um dia volto.

Não estarei mais aqui, mas não se preocupe, já falei tudo que tinha que falar contigo.

Quando chegou ao hotel, imaginavam que tivesse lhe acontecido alguma coisa, mas não deu muitas explicações, arrumou suas coisas, tomou um bom banho, seus cabelos estavam larguíssimos, já nas costas, agora sempre andaria com eles, preso num rabo de cavalo.

Nesse momento escutou avisarem que estavam aterrissando.

Saiu, como estava sem bagagem nenhuma, tomou um taxi, foi para o hospital, aonde estava sua mãe.

Nita ficou abraçada com ele, com a cabeça nos seus ombros, não se assuste, mas está muito magra, a doença esta acabando com ela, além da amargura, de não poder montar mais a cavalo, é como se uma parte dela tivesse morrido.

Quando entrou no quarto, ficou parado, pois estava dormindo, com os cabelos espalhados sobre o travesseiro.

Realmente sua cara era pele e osso, mas ali estava sua mãe, se sentou ao seu lado, ela despertou lentamente, eu sabia que ias chegar, Nita, bem como o Paul, me disseram que vinhas, que estavas do outro lado do pais, mas que vinhas me ver.

Nita saiu com a desculpa de buscar café para os dois.

Ela sorriu, não sei o que seria de mim sem essa mulher, dedicou toda sua vida me cuidar, bem como de vocês.

Perguntou como tinha sido essa ida dele pelo mundo, até aonde tinha ido nesses anos todos?

Ele riu, para uma pessoa que vai sem bagagem, sem pressa, fui conhecendo as pessoas, as cidades, disse aonde tinha chegado, que para muitos seriam muitos anos, mas que para ele tinha sido como um conta-gotas lento.

Nunca deixei de estar com o Paul, sem querer lhe falou da senhora que tinha conhecido em New Orleans, que os dois na verdade eram um só, por isso sempre estava com ele, inclusive me falou que a senhora realmente sonhava com ele.

Eu basicamente sonho todos os dias, quando estou sobre a prancha, sempre tenho a sensação que esta comigo.   Finalmente contou para ela, o que tinha acontecido na primeira vez, que tinha levado um susto.

Nita me contou que encontraste teu pai?

Sim, realmente era ele, pois fiz um teste de ADN, mas é um homem que vive no seu mundo, nem ao seu filho, parece dar muita atenção.   Me disse um dia, logo que nos conhecemos, que graças a deus eu tinha tido uma mãe, que nos deu atenção aos dois.

Eu o corrigi, dizendo que também tínhamos a Nita, pois ela nos cuidou como seus desde pequenos.

Isso é uma verdade, nunca entendi meu pai, querer que eu tivesse herdeiros, tudo por causas destas terras, Paul adorava estar na fazenda, mas creio que saíste a esse homem que é teu pai, pois necessitas do mundo.   A Nita também está farta de estar lá, principalmente agora que leva tudo sozinha.

Quando eu morra, me enterre ao lado de teu irmão, há uma boa oferta pelas terras, venda, compartilhe com ela, a leve a realizar seus sonhos.

Foram três dias conversando, de um lado estava a Nita, de outro ele, no final do terceiro dia, ficou olhando para frente, só disse, Paul veio me buscar, fechou os olhos, deu um largo suspiro, morreu lentamente.

O médico depois de atestar sua morte, disse que tinha sido uma paciente forte, pois em momento algum reclamava de dores, ou queria um paliativo.

Os dois rapidamente obedeceram suas ordens, contactaram o advogado, que tinha suas últimas vontades, ser enterrada como tinha sido o Paul, num caixão de cedro, bem simples, nada de velório, só queria que estivessem presentes as famílias da fazenda, que depois ele aproveitassem se estivessem todos ali, lesse seu testamento.

Assim o fizeram, nada de missa, apenas as senhoras dali, rezaram por ela.    Cavaram justo ao lado do Paul, para colocar seu féretro.

Depois todos os empregados fixos da fazenda, se sentaram com o advogado na cozinha, alguns estavam ali a muitos anos.

O advogado disse que eu tinha direito a cinquenta por cento das terras, a Nita vinte por cento, que os outros trinta deviam ser distribuídos entre os homens que a tinham acompanhado todos esses anos.  Isso causou um impacto nos homens.

Depois leu o que ela tinha antecipadamente combinado com a pessoa que queria as terras, que os que quisessem ficar, poderiam.  Mas que Nita analisasse com o capataz, para vender o gado, os cavalos, o material de campo, isso não estava incluído no preço das terras, mas que eu resolvesse ficar, teria que a partir desse dia, compartir trinta por cento dos lucros com os empregados.

Já tinha conversado com Nita, ela queria ter a chance de ir embora dali, não tinha mais motivos para ficar, a não ser que eu precisasse dela.

Disse que não, tinha pensado em seguir mais um trecho da viagem, depois me assentaria perto do mar, pois necessitava disso.

Para minha surpresa, ela disse que não precisava desse dinheiro todo, que iria entrar para uma ordem, ia ser monja, aí começou a rir, o melhor e guardar isso num banco, pois se não me acostumo, posso ir me encontrar contigo em algum lugar.

Todos os dias falava com o James, num determinado horário, pois tinha o fuso horário.

Sempre dizia rindo, que me esperava, sentia ainda o sabor dos meus beijos em seus lábios.

Quando tudo ficou resolvido, foi tudo depositado na minha conta, minha parte, bem como o lucro da venda do gado, cavalos, tratores, etc.   Quem negociou tudo foi a Nita.

Lhe disse que ela daria certo em qualquer lugar.

Poucos homens ficaram a maioria, com o valor que lhes tocava, podia comprar um pouco de terras para cultivar, colocar a família para frente.

Quando fui olhar, minha conta no banco, pois tinha que transferir a da minha mãe também, vi que tinha uma boa soma de dinheiro sem tocar, pois gastava muito pouco.

Decidi, separar uma parte, para o amanhã, abri uma conta num banco, coloquei basicamente oitenta por cento aplicado, assim iriam rendendo em quanto eu estivesse por aí.

Já se tinham passado um mês, tomei um avião, voltei para recuperar meu jeep, minha vida.

James, estava me esperando, me deu um abraço de urso.

Me passou as chaves, me ensinou como ir a sua casa.  Na garagem, estavam guardadas minhas coisas.

Tirei uma semana de férias, vamos dizer assim, nos dávamos muito bem na cama, ele nunca me perguntou se eu tinha dinheiro nada disso.

Um dia lhe disse que iria seguir viagem, iria subir até a fronteira com o Canadá, pela linha da praia, que depois voltaria por dentro, ou resolveria o que fazer da minha vida, se ele queria ir junto comigo.

Ficou me olhando, para dizer isso é que estas forrado de dinheiro, não posso competir contigo, tudo que tenho é uma pensão do governo, por ter sido ferido numa guerra, por isso trabalho de segurança.

Eu fiz com ele a conta do que gastava, ele riu, gastas menos do que eu mantendo essa casa, ele tinha herdado a casa dos pais, era muito grande para uma pessoa sozinha.

Me contou que quando o pai a construiu, pensou em ter uma família imensa, mas isso não aconteceu, só nasci eu.

Vou tirar umas férias, te acompanho, se me acostumo, sigo contigo.

Tivemos que encontrar um jeito de ter mais uma prancha de surf encima, além de que aproveitamos, compramos novas roupas de Neoprene, pois subindo a água era mais fria.

Agora já não precisava falar com o Paul, quando vimos o mês de férias que ele tinha passou rápido.  Ficamos sentados na praia, conversando, foi claro comigo, eu coloquei na minha cabeça que estava de férias, foram uma maravilha, mas gosto da rotina da minha vida, a casa, meu trabalho, os finais de semana fazendo surf.   Tu ainda não sabes aonde iras parar, gosto como levas a vida, sem luxo nenhum, mas vai chegar o momento que terás que parar para pensar.

Eu realmente poderia voltar com ele a Daytona Beach, mas gostava mais das praias do outro lado.   Vou sentir tua falta, eres a primeira pessoa que compartilho minha vida, mas ainda realmente não sei aonde será meu pouso.

Vinha falando sempre com a Nita, não tinha se adaptado a vida num convento, não era a sua, ao contrário, ela pensava com isso, encontrar a paz, mas dias trás dias penso na tua mãe.

Ela ficou de vir se encontrar com ele, em NYC, que queria conhecer, depois iriam atravessar o pais inteiro, fazendo a rota 66, aí decidiriam o que fazer.

Insistiu com o James, mas ele tinha sua casa, depois me toquei que nunca tinha falado com ele, que o amava ou coisa assim, na verdade não sabia se era algo assim o que sentia por ele.

Nita chegou a NYC, dois dias depois que o James tinha ido embora.

A viagem transcorreu com largos papos, num ponto segundo ela eu era parecido a minha mãe, que nunca dizia o que sentia realmente.

Como tinha lhe contado a história com o James, me disse o quanto era importante a outra pessoa se sentir querida.

Numa das paradas, resolvi lhe chamar, quem atendeu o celular, foi outra pessoa, espere te passo ao James, o escutou dizendo, de uma maneira carinhosa, James, alguém quer falar contigo.

Estava mais seco quando falou comigo, já se passou um mês, só agora me chamas?

Não sabia o que dizer, me desculpei, lhe disse que estava tentando entender a mim mesmo com relação aos sentimentos, nunca tinha expressado o que sentia.

Não é verdade, sempre que falas no Paul, expressas o que sentes, não sei se procuras alguém que se pareça com ele, mas isso não existe.

Quase lhe disse que sim, depois o jeito foi enfiar o rabo entre as pernas, como um cachorro rejeitado, seguir em frente, comentei isso com Nita.

Na verdade foi uma grande perda para todos, sei o quanto sentiste, estavas ligado a ele desde antes de nascer, eu mesma que tinha aprendido a entende-lo, foi duro.

Tua mãe, levou a pior parte, pois como quase não conseguia se comunicar com ele, se culpou a vida inteira disso, de não ter tentado mais profundamente.

Mas realmente se procuras alguém parecido com ele, isso será difícil.

Lhe recordei do meu encontro com meu outro irmão James, quando nos olhamos através do espelho, a confusão que senti nesse momento, o encanto se quebrou quando falou, pois sua voz era diferente, depois o descobrir que eram filhos do mesmo homem.

Quando chegaram a San Francisco, telefonou para ele, marcaram de jantar, Nita, ficou impressionada com o parecido.

James, disse que realmente os dois eram parecidos ao pai, este apareceu mais tarde, houve imediatamente uma antipatia de ambas as partes.

Nita não sabia explicar por quê?

Seu pai Paul, ficou bravo, por ele não ter se comunicado a tantos meses, nem para falar da morte de sua mãe.   Queria saber o que ele ia fazer?

Se queres trabalhar como jornalista, posso te ajudar.

Viu que a cara do James, seu irmão se fechava, a sua resposta pareceu suavizar, disse que não sabia aonde fixaria a sua vida.   O que os dois iriam fazer agora, já que vinham falando nisso a viagem inteira era fazer um curso de escritura.

Acreditava que isso seria como uma complementação ao seu curso de filologia.

De repente uma chamada, fez com que ele fosse embora.

James enfim soltou, eu pedi uma chance para ele no jornal, nunca me deu atenção.  Ficaram de se falar.  Dias depois James lhe chamou, contou que o pai, estava fora do pais outra vez, tinha ido a uma entrevista num jornal de Londres, que o queria como editor.

Quando lhe perguntei se podia ir com ele, me disse que eu já era adulto suficiente, para encaminhar minha própria vida, ele sempre foi assim.

Tampouco se despediu dele, simplesmente ficou sabendo que saia outra vez da sua vida.

Resolveram fazer o curso em Los Angeles, assim ficaria mais perto do mar.  Arrumaram num edifício perto da praia, dois apartamentos pequenos, Nita adorou, pois tinha aprendido agora a viver sozinha, para ela mesma.

Apesar de fazerem o curso juntos, os dois iam em direção contrária.  Ela fez novas amizades, pois na turma existiam pessoas de sua facha etária.

Ele não encaixou no curso, não sabia o que esperava.

Um dia lendo no jornal, viu que precisavam de professores numa escola para crianças, com o mesmo problema de seu irmão.

Foi a entrevista, quando viu já estava trabalhando.  Se saia bem, mesmo com as crianças mais complicadas, procurava descobrir nelas, como chegar até seu circulo fechado.

Pela primeira vez, sentia que estava fazendo uma coisa que gostava, criou uma rotina, tinha seus horários de trabalho, depois ia até a praia para fazer surf.

Um dia encontrou na praia um dos alunos, com seu pai, este com extrema paciência o ensinava os primeiros passos de fazer surf.

Quando sentiu que ele se irritava, se aproximou, antes disse, temos que nos molhar, levou o garoto pela mão até a água, ficaram ali na beirada, o menino olhou para ele, sorriu, depois disse que gostava.   Até esse momento, ele quando estava ensinando os meninos, ele nunca tinha falado nem uma palavra.

Quando comentou isso com o pai, esse reclamou que as vezes perdia a paciência, tinha uma vida estressante, lhe perguntou como conseguia se comunicar.

Sem querer se viu contando a vida do Paul, como tinham chegado ao mundo, de mãos dadas, depois como ele era o elo dele com o mundo.

Não sabia se por causa do Robert, como os outros agora viam como se comunicavam, mais alunos foram se abrindo com ele.

Quando viu, o tempo tinha passado, Nita com o dinheiro que tinha abriu uma pequena livraria, aonde as pessoas além de comprarem livros, se sentavam para conversar, sobre o que estavam lendo, o que pensavam.   Tinha de uma certa maneira reconstruído sua vida.

Ele agora vivia mais distante, pois tinha se mudado para um apartamento perto da escola.

Um dia Robert, ao se encontrarem outro vez na praia, soltou ao pai que ele tinha um jeep diferente, arrastou o pai até o jeep.

Começaram, a conversar, quantos anos tinha esse jeep, contou que tinha feito uma viagem larga com ele, se procurando a si mesmo, procurando algo para se encontrar, sem saber que o que estava fazendo agora era perfeito para ele.

A cada passo que avançava com algum aluno, se sentia satisfeito.

Os diretores da escola, elogiavam sua paciência, pois alguns professores, com os anos perdiam a paciência, procuravam outro trabalho.

Um dia a diretora pediu se ele podia acompanha-la, pois tinham deixado um garoto num orfanato, acreditavam que o mesmo era autista.

Foram os dois até lá.  O menino quando o viu, se aproximou, segurou sua mão, lhe disse baixinho, sou Paul.

Foi como uma descarga elétrica, sentou-se no chão, ficou olhando para ele, não podiam ser mais diferentes, o menino era negro, com uns olhos impressionantes verdes, ficou segurando sua mão esquerda.

Não disse mais nenhuma palavra, ele fez uma coisa, viu ali um jogo de números, era peças de madeira, quando o pegou o garoto se matava de rir, começaram a jogar como ele fazia com seu irmão.

Depois de ter que provar que podia sustentar o garoto, conseguiu adota-lo, primeiro lhe deram a guarda do mesmo, o registrou com seu sobrenome, uma assistente social, vinha todas as semanas na escola, ele a foi ensinando como se comunicar com ele.  

Esta agradeceu muito, era jovem, tinha começado a pouco tempo nesse trabalho, disse que ninguém ali tinha experiencia em tratar jovens com esse problema.

O menino já estava a mais de um mês, com ele, quando o levou para conhecer a Nita, essa olhou espantada para ele, lhe perguntou por que tinha colocado o nome de seu irmão no garoto.

Não fui eu que coloquei, quando me viu, me pegou a mão esquerda, me disse, eu sou o Paul.

Depois sem querer um dia que estava ensinando o Paul a fazer surf, ele adorava a água, se equilibrava bem na prancha, o mais interessante, era como se tivesse feito a vida inteira, não teve mais a sensação de que seu irmão estava com ele na prancha.

Se lembrou das largas conversas que tinha tido com a senhora em New Orleans, mas algo lhe dizia que já não estava viva.

Uma noite, sonhou com ela, disse que realmente era o Paul, ele vai te acompanhar até o final de sua vida.

Pegou uma grande soma de dinheiro, doou ao orfanato, sei ia lá com o filho, assim levava coisas para as crianças.

O mais interessante, foi que tinha pensado que Nita, se interessaria, mas ela agora tinha sua própria vida, a sua maneira era feliz.

A inteligência do menino, principalmente nas matemáticas, era impressionante, aprendia tudo que lhe ensinava.  Gostava de desenhar, de escrever histórias, de noite, ao invés dele contar alguma história para ele dormir, era ele quem lhe contava.

Um dia ficou de boca aberta, começou a contar a história da senhora de New Orleans, que era descendente de negros como ele, o que lhe impressionava eram os detalhes, comentando que tinham vindo da Africa, num navio apertado, pensou que ele tivesse visto um filme, mas era capaz de contar com detalhes, de aonde tinha partido.

Procurou se informar, foi quando um historiador negro lhe contou, que muitos barcos saiam da Ilha de Gorée no Senegal.  Agora esse homem, negro como o Paul, vinha sempre os visitar, iam a praia, apesar de ser só um pouco mais velho que ele, tinha os cabelos brancos nas têmporas.

Bob, contou o largo caminho que tinha percorrido, para se aceitar, quando falou da sua mãe, ele ficou arrepiado, a descrevia, como uma senhora que sabia da magia ancestral, que era de New Orleans, quando lhe mostrou uma foto antiga dela, ficou rindo.

Bob lhe perguntou por quê?

Ele lhe contou o que lhe tinha passado, quando estava perdido na vida, que ela o tinha abrigado em sua casa, que tiveram largas conversas, me fez aceitar que eu devia encarar com normalidade, o fato de ter a sensação de ter meu irmão perto de mim.

Quando contou como tinha sido o encontro com seu filho, Bob ria muito, disse, muito típico dela isso.

Ele ao contrário, tinha tido complicado isso, assumir que sua mãe era uma mulher especial, lhe dava atenção, mas sempre estava atendendo alguém que parecia precisar mais dela, que ele.

Se me perguntas como segui em frente, ela sempre me conseguia fazer estudar, queria que eu fosse alguém, não como ela, uma analfabeta.

Mas eu não herdei nada das faculdades que ela tinha.

Quando vim para cá, estava na dúvida, pois tinha um bom cargo na universidade de New Orleans, mas antes de dar uma resposta, sonhei com ela, me repetindo uma coisa que tinha me dito muito antes de morrer, que me desse a oportunidade de encontrar outro mundo, um novo começo, que ali, eu já tinha feito tudo.

Mal chego aqui, me pedes para falar sobre o a história que te conta teu filho, as coisas foram encaixando. 

Quando viram estavam vivendo juntos, não lhe importava que falassem dos dois, ele tão branco, vivendo com um negro, bem como um filho negro.

Quando Paul, fez quinze anos, foram realizar o sonho dele, foram ao Senegal, estiveram viajando pelo pais inteiro, no final ficaram uma semana, na Ilê de Gorée, ele era capaz de detalhar tudo que via ali.  Se hospedaram numa casa, a senhora ria muito com ele, pois nunca notou que ele era autista.

Conseguia falar com ela em francês, além da matemática, ele tinha facilidade em línguas.

Esta mulher o levou para falar com uma senhora que vivia num casarão caindo aos pedaços.

Essa ria muito com ele, parecia um reencontro, esta lhe contou uma larga história, que de noite ele repetia aos dois.

Ele mesmo se sentia a gosto ali, nunca tinha sido uma pessoa de se olhar no espelho, Bob ria muito com ele, pela maneira como se vestia, abria o armário, em que as roupas eram mais ou menos parecidas, se vestia sem olhar, tampouco se olhava no espelho para fazer barba, agora tinha os cabelos compridos outra vez, mas cheios de raias brancas.

Sabia que estava ficando velho.

A melhor surpresa teve ao voltar, pois Paul tinha escrito uma bela história, Bob escondido dos dois, mandou para um editor, que tinha publicado um livro dele.

O homem apareceu na casa deles, pensou que a história tinha sido escrita pelo Bob, mas quando descobriu o Paul.   Este se sentou, segurou a mão do homem, falou do que ele andava sentindo, que ele tinha flash, como se alguma coisa de um passado que ele sabia que não era dele, aparecia em sonhos.

O homem tinha vindo a Louisiana, disse que sua família era tremendamente fechada, preconceituosa, pois tinham sido ricos no passado.

Por isso ele tinha colocado pés no mundo, primeiro estudou em NYC, lá começou a trabalhar como editor, até vir para Los Angeles.

O lançamento do livro, fez sucesso, pois era um garoto, nas entrevistas os dois o acompanhavam pois era menor de idade.

Todo o lucro do livro, ele tinha doado ao orfanato de aonde tinha saído.

Depois escrevia mais histórias, dizia que as pessoas vinha de noite quando dormia contar para ele.

Era interessante como ele dormia, segurava sua mão esquerda como para recordar alguma coisa.

Quando se formou na universidade, John estava feliz, tinha convidado a Nita para ir, mas havia alguma coisa que a incomodava com relação ao seu relacionamento, um dia ela se abriu, eu sempre sonhei para ti, uma família branca, com era a da sua mãe, mas agora lendo o livro de teu filho, entendi, porque tinha essa facilidade, em te relacionar, com os mexicanos que viviam por lá, nunca fizeste diferença nenhuma, já teu avô se referia a eles, como chicanos, apesar que a maioria dos empregados da fazenda eram mexicanos, nunca foi amigo de nenhum.

Até comentou com sua mãe, se ela tinha escolhido bem o esperma, se era de um branco.

Agora deve estar se revirando na tumba, pois vives com um negro, tens um filho lindo negro.

Ele nunca tinha ser preocupado com isso.

Sabia que ela tinha um largo relacionamento com uma mulher, como tinha tido com sua mãe, mas nunca o apresentou, era como se fosse parte de uma vida que ela não queria compartir.

Quando ela morreu, a senhora o avisou, foi quando a conheceu, a tinha visto várias vezes quando ia a livraria, mas nunca tinha falado com ela, pensava que era uma empregada.

Só então descobriu que Nita tinha reconstruído uma outra vida, que não o procurava, pois queria esquecer do tempo que tinha vivido com sua mãe, que nunca tinha lhe dito que a queria.

No enterrou falou, de quanto ela tinha sido importante em sua vida, desde sua infância, de como tinha cuidado dele, de sua mãe.

Mas a vida nos afastou várias vezes, agora creio vai descansar.

Paul filho, leu um poema que tinha escrito, para essa mulher dos tempos passados, foi emocionante, a mulher que vivia com ela, o abraçou muito.

Ele seguiu trabalhando na escola enquanto aguentou, quando se aposentou, organizou sua vida de tal maneira, que pudesse se dedicar mais tempo à sua família.

Os três tinha seus dias para fazer surf juntos, a muito custo o Bob tinha aprendido, dizia que tinha inveja do mar, pois este os recebia como coisas deles.

Paul, se tornou um emérito professor de Yoruba da universidade, por isso, viajaram muitas vezes pela Africa.  Este ria muito, dizendo que seu pai, apesar de branco, era mais negro que muitos quando estavam por lá.

Bob dizia sempre que sua mãe é que tinha razão, que um dia o que na juventude ele tentava escapar, agora o tinha cativo para o resto de sua vida.

Segundo um homem muito velho, que iam sempre visitar quando iam a Nigeria, esse dizia que o seu menino, tinha poderes, por ter consciência das várias vidas que tinha vivido, mas nem por isso, tinha obrigação de fazer jogos, ele sempre falará com as pessoas que sinta que estão perdidas.    Te acompanhou durante o largo período que estavas perdido, sem rumo, até se encontrarem outra vez no plano carnal.

Escreveu um livro, contando a saga de dois garotos, que são capturados na Africa, vendidos como escravos na América, que são separados ao chegarem, mas no final de suas vidas acabam se reencontrando, o livro, vai contando a cada capitulo, a vida de um e de outro, caminhos diferentes, mas que no final, viveram.

Uma das descendentes era justamente a mãe do Bob, que quando leu o rascunho, a estrutura da história, lhe contou mil coisas que ele tinha apagado de sua mente, agora, era como se alguma caixa fechada a sete chaves na sua cabeça, se abrissem.

Ou seja eles, eram já de outras vidas.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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