TROCO
Minha avó, Jussara Costa Leite, foi quem me
criou, tinha duas filhas, ela dizia que as duas eram filhas da miséria,
vivíamos ali no morro do Canta Galo, a mais velha tinha um filho, que todo
mundo chamava de Tição, pois era muito negro, me odiava gratuitamente, era uns
oito anos mais velho do que eu.
Minha mãe era a caçula, no meio tinha um
irmão, que entrou para a marinha, aparecia de vez em quando, deixava dinheiro
para a velha, descia conosco para Copacabana, para comprar algo de roupa, meu
primo, queria logo tudo de marca, ele cortava pelo sano, o valor que tens para
gastar é tanto, te vira malandro.
A mim, eu dizia que não se preocupasse,
minha avô tinha algumas clientes, aonde ia limpar, passar roupa, que me davam
as roupas dos filhos que tinham crescido.
O outro, sumia de repente, eu sabia que tinha ido se juntar aos seus
amigos, que faziam tráfico, como sempre dizia meu tio, o Brasil é o único lugar
do mundo, que traficante consume mais do que vende.
Me dizia subindo de novo o morro, com as
compras que fazia para a mãe, está lhe dizia, compre coisas que não estrague,
pois sabes que aqui não tem geladeira, a nossa esta velha.
A mim ia dizendo, que estudasse, que não
fosse como o outro, que não queria nada com a vida.
Eu sei tio, dou um duro danado, para estudar,
ainda conseguir algum emprego, nem que seja para limpar supermercado.
Eu era diferente, mulato claro, olhos
verdes, cabelos amarelo, ou seja um mulato sarará. Com os trabalho que arrumava, ia
desenvolvendo um corpo duro. Sabia que
todo mundo se fixava na minha bunda, pois de tanto fazer esforço, subir morro,
a filha da puta era bonita, isso eu sabia.
Muitos homens passavam a mão. Ficava furioso.
Um dia comentei ao meu tio, o que faço para
me defender, comentei com ele o problema, ele riu muito, eu sei, muita gente se
aproxima de mim por causa disso, mas quando veem a terceira perna, sinalizou
mostrando o seu caralho que marcava o uniforme, esquecem.
Me levou com ele a uma galeria ali em
Copacabana, aonde um amigo dele dava aulas de Karatê, fui espichando, ficando
alto, com um bom corpo.
Meu primo sugeriu que no verão eu deveria
invés de ir trabalhar no supermercado, devia ir para a praia, me vender para os
turistas.
Eu literalmente ficava horrorizado, me
soltava em plena cara, minha mãe e a tua, fizeram isso, não sei aonde foram
parar, se foram embora com algum turista, mas se prostituiam.
Fui falar com minha avô, nesse dia, estava
exausta.
Filho, no fundo é verdade, nunca pude
controlar as duas, pariram os dois, depois desapareceram, nunca mais soube
delas, apenas sei que não estão mortas, pois teu tio andou olhando o
necrotério, foi a polícia, mas nunca as encontrou.
Mas tu sabes que eres meu preferido, bem
como meu filho, nunca nos esquece, quando tem um tempo vem até aqui, todo final
de mês, me traz dinheiro, para ir vivendo.
Mas tenha cuidado com teu primo, com essas ideias, isso significa que
ele anda fazendo merdas.
Um dia fui entregar uma compras já quase na
Avenida Atlântica, o encontrei com três gringos, me disse na cara, isso não te
dará futuro algum, vem conosco, vou fazer uma suruba com esses gringos.
O mandei a merda, apertei a campainha, o
porteiro abriu a porta, foi logo dizendo, conheces esse rapaz, está sempre
metido com os gringos, vai se dar mal, não se meta com eles.
Subi pela entrada de serviço como sempre,
levei as compras para cima, a senhora sempre me dava uma boa gorjeta, reclamava
sempre, a idade já não a permitia trazer as coisas para casa.
Comentei com meu tio, o que tinha
acontecido, ele me disse, que já sabia, aliás o morro inteiro sabia, pois ele
além de se prostituir, vendia drogas para os gringos.
Nesse verão, mal ia a casa da minha avó,
quando ia, era para buscar alguma roupa limpa e passada, mas se tinha dinheiro,
nem perguntava se ela precisava.
Dona Jussara, sempre soltava, igual a mãe,
ganhava dinheiro com os gringos, nem para perguntar se o filho precisava de
alguma coisa, se ia bem, vinha mais era buscar dinheiro.
Eu era o único que sabia aonde ela escondia
alguns quaraminguas, para seu enterro dizia.
No dia que passou mal, ela usava um velho
celular, que uma cliente tinha lhe dado, chamei a ambulância, mas claro essa
não subia o morro, chamei meu tio, que me disse que estava a caminho, alguma
coisa me dizia que hoje ia acontecer algo.
Entre os dois a descemos, fomos para o
Souza Aguiar, mas claro era tarde.
Ela ia a igreja presbiteriana, o pessoal se
juntou, para ajudar no enterro. Meu tio
dizia, nisso pobre é solidário. Eu dei
para ele o dinheiro que ela tinha escondido.
A enterramos, meu primo, não houve jeito de
o encontrar.
Meu tio, me perguntou se queria morar com
ele, mas antes me fez sentar, falou sério olhando na minha cara, eu vivo em
Niterói, pois como trabalho na ilha de Mocangue, fica mais perto.
Mas tem que saber que eu vivo com um homem,
já falei com ele, aliás estava no enterro, era um mulato como ele, forte. Tua avó nunca me criticou, mas sabia disso,
uma vez lhe disse que ia te levar para viver comigo, mas eras pequeno, me disse
que não.
Passamos o dia separando coisas da minha
avó, os documentos, os meus ele encontrou, viu que tinha o nome de meu pai, Gerard
White, um papel com o endereço do mesmo.
Nessa noite descemos até a praia, no dia
seguinte tinha que ir à escola, conseguir os documentos, para pedir a
transferência para Niterói.
Demos de cara com meu primo, com dois
gringos, ia com eles para um apartamento, ali perto, meu tio disse que ia
deixar suas coisas separadas, pois eu ia viver com ele, que nossa avó tinha
morrido.
A resposta foi impressionante, já vai
tarde, ela sempre preferiu a esse franguinho, devia era estar dando o cu para
os gringos ganhando dinheiro.
Meu tio o ameaçou, mas ele se escapou com
os homens.
No dia seguinte fomos para Niterói, saia de
Copacabana para viver no Fonseca, no verão fazia um calor desgraçado.
Me colocou numa escola, para terminar o
ginásio, pois o duro seria ir à universidade.
Me disse que tinha estudado, ali mesmo na
marinha, entrei por causa disso, para poder estudar, estava se preparando, para
subir de categoria, de cabo a sargento, ou coisa parecida.
Ele era bem relacionado, foi comigo, com um
conhecido dele, ao consulado americano, pediu informação como podia encontrar essa
pessoa do papel.
Tomaram todos os dados, ficaram de avisar.
Minha vida entrou numa rotina, ia a escola,
depois ia trabalhar num supermercado perto de casa, ajudava a limpar o pequeno
apartamento, tinha que dormir na sala, mas não me incomodava, pelo menos tinha
um banheiro decente. Não gostava muito
era do seu companheiro, que estava sempre me observando, as vezes por um
espelho que tinha na sala, via que me olhava, passava a mão pelo caralho.
Meu tio um dia viu, saiu uma briga com os
dois impressionante. Que me respeitasse,
que deixasse de ser galinha, que sabia que nas suas escapadas, andava atrás de
gringos.
Sei que o dito cujo arrumou suas coisas, se
mandou, fiquei chateado, falei com meu tio, se fosse o caso, eu voltava para a
favela.
Nem pensar, afinal a vida dos dois, estava
ficando monótona, eu na verdade até dou graças a deus me livrar dele, vivia
aqui como um rei, nunca ajudava em nada, nem dinheiro para comprar comida o
filho da puta dava, achava que como a casa era minha, se encostava.
Um belo dia, recebemos uma carta, vinha do
tal endereço, dizia que meu pai, tinha morrido, mas que eu era a cara dele, que
viria ao Brasil para me conhecer.
Meses depois apareceu, eu tinha terminado a
escola, agora trabalhava o dia inteiro no supermercado, fazendo de tudo,
inclusive de caixa, segundo o chefe era pau para toda obra.
Muitas vezes levava cantada dos clientes,
mas fazia que não entendia, uma mulher me disse uma vez, que eu era bonito
demais para estar ali.
Agora entre os dois, no final de semana,
limpávamos o apartamento, fazíamos comidas para vários dias, assim, podia
trabalhar direto.
Estava tentando juntar dinheiro, para fazer
alguma faculdade de noite, embora não soubesse o que.
O irmão de meu pai apareceu, Joseph White,
avisou meu tio, ia se hospedar em Copacabana, fomos nos encontrar com ele. Na verdade erámos parecidos, só que ele tinha
os cabelos amarelos, já quase brancos.
Contou que seu irmão tinha andando pelo
mundo inteiro, mas quando veio ao Rio, tinha ficado meses, contou que tinha uma
namorada, mas não que tinha um filho.
Meu tio comentou com ele, que nunca o
tínhamos visto, apenas encontramos seu nome na certidão de nascimento, bem como
esse papel com o endereço.
Ele contou que era professor da
universidade de NYC, que sua mãe ainda era viva, mas não tinha mais idade para
viajar.
Nosso nariz era igual, reto, parecia
cortado a faca, já meu tio tinha nariz de negro, era mulato, mas o nariz sempre
o delataria.
Vi que ele estava interessado no Joseph,
que o este também estava.
No dia seguinte, uma segunda-feira ele
tirou folga, fomos fazer um teste de ADN, por via das dúvidas.
Meu tio o convidou para ficar lá em casa,
disse que era modesta, mas que Copacabana era mais complicado. Quando vi, os dois estavam transando um dia
quando, cheguei em casa.
O teste de ADN, confirmou, eu era seu
sobrinho. Ele falou com a mãe, que ia
me levar.
Convenceu meu tio, de vir junto, a desculpa
era assim saberás aonde se ele decide ficar, aonde viverá.
Meu tio tirou uma férias, junto com uma
licença de três meses.
Lá fomos os dois para NYC, saímos do Rio,
fazia 40º graus, chegamos a NYC, nevava.
Num primeiro instante foi fantástico, mas
era duro aguentar o frio, pois no Rio nunca fazia nada assim.
Conhecer minha avó, foi fantástico, pois me
abraçou e beijou muito, soltou logo, pelo meu filho louco que foi pelo mundo,
me conseguiu um neto lindo.
Me mostrou o álbum de fotografia que tinha
dele, no final de semana apareceram todos os tios e primos, eram muitos.
Ela na verdade vivia com o Joseph, que era
quem cuidava dela, me deram um quarto no sótão, que adorei, olhava pela janela,
via a neve cair.
Mas nos dias seguintes, a batalha foi dura,
para entrar na universidade, eu resolvi fazer administração, pois assim teria
vários frentes abertos.
Aprendi com ela uma coisa, se levantava
muito cedo, a senhora que cuidava da casa, já vinha com o jornal que ela
gostava, se sentava na mesa da cozinha, abria na parte que falava da bolsa de
valores, foi me ensinando como fazer, em seguida estava falando com seu
corretor, comprando e vendendo ações.
Trabalhei minha vida inteira nisso, era secretária, mas aprendi muito
com esses homens todos, nunca me valorizaram, mas eu sabia mais do que eles,
pois escutava tudo, foi assim que consegui educar todos meus filhos, teu pai,
foi o único que não quis ir à universidade, queria ver o mundo, isso desde
garoto, estava sempre com os mapas estudando.
Um belo dia desapareceu, entrou para trabalhar num navio, ia mandando
postais de aonde estava. Creio que o
lugar que mais tempo ficou, foi justamente no Rio de Janeiro, mas nunca falou
nada de um filho, nisso era um bom sem vergonha, deve ter filhos espalhados
pelo mundo, menos mal que nos procuraste.
Eles viviam no Brooklyn, para ir a
universidade, eu tive que fazer durantes os meses de férias um curso de
matemática, pois lá era mais puxado que no Brasil.
Um dia voltando para casa, a linha do metro
estava com problemas, peguei um ônibus, ao passar por determinado lugar, cheio
de hotéis, vi um cartaz que precisavam de funcionários que falassem várias
línguas.
Saltei na parada seguinte, fui até lá. Preenchi uma ficha, o que lhes interessou era
que eu falava português, pois tinham uma clientela imensa de brasileiros.
Uma semana depois pedi dinheiro emprestado
a minha avô comprei dois ternos, da cor que me disseram, com o primeiro salário
devolvi. Ela ria muito, não queria
aceitar, lhe disse, então faz uma coisa, começa a usar esse pouco dinheiro para
investir em meu nome.
Quando começaram as aulas, eu saia logo
cedo de casa, passava numa banca de jornal, comprava esse jornal que ela usava,
ia olhando as notícias, as cotações.
Juntei uns quantos salários, o que me sobrava do dinheiro, comecei eu
mesmo a investir, ela me apresentou seu corretor, ele era especializado em
atender pequenos clientes.
Dizia que eu tinha faro, que sabia
escolher, saíste a tua avó, ela nunca perde dinheiro.
Meu tio, queria voltar para o Brasil, não
conseguia emprego, a não ser em obras, seu tempo de licença acabavam, descobriu
que o Joseph era muito controlador, pois no fundo ele era um mulato bonito, os
amigos dele, todos eram da universidade, ele ficava fora dos assuntos.
Sentou-se comigo, conversamos muito, tinha
que pagar uma variação do dólar relativo ao bilhete que tinha comprado, eu lhe
emprestei, pelo muito que tinha feito comigo.
Me abraçou muito, vamos escrevendo, eu sou
da época que se escreviam cartas.
O Joseph não gostou muito, sua mãe entendeu
melhor que ele, ainda soltou que ele não tinha feito nada, para que meu tio se
interessasse em ficar, além dele odiar o inverno, era carioca, do morro do
Cantagalo, que se podia esperar.
Na primeira carta, contou que meu primo
tinha se instalado no barraco que era da minha avó, que vivia que enganar os
turista, vender drogas para o traficante, essas coisas.
Perguntou aonde eu estava, meu tio disse
que tinha ido estudar fora, com uma bolsa de estudos.
Soltou para ele, esse garoto, com a cara
que tem, além do corpo, ia fazer sucesso com os gringos.
No verão eu deixava o uniforme no hotel, ia
para casa de bermudas e camiseta. Um dia
fui parado por um fotografo, perguntou se podia tirar uma foto minha, queria
ver como ficava, me deu seu cartão, perguntou aonde eu trabalhava.
Dois dias depois apareceu. Esperou que acabasse o expediente, me
convidou para um café, disse que ele trabalhava para muitas revistas, era
especializado de ir pelas ruas, fazendo fotos de pessoas que se vestiam
diferentes, mas que eu tinha uma cara especial, queria me levar para uma
agência. Marcamos para a segunda-feira,
queria falar com minha avó, pois ela sabia das coisas.
Me soltou, não fale com teus tios, eles são
chapados a moda antiga, mesmo Joseph que é gay, é muito formal, você já viu,
exigia que eu o chamasse de senhor, nas aulas dele.
Vá, faça o tal book, mas se negue a pagar
qualquer coisa, se te querem já saberemos.
Lá fui eu, nem sabia que esse homem que me
tinha encontrado era famoso, me levou com ele a tal agência, falou com um
fotografo, esse quando me viu, riu, disse que me faltava um pouco de cor, por
ser brasileiro. Lhe expliquei que meu
pai era americano. Eles achavam incrível,
era que meu cabelos eram grossos, tinha inclusive que usar um pente especial.
Me preparam, mas o que tinha me encontrado,
não permitiu que me maquilasse, ele tem uma pele rara, de uma beleza
fantástica, mostrou a foto que tinha me feito.
Fiz tudo que me mandaram, achava
fácil. Logo esse homem que chamarei de John,
me levou com ele a Vogue, com o book, acho melhor trabalhares por fora, já que
estudas administração, o que deves aprender, é saber ler um contrato, as entre
linhas.
Posei para uma reportagem que faziam, com
um costureiro americano, ele adorou como ficaram as fotos, logo queria fazer um
contrato de exclusividade. John disse
que não o fizesse, pegou o contrato, me levou ao seu advogado.
Quando saiu a revista, no hotel todo mundo
sabia que era eu, mas fiquei na minha, segui trabalhando, indo à universidade,
levei uma revista para minha avó.
Ela ria muito, dizendo que eu mal tinha
chegado, já me dava bem na vida. Quando
meus tios, criticaram, principalmente o Joseph, ela disse que ele fosse a
merda, esse menino chegou aqui a dois anos, já se vira bem, podia ter ficado
encostado em ti, para pagares sua universidade, mas não arrumou um emprego,
investe com o mesmo corretor que eu, este diz que tem faro para os negócios.
Eu seguia todos os meses fazendo isso. Não precisava de muitas roupas, pois tinha
era muitas camisas brancas, que se lavava e passava no próprio hotel, vários
ternos iguais, assim tinha um uniforme.
John sempre me buscava para algum trabalho,
ele conhecia todo mundo, dois meses depois me disse que precisava de mim para
uma reportagem que ia fazer ele.
Me apresentou o contrato, me disse
baixinho, não assine, pois querem te prender, diga que queres um contrato, por coleção,
bem como por propaganda dos perfumes, pois só com esse contrato, ficas preso a
tudo isso, me apresentou a um advogado que era esperto nesse contratos, de uma
certa maneira virou meu agente, bem como meu amigo.
John gozava dizendo que ele estava era
apaixonado por mim.
Eu nem pensava nessas coisas, tinha era que
me arranjar, no meio de universidade, hotel, ainda tirar dias livres para
posar.
Tirei umas férias, pois as fotos seriam
feitas em vários lugares, quando quiseram incluir um vídeo de propaganda do
perfume que fazia parte da coleção, chamei rapidamente meu advogado, Cesar, que
era descendente de italianos.
Ele veio, disse que teriam que me pagar a
parte, nem se tinham dado conta que o contrato não era o mesmo que tinham me
dado ao início.
Foi um bom dinheiro, pois ganhei mais, não
tanto como um manequim famoso, mas valia a pena, pois aprendi a me comportar
para fazer um vídeo.
John claro, avisado pelo Cesar, veio para
acompanhar as filmagens, me deu várias dicas.
Queriam depois que viram o vídeo que eu
fizesse um com as roupas que tinha posado, assim era mais fácil, mandar para
todos os clientes que tinham pelo mundo.
Em seguida, fiz uma seção, para várias
revistas, era a mesma coisa, mas mandavam fotógrafos diferentes.
No hotel reclamavam, pois agora eu me
ausentava mais.
O que o John achava demais, era que eu
investia todo o dinheiro que ganhava, nada de comprar roupas novas, sapatos,
relógios de ouro, nada disso.
Um dia lhe expliquei de aonde tinha saído,
tinha que pensar no meu futuro.
Acabei a Universidade bem, cheio de
contratos.
Ele me levou para minha primeira feira da
moda de Paris, depois fomos a Milão, eu ficava impressionado, pois ele conhecia
todo mundo, entrava nos lugares, ia falando desde o porteiro, com os
costureiros. Isso eu aprendi com ele,
se eres educado, não se comportando como uma estrela, todos te ajudam.
Fui para ficar um tempo, logo tinha um
pequeno apartamento em Paris, nunca deixei de escrever ao meu tio, bem como
mandar as revistas que saia, fazia o mesmo com minha avó.
Ganhava dinheiro, transferia o máximo para
NYC, para investir.
O Cesar, bem como meu corretor, disseram
que eu tinha que investir em alguma coisa para abaixar o pagamento de impostos.
Disse que ia pensar. No momento comecei a entender que estava
pagando impostos na França, bem como nos Estados Unidos.
Fui de férias de Natal, me sentei com minha
avó, a consultei a respeito.
Ela me deu um beijo, eres o único, meus
filhos vão pela vida, creio que esperam minha herança, pois educam mal seus
filhos, volta e meia vem me pedir dinheiro emprestado, mas nenhum faz como
fizeste, me devolve.
Creio que deverias separar, o dinheiro que
ganhas lá, investe por lá, pergunte ao corretor se ele não conhece alguém por
lá.
Quando falarem isso, compre um pequeno
apartamento, como o que vives, assim vais investindo.
Foi o que fiz, logo fiz um vídeo para o
lançamento de um perfume em Paris, como sempre falava com o John, esse igual
minha avó dizia, já lancei muita gente, que hoje faz de conta que não me
conhece quando me vê em algum evento, tu ao contrário, me chamas todas as
semanas.
Me tinha dito para fazer um curso de arte dramático,
pois eu me saia bem nos vídeos.
Me indicou uma velha conhecida dele, me
disse ela foi famosa, mas agora com a idade só a chama para fazer pontas em
algum filme.
Não foi como tu, que investe teu dinheiro,
agora precisa aceitar esses trabalhos, pois necessita de dinheiro para viver.
Fui falar com ela, combinamos quanto eu lhe
devia pagar, queria me cobrar menos, mas eu disse que não. O argumento dela, era que John sempre a
ajudava, descobri tempos depois que tinham tido um romance.
Fui me preparando, quando fui fazer esse
vídeo, o fiz a consciência, mais do que pedia o diretor. Esse estava juntando dinheiro sim para fazer
um filme, me perguntou se eu não queria fazer o Casting. Lá fui eu, fiz tudo o que ele tinha me
pedido, li o texto a consciência, discuti o mesmo com Marie, minha professora,
o fizemos de várias maneira. Mas faça
como achas que tenha que fazer.
Mas ao chegar para o casting, o diretor
disse que queria uma coisa completamente diferente, eu fiz, sabia o texto,
enquanto o outro tinha que ler, sua voz era como se estivesse em off.
Quando acabamos, perguntei ao diretor, se
podia fazer de novo, mas da maneira como eu imaginava o personagem, estudei
bastante o mesmo, pode ser que não goste, mas quem sabe me saio melhor.
Ele aceitou a contra gosto, falei com o
câmera, como queria, que ele apagasse metade das luzes, como devia fazer meu
close, iam fazer a voz em off, disse que não, eu faria os dois textos, como se
fosse falando comigo mesmo.
Quando acabei, o diretor, veio falar
comigo, o papel é teu, vejo que entendeste perfeitamente o personagem.
Me deu um contrato, mas não assinei, nunca
faço isso, primeiro meu advogado e agente vai ler, depois falamos, ele vira no
meu lugar, para tratar do cache, do tempo etc.
Ficou me olhando, mas eu disse isso, sem
nenhum pedantismo.
Depois de tudo resolvido, começamos a
filmagem, eu logo criei caso com a produção, pois arrumavam hotéis caros, soltei
que não queria, precisava de um lugar tranquilo, limpo, aonde eu pudesse
ensaiar, decorar o texto, esse hotéis sempre estão centro da cidade, são caros.
O diretor do filme, se matou de rir comigo.
Alugaram um pequeno apartamento, eu achava
interessante, pois como não tinha tempo de ir a um ginásio, fazia uma coisa,
falando o texto, subia e descia as escadarias, falando o mesmo.
Isso fez com que os vizinhos rissem,
algumas senhoras, se sentavam na porta para me ver fazer isso.
As vezes as consultava, sobre alguma
palavra, como elas achava que eu deveria dizer a frase.
No lançamento o filme, numa entrevista na
televisão, um reporte me perguntou sobre isso.
Soltei, que tinham me ajudado muito, pois
eram pessoas que tinham vivido a vida inteira no bairro, sabiam como as pessoas
falavam. Veja eu sou um brasileiro, que
nasceu numa favela, emigrou para NYC, trabalhei em um hotel, estudei, até que
me descobriram. Falei o nome do John, um
grande amigo. Por isso cheguei até
aqui.
Logo me chamaram para fazer outro filme,
esse mais complicado a história se passava em Marseille, era sobre a máfia de
lá, teria que escurecer meu cabelo, ou usar uma peruca.
Preferi escurecer os cabelos, pois odiava
no set o calor que fazia a peruca.
Meu tio tirou uma férias, veio conhecer
Paris, ficou lá em casa, riu muito, imaginei que vivias como um dessas estrelas
de cinema, numa puta casa.
Durante essa filmagem, ele se fez de meu
segurança, pois havia conflitos com os da máfia.
Foi bom, porque ganhou um dinheiro.
Claro os boatos era que tínhamos alguma
coisa, eu o apresentei aos jornalistas, como meu tio, era do Brasil, tinha sido
marinheiro, ajudou minha avó a me criar.
Ele acabou ficando, vendi o apartamento
pequeno, comprei outro, um pouco maior, para que ele tivesse um quarto para
ele.
Arrumou logo direito a trabalhar, sempre
estava nas filmagens, sabia se virar em tudo.
Tempos depois as produtoras, logo o
chamavam para algum filme.
Um dia me surpreendi de encontra-lo num set
de filmagem, conversando com um dos atores mais famosos, o homem o devorava com
o olhar.
Ele claro percebeu, falou comigo, isso é
como o Joseph, ele é rico, eu sou pobre, os amigos deles, são super afetados,
passarei por cafetão, ria muito dizendo isso, mas experimentei, esse homem
todo, é uma senhora na cama, disso estou fora.
Anos depois foi viver com um diretor de
cinema, começou como seu ajudante, os dois eram tal qual para qual, pois eram
muito sérios.
Esse mesmo apareceu com um texto, que a
história se passava no Brasil, se eu queria fazer, o único detalhe era que
estava branco demais.
Alugamos um apartamento, ia a praia, bem
como fazia seções para ter um pouco mais de cor, além claro da maquilagem.
Um dia estávamos num restaurante,
encontramos com meu primo, não me reconheceu é claro, soltou na cara do meu
tio, pois ele estava com seu namorado, o diretor francês.
Finalmente resolveste explorar os gringos,
mas se via que os anos tinham ido mal com ele, efeitos de drogas, parecia mais
velho que meu tio.
Disse que agora agenciava uma série de
garotos para os gringos.
Meu tio soltou que ele era uma madame, mas
não disse mais nada, pediu dinheiro emprestado, mas ele se negou.
Virou-se para mim, perguntou se eu estava a
fim de um programa com algum garoto.
Lhe respondi em francês, que não entendia,
que estava ali a trabalho.
Ficou desconcertado, mas tens tempo para
fuder ou não?
Fiquei louco de vontade de rir, mas me
contive.
Tinha tido uma série de aventuras, mas
nunca nada sério, aliás quando a coisa ia para esse lado eu pulava fora.
Sabia que a maioria era pela fama, os
famosos cinco minutos, que a pessoa sai ao teu lado numa foto, que depois vende
para uma revista, falando do romance que teve contigo.
Aliás as pessoas quando iam para meu
apartamento se decepcionavam, pois era o mais normal possível, tinha sim,
coisas que levava do set de filmagem, algum detalhe que tinha gostado.
Meu tio vivia sim, num belo apartamento na
Ilê de Saint Louis, que tinha pertencido a família de seu namorado.
Foi assim que um dia andando com ele por
ali, nunca iriamos perder a mania de andar juntos conversando sobre alguma
coisa do filme que estivesse fazendo, ou ele me ajudando com o texto. Eu agora investia o dinheiro que ele
ganhava, para fazer um pé de meia para sua aposentadoria, nunca se sabe, o
diretor o adorava, mas claro ele não acreditava em romances eternos.
Me dizia sempre, um dia o interesse na cama
vai morrendo, então é o momento de dar no pé.
Vi um apartamento do outro lado do rio, Saint
Paul, era interessante, uma ruela que ia dar na Igreja de Saint Paul et Saint
Louis, um primeiro andar, mas grande, mandei reformar, me mudei para lá. O outro aluguei, se meu tio depois precisasse
tinha aonde ficar.
Meu primo não sabia quem eu era, pois a
muito usava o nome de meu pai para trabalhar Gerard White.
Mal acabamos de filmar no Rio, agora o
resto seria em studio em Paris, quando minha avó morreu em NYC, tomamos um
avião fomos até lá, o namorado de meu tio, foi para Paris, iria editando o que
tínhamos feito.
Foi interessante o reencontro de meu tio
com o Joseph, nenhum tinha esquecido o outro, mas tinham seguido caminhos
diferentes.
O enterro foi como ela queria. O mais interessante, era que ninguém sabia, ela
aplicava dinheiro em nome dos netos, essa era sua herança, todos tinham o mesmo
valor, a casa sempre tinha sido do Joseph, agora afastado um tempo da
universidade, pois estava escrevendo um livro.
O convidei para vir nos visitar em Paris,
mas aproveitei para passar dois dias, conversando com meu amigo John, ele me
apresentou um diretor de cinema que adorava meu trabalho.
Ficamos conversando, gostei do sujeito, ele
estava começando, fazia filmes off, fora do estabelecido, me deu um texto, se
gosta nos falamos, eu embarcava essa noite para Paris,
Meu tio estava louco para chegar em sua
casa, mas algo passou a não ir bem com seu namorado, talvez o reencontro com o
Joseph, ele não sabia.
Quando acabou o filme, resolveram se
separar, ele foi viver no meu velho apartamento.
Durante a filmagem no Brasil, foram alguns repórteres,
para fazer uma entrevista, andei durante dois dias com eles, por todos os
lugares, subi com eles, ao morro do Cantagalo, para contar de aonde tinha
saído. Alguns achavam que eu estava
inventando isso, mas filmaram.
Quando o filme estava para estrear, fui a
um programa de televisão, passaram justamente essa reportagem. Eu sinalizei para o apresentador, um garoto,
que se parecia comigo, disse claramente, eu era como ele, ia a escola, depois
ia trabalhar num supermercado, hoje já não existia mais, era uma igreja do
reino de deus no lugar.
O filme foi um sucesso, convidei de
proposito o Joseph, para vir, ele podia escrever em qualquer lugar, mas foi
ficar na casa do meu tio.
Agora parecia mais maduro, os dois se
entendiam bem, gostava como meu tio levava a vida.
De ser um marinheiro sem eira nem beira,
agora falava inglês, francês, estava trabalhando na produção de um filme, de um
outro diretor.
Eu tinha me esquecido do texto do rapaz de
NYC, por um acaso o encontrei, num dia que não conseguia dormir, sempre
aproveitava para ler algum texto que me tivessem mandado.
Adorei o mesmo, falava de uma pessoa que
vai à luta para sobreviver.
Me esqueci da diferença de horário,
telefonei, nem lhe dei tempo para falar, disse que gostava do texto, que
gostaria de fazer o filme, com uma condição, não queria o papel principal, mas
sim o de coadjuvante.
Ele perguntou se eu sabia a hora que eram
em NYC.
Acabamos rindo, eu lhe disse que pegaria o
primeiro voo, iria até lá para conversarmos.
Só avisei de manhã meu tio, voltaria logo
para a divulgação do filme, mas era um vap-vup.
No aeroporto avisei ao John, sabia que ele
dormia pouco.
Riu muito, dizendo o rapaz esta sempre
perguntando por ti, mas ele tem problemas de produção.
Eu fui pensando nisso, meu advogado de NYC,
tinha reclamado, pois ao meu dinheiro de lá, tinha juntado o que tinha me
deixado minha avó. Quem sabe não valia a
pena ajudar na produção.
Meu tio, era bom nisso, controlar os gastos
de produção, tinha aprendido nesses anos em Paris.
Ele estava no aeroporto me esperando
nervoso, Jasper Korny, tinha trabalhado em vários filmes, ou como ator, em
produção, em tudo que era possível nesse mundo, tinha inclusive feito filmes em
Hollywood, que me contou depois que odiava.
Tinha reservado um hotel, tipo de luxo,
afinal eu era uma estrela do cinema francês, lhe disse que nem pensar, eu tinha
a chaves da casa do meu tio, ia ficar lá, no Brooklyn.
Fomos até lá tomei um bom banho, voltamos
para nos encontrar com o John.
Foi ele que tocou em como ia a produção, ele
tinha reescrito o texto, justamente por isso, li de cabo a rabo, disse que se
perdiam coisas interessante.
Perguntei, quanto custaria a produção toda.
Me disse um valor alto, isso se fizermos
tudo com material alugado.
Telefonei para meu tio, que já tinha
terminado seu trabalho, disse que precisava dele lá.
Vieram no dia seguinte, nesse meio tempo,
eu já tinha falado com meu advogado, sabia que esse valor era mais ou menos uma
parte da herança da minha avó.
John se interessou, perguntou se ele podia
realizar um sonho dele, fazer a parte de fotografia do filme, fomos juntando
capital, meu tio quando chegou, tomou rédeas da situação, ele sabia como eu
gostava de trabalhar.
Mas voltamos ao texto original, como eu
iria fazer o papel de coadjuvante, John disse que tinha um rapaz, que era
modelo, que poderia fazer o papel principal.
Eu basicamente o treinei, pois teria que
contracenar quase o tempo todo com ele.
Era um tipo super bonito. O texto ia disso, um rapaz, que usa sua
beleza, para subir na vida, que não mede as consequências, que tudo tem seu
preço.
Eu chamei o pessoal da maquilagem, disse
como queria que me colocassem, teriam que me envelhecer mais, rugas, que meu
cabelos loiros, ficassem cheios de cabelos brancos, para aparentar mais idade
do que tinha.
Foi um tour de força, começamos a filmar,
em mil lugares, sempre economizando, Joseph conseguiu vendo meu tio trabalhar,
falar com amigos que nos emprestavam seus apartamentos de luxo, para a parte em
que o rapaz se vendia ao melhor postor.
Eu fazia o tipo que o explorava, que era
com seu gigolo.
O ponto ágil do filme é quando o rapaz se
libera das amaras do gigolo, quer voar por conta própria, mas já se prostituiu
tanto que tudo o liga a isso, uma cenas, em que usamos um belo apartamento em
pleno Central Park, que ele é convidado, pois o dono da casa, já fudeu com ele
muitas vezes, vai pelo seu trabalho, mas todos os tratam como puta.
Ensaiei com o rapaz mil vezes, ele chegou
aonde queria, mas agora teria que pagar o preço, de tudo que tinha feito.
Participei da edição pela primeira vez de
um filme, meu querido Jasper, adorava, pensou que eu estava interessado no
ator, eu disse que nem pensar.
Começamos a sair, jantares, conversas, até
acabarmos na cama.
O filme foi escolhido para estrear no
festival de Sundance, eu dias antes, tive que ir a Paris, para a estreia do
outro, o levei comigo, não queria me separar dele.
Na entrevistas, o apresentava como diretor
do filme diferente que estava fazendo em NYC.
John é claro mexeu com seus conhecimentos,
a publicidade voava.
Voltamos para NYC, fomos entrevistados
primeiro pela Vogue, posei com várias roupas que me pediram, em troca da
publicidade.
Acabou que ganhei um Tony de ator
coadjuvante.
Logo começamos a trabalhar outro texto, na
verdade como produtor, não perdi dinheiro nenhum. Foi quando descobrimos um texto interessante,
estavam interessados em fazer uma série, eu seria um francês meio perdido em
Los Angeles.
Mas resolvemos fazer como filme, pois esse
francês se perde, se transforma em ator pornô, foi ótimo fazer, pois a metade
do atores, resolvemos usar realmente gente que fazia filmes gays.
Claro todos queriam transar comigo, um ator
francês, mas eu cortava pelo sano, amava o homem que estava comigo, pela
primeira vez gostava de alguém.
Como estávamos todo o tempo juntos, não
havia chance de alguém avançar.
Quando me entrevistaram, perguntaram se eu
não tinha medo de fazer esse tipo de filme.
Nenhum foi minha resposta, estou atuando,
essa é minha profissão.
O filme foi famoso, pois era um escândalo
filmarem em set de filmes porno, fomos olhar antes como faziam esses filmes,
riamos muito, tudo funcionava a base da improvisação,
Eu aparecia nu, mas nunca fazendo sexo com
ninguém.
Tinha descoberto um mundo novo, fazer
filmes que fossem interessantes, mesmo que não fossem comerciais, mas que tivessem
um texto sério.
Eu lhe contei que gostava de fazer filmes
na França, pois era uma outra maneira de filmar, quando apareceu um texto
interessante, o escritor tinha pensado em mim, pois ia de um brasileiro que
chega a Paris, com uma mão na frente, outra atrás, mas vai à luta, usa sua
estampa para subir.
Jasper, foi ajudante do diretor, queria
entender como eles pensavam para filmagem. Meu tio estava louco para voltar
para sua casa, seguia não gostando dos Estados Unidos, argumentava que lá
Joseph mudava de personalidade, voltava a ser o mesmo de antes.
As coisas deixavam de funcionar, embora
agora ele tivesse um trabalho que gostava, o da produção.
Logo estava trabalhando desde o princípio
nesse filme conosco.
Jasper riu muito quando viu minha casa,
pois foi imaginando um tipo palacete.
Trabalhou no filme, ao mesmo tempo que
escrevia uma história baseada num livro que tinha encontrado, o autor tinha se
suicidado, ele comprou o direito a fazer o filme.
Mudamos tudo, pois eu não queria fazer o
filme em NYC, a história podia ser em qualquer cidade. Mais uma vez, entrei na
produção, desta vez eu faria o papel principal, o que logo atraiu
investimentos.
Depois do filme pronto, estava cansando,
fomos passar um tempo no sul, uma pequena cidade perto de Carcassone, precisava
me relaxar.
Jasper foi chamado para fazer um filme nos
Estados Unidos, a decisão é tua lhe disse, nunca iria interferir na vida de
ninguém.
Queria que fosse junto, mas necessitava
desse descanso. Ia pelas vilas por
perto, para conhecer a gente, passear, para mim descanso não significava
dormir, ou não fazer nada, mas sim ver coisas, conversar com as pessoas que
viviam por ali.
Numa delas, encontrei um mercado de coisas
usadas, me surpreendeu uma banca com livros, em Occitane, o melhor foi achar no
meio disso tudo, um manuscrito, o que achei interessante era que de um lado
estava escrito em Occitane, do outro em francês, como se a pessoa ao mesmo
tempo escrevesse em duas línguas.
O nome que estava ali, não me dizia nada,
perguntei ao dono da banca, aonde tinha comprado esses livros, ele procurou nos
seus documentos, falou o nome da vila, ao mesmo tempo que se lembrava da casa,
ficava na entrada de uma mansão, nunca vi tanto livro em minha vida, a
proprietária queria se desfazer do mesmo para vender a casa.
Me deu o nome da senhora, bem como o
endereço, por se lhe interessa.
Fui para a casa que tínhamos alugado,
embora passasse a semana inteira sozinho, nos finais de semana vinha meu tio.
Quando vi estava mergulhado no texto, era
super interessante, um homem falando como tinha sido Partisans durante a
guerra. Um romance mal resolvido com o
filho do dono da mansão, além do relacionamento do rapaz com um militar alemão,
de como ele usava o seu amante para obter informação do mesmo.
Antes de acabar a guerra, quando o alemão
está preste a levar seu amado com ele para a Alemanha, decide matar os dois, o
amante porque de uma certa maneira o traiu com o alemão, de outra pois assim
traiu ao seu povo, o alemão é só uma vértice.
O mais interessante, relata toda a manobra
dele, para usar seu amado, para tirar informação do alemão, mas não entende que
depois esse se acabe apaixonando por ele.
O filho do dono da mansão, no fundo é um
rapaz frágil, que se apaixona em criança, pelo filho do administrador, que dá
um duro danado nas terras, para ele, este é um deus.
São duas pessoas antagônicas, um rico,
frágil, bonito, o outro um homem bruto, que volta da guerra como um vencido,
que se une aos Partisans para lutar contra os alemães.
Para isso, se aproveita do outro.
Mas esse é o mesmo que escreve, pois muito
anos depois se dá conta do que fez, escreve para purgar ou colocar para fora
tudo que foi capaz de fazer para se vingar do invasor, ao mesmo tempo ele que
nunca aceitou sua própria homossexualidade, que no fundo lhe horroriza, usou a
mesma em cima do outro rapaz.
Claro em francês está cheia de erros de
ortografia, próprio de quem teve o mínimo de estudos, que depois com os anos,
ele vai roubando livros da biblioteca da mansão que não tem proprietários, já
que o jovem, é herdeiro da mesma, fala de como matou deliberadamente o rapaz,
pois vai na verdade perder o homem que ama, para o inimigo.
Mas reconhece que os corpos nunca foram
encontrados, vive nessa casa de administrador, pois lhe toca cuidar das terras,
sem proprietários.
Resolve ir até a vila, pois o texto não lhe
sai da cabeça, está não só encantado como o mesmo escreveu, pois descreve os
diálogos dos dois conversando desde jovens, os momentos de ternura entre os
dois, conversando, falando de sonhos.
Na vila procura pela senhora, esta o recebe
bem, lhe diz que seu irmão voltou da guerra desequilibrado, mas depois que se
uniu aos Partisans, parecia ter encontrado seu equilíbrio, vivia nessa casa
sozinho, com os livros que roubou da biblioteca da mansão.
Lhe diz que no momento, o governo, como não
existe herdeiros, vende a mansão, bem como essa casa por separado, com um pouco
de terra.
Vai com ele até o local, a casa esta
totalmente vazia, o governo me passou um documento, como minha família viveu desde
meus ancestrais nesse lugar, fomos gerações atrás de gerações cuidando das
terras dessa família. Eu preciso
vende-la, para ir para uma residência de pessoas de idade, afinal estou no
final da vida, também sem filhos.
A mulher não aparentava a idade que tinha,
98 anos, super lucida.
Lhe pergunta se alguma vez leu o que tinha
escrito o irmão?
Ele não permitia, mas eu sabia coisas de
sua vida, que ele amava o filho do patrão, na época era uma coisa impossível,
principalmente num lugar como esse, nunca se casou, ou teve outro romance,
quando o rapaz desapareceu, todo mundo imaginou que tivesse ido com o alemão
para sua terra, mas meu irmão, me contou que tinha matado os dois, só não me
disse aonde tinha escondido os corpos.
Andou pela casa inteira, tinha uma vista
impressionante, ficava no alto, abaixo se via o Rio Aude, que parecia criar uma
ilha, a vila de Preixan, pertencia a Carcassonne.
Lhe deu uma louca, negociou com a senhora a
compra da casa, a mansão não lhe interessava, seu tio se apaixonou pelo lugar
imediatamente. A vila as crianças iam a
escola elementar, para mais estudos os pais tinham que ter dinheiro para os
colocarem num ônibus, para irem estudar em Carcassonne.
Contrata ali mesmo homens que estão
desempregados, limpa toda a casa, mas contrata arquitetos em Carcassone, para
orientarem como ele queria, não ia mudar nada, queria só saber se a estrutura,
bem como o chão, que em dois lugares, é impressionante, tabuas de madeira,
inteiras, como se fosse uma arvore, no que era o quarto, algumas estão soltas, no
que levantam pensando que tem um porão embaixo, encontram o corpo que ele deduz
que é do rapaz da mansão, ou seja na sua cabeça, mesmo no texto ele conversa
com o morto, claro está ali em seu quarto, relata que se masturba pensando no
que viveram.
O alemão não está ali, todo pedaço de terra
correspondente, a vinhas estão abandonadas, contrata homens para cuidar
delas. Lhe dá lastima que todas as
vinhas em volta da mansão estão assim.
Anos depois seria comprada para fazerem um hotel rural.
Ele melhorou a imensa varanda da frente,
para usufruir da vista, na lateral mandou fazer uma piscina para o verão.
A senhora autorizou que ele fosse o
proprietário do texto, aceitou o dinheiro que ele lhe pagou.
Se informou em Carcassone, pois descobriu
uma escola para crianças de Occitane, arrumou um professor, primeiro conversou
muito com ele, a respeito do texto.
Tirou cópia, entre eles sai um romance, o
contrata, para junto revisarem se tudo que está em Occitane, corresponde
exatamente ao que está em francês, ri muito quando descobre pequenos detalhes
que o outro esconde, baixo a língua original.
Com o texto em mão, se prepara, começa a
escrever o roteiro do filme, nesse meio tempo faz alguns outros, nunca imaginou
que fosse tão difícil, aceita filmagens que ele não tenha que passar muito
tempo fora, aonde vai leva seu amigo o professor, pois os dois escrevem juntos
o texto.
Planeja fazer o filme em Occitane, com
legenda em francês.
Com seu tio, junto com Paul Darcy, começam
a montar a produção, as pessoas da vila tem curiosidade, mas ele já foi adotado
por todos, pois ajuda a vila.
Quando começa a falar sobre o texto, agora
sabe o nome dos dois outros personagens, primeiro se informa se existe família,
do rapaz da mansão sabe que não, mas do alemão, descobrem um parente que disse
que ele foi dado como morto na guerra.
Conforme dá entrevista, conta que descobriu
a história numa feira que acontece pelas vilas, comprou o manuscrito, checou se
era veraz.
A senhora, lhe forneceu fotografias do
irmão, bem como uma dele com o rapaz da mesma idade dele, só o alemão descobre
que é muito mais velho que os dois, de família nobre, segundo as pessoas mais
velhas, ele se comporta bem com todos, os que se recordam por trabalharem na
mansão, dizem que era refinado.
Reservou esse papel para ele.
Nesse meio tempo, escreveu três roteiros,
sem querer revisando mil vezes o mesmo.
Primeiro pensei em dirigir o filme, mas
resolvi, conversar com o primeiro diretor com quem tinha trabalhado, ele amou o
texto imediatamente.
Entendeu minha maneira de ver a história,
eu seria seu ajudante ao mesmo tempo que produtor, amava a ideia do filme ser
em Occitane, já que era da região.
Conseguimos em breve mais dinheiro para a produção, muitas pessoas da
vila, participariam do filme.
O problema eram os dois atores, conseguir
atores que falassem Occitane, que fossem completamente diferentes um do outro.
Tivemos que fazer um casting complicado, pois
poucos atores apareceram. Mas depois de
um mês conseguimos os atores, fiz questão de trabalhar com eles, como imaginava
a história.
O filme levou meses sendo filmado, pois
havia que estudar muito sobre os Partisans da região, havia poucos estudos
sobre os mesmos.
Isso juntou ao equipe, um grande grupo de
homens maiores, um deles era garoto na época, se lembrava do homem de quem
falávamos. Um dia sentado comigo, se
abriu, era um tipo impressionante, para ser um homem do campo, era másculo, um
tipo como se veem hoje no cinema, os galãs.
Quando ele chegava era duro com todos, exigia o mesmo sacrifício que ele
fazia, eu era um simples mensageiro, levava e trazia as mensagens que mandava
para o rapaz da mansão. Esse era de uma
beleza, quase feminina, na época diríamos um efebo, hoje diríamos que eram
ambíguo.
Ele me dizia os movimentos que os alemães
iam fazer, pois se moviam por muitos lugares, algumas vezes perto de aonde
estávamos, procuravam uma gruta, que tinha alguma coisa que queria, por velhos
manuscritos.
Esse homem quando viu os atores que iam
fazer o papel, se impressionou, pois eram como eu tinha imaginado, um
extremamente másculo, o outro um efebo.
Segui as cenas que ele descrevia, com o
rapaz, mas tudo muito sutil, o patrão, procurando desesperadamente o filho do
administrador.
Quando esse volta da guerra, como se
comporta, afinal da vazão ao que sentem um pelo outro, mas claro, entra a
necessidade de informação que o outro fornece.
A cena que ele mata os dois, é feita como
disse, primeiro o alemão, ajoelhado com um tiro na nuca, como uma execução, de tanto
ler o texto, intui aonde pode ser, afinal descobrem o lugar, ali está o alemão
com seu uniforme.
O outro ele mata ali, mas depois o
desenterra, o escondendo embaixo da madeira de seu quarto, para assim poder
imaginar que está com ele.
Acabou ganhando um Cesar pela originalidade
do texto, bem como o ator que faz o filho do administrador, o de melhor ator.
Quando o filme passa em NYC, se encontra
com Jasper, que está ofendido, por ele não o ter chamado para dirigir o mesmo.
Já não é o homem por quem ele se apaixonou,
continua vivendo com seu querido professor o resto de seus dias, ali naquela
casa que ele passa a amar como sua.
As vezes diz ao tio, lá no morro na casa da
avó, as vezes de determinada parte, se podia ver a praia de Copacabana, o mar,
aqui vemos as montanhas o rio Aude, é como voltar as nossas origens.
Nunca mais voltou ao Brasil, seguiria sendo
até o final um ator americano, Gerard White, que se apaixonou pelo cinema
francês.
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