LION'S SHORE

 

                                        

 

Era mais conhecido como Shore, quando começou a jogar basquete, o chamavam de Lion’s, mas ele nunca gostou, preferia o sobrenome, era o de seu pai, sua mãe, uma mulher difícil de levar, tinha lutado como uma leoa, para proteger a ele e seu irmão, claro viviam no Harlen, num edifício antigo.

Tinha comprado o apartamento com muita dificuldade, hoje basicamente só viviam velhos no mesmo.

Ele foi a universidade, com bolsa de estudos, claro pelo basquete, era o melhor, depois passou a jogar profissionalmente.

O grande baque para ela tinha sido a morte de seu irmão pequeno, de overdose, nunca tinha gostado de estudar como ele, tampouco levava nada a sério, tinha saído ao seu pai, eram irmãos de distintos pais.

O dele, era um homem branco, por isso era um mulato claro, com os cabelos crespos loiros, olhos azuis, mas tinha saído a ela e sua família, com relação à altura.

Jason Shore, era um músico famoso no mundo do jazz, só se lembrou que era seu filho, quando ele esteve no mais alto do basquete.

Apesar de tudo, tinha se formado também em música, sua mãe era cantora, nos últimos anos, cantava em um coro, bem como o dirigia, da igreja metodista ali perto do edifício.

Ele quando ela chamou, estava no intervalo de uma partida, em San Francisco, avisou seu manager que conseguiu um avião para que ele pudesse voar rapidamente a NYC.

Nesses anos, logo depois da universidade, aceitou jogar basquete, mais pelo dinheiro, ela já não fazia sucesso, nos roteiros de club de Jazz, com o que tinha durante anos os sustentado.

Se culpava por isso, de não estar atenta ao seu irmão, nunca tinha se casado com o pai de nenhum deles.

O seu ainda lhe mandava dinheiro para ele estudar, sua manutenção, as vezes vinha vê-lo, nunca tinha se casado com nenhuma das muitas fans que se tinham durante algum tempo se transformado em sua companheira.

Quando chegou, foi justo para o enterro do irmão, nos dois últimos anos, não se tinham visto muito.

Quando a viu assim arrasada, ficou com ela, a temporada tinha acabado, esse tinha sido seu último jogo, foi de uma certa maneira justo para cuidar dela, tinha o coração muito debilitado, por ter dois trabalhos, de dia, trabalhava em qualquer coisa, de noite cantava nas casas de shows.

Ele nessa época como era o mais velho, cuidava de seu irmão, que já era complicado, pois quando seu pai aparecia, enchia sua cabeça de besteiras.

Ele sempre considerou seu pai um herói, embora tivesse morrido nas mãos da polícia, num tiroteio de bandas.    Nunca tinha entendido sua mãe, por ter-se envolvido com ele, mas nunca disse uma palavra, uma vez escutou um tio seu comentando sobre isso, sua avô lhe respondeu, que ele olhasse seu rabo, pois trocava de mulheres como de camiseta, mas deixava cada uma com um filho.

Por isso nunca tinha criticado sua mãe, sabia do que ela fazia para sustenta-los, o primeiro milhão que ganhou, lhe deu para comprar esse apartamento.

Mas tinha passado os últimos anos indo de um club para outro, tinha ganho dois anéis pelo seu trabalho na NBA, tinha sido os dois últimos anos consecutivos.

Tinha feito uma coisa, convivia com rapazes como ele, que tinham vindo de baixo, mas ele ao contrário da maioria tinha feito universidade, sabia que isso tudo acabaria um dia, ou por alguma lesão, ou por causa da idade.

Portanto cada salário, ou prêmio que ganhava, ia tudo para o banco.  Afinal tinha feito um dos cursos de administração de empresas, bem como ao mesmo tempo de música que adorava.

Estava em sua alma desde criança.   O jazz em sua casa era como a rádio com notícias, se escutava todos os programas de jazz, desde que abria os olhos.

Nesses último dois anos tinha estado longe, vivendo em Boston, vinha sempre que podia, jogava no Celtics, antes já tinha estado mais longe, jogando no Warriors, no Raptors.

Seus companheiros gastavam dinheiro em carros, festas, luxos, tudo o que não tinham tido em criança. 

Ele ao contrário, sua mãe vivia lhe martelando na cabeça, tome meu exemplo, quando pude ser famosa, ir pelo mundo, te tive, sempre tive que aceitar a cantar em qualquer lugar, além de trabalhar no que podia.

Guarde teu dinheiro, assim poderás pensar num futuro.

Ele que tinha desde criança amado a música, fez outro curso, seguiu outra carreira.

Depois de sua morte, estava ali na casa aonde tinha crescido, vivido a vida inteira, por sorte tinha podido comprar a mesma para ela.

Quando voltou teve que colocar para fora, um dos irmãos dela, que pelo fato de ele não estar se mudou para lá, era o que mais lhe criticava.

Lhe colocou diretamente no olho da rua, chamou seu advogado, quando viu que era amigo de seu tio, cortou o contrato que tinha com o mesmo, a partir de agora ele administraria sua vida.

Se dedicou os últimos dois anos, a cuidar dela como mimo, como tinha feito com ele.

Mas vais deixar assim o basquete?

Ele sorria, não podia dizer que tinha perdido esses anos todos, mas seus sonhos tinham ficado estacionados.

Ele só fazia uma coisa, descia todos os dias para fazer exercício no parque em frente, jogar com os garotos dali, ajudava a treina-los, depois subia, se sentava no velho piano, ficava horas e horas recuperando o tempo perdido.

Seu pai o tinha chamado para tocar com seu grupo, dizia diretamente que precisava de uma pessoa nova no grupo.   Tocou duas vezes com eles, mas ao ver como levavam as coisas, caiu fora, nunca tinha admitido esse tempo todo, as putas festas de seus companheiros, as bebidas demais, cocaína, outras drogas, viu muita gente boa ficar pelo caminho, esse não era o seu cometido.

Vinha suado pela rua, dizendo bom dia, a todas as conhecidas de sua mãe.  Agora chegaria em casa, tomaria um banho, tomaria um café bem forte, se sentaria no piano, estava preparando para ele mesmo um show, tinha descoberto com o tempo que sabia cantar, a tinha visto fazer exercícios a vida inteira, por isso fazia agora igual.

O grupo de seu pai, se apegava mais ao pop, o que fosse da moda.

Se um dia seu dinheiro terminasse, poderia dar aulas, se fosse o caso, para isso tinha um diploma da Juilliard.    Três vezes por semana, ia na casa de seu velho professor, para fazer aulas.

Esse quando foi a primeira vez, examinou seus dedos, riu muito dizendo que o basquete não tinha estragado sua mão.

No seu pequeno apartamento em Boston, tinha um piano desses de armário, quando não estava nos treinos, estava ali em cima da mesmo, temia perder a agilidade.

Era a gozação dos seus companheiros, pois eles em seguida iam se meter em alguma besteira.

Piscinas, garotas, coisas assim.

Ele se livrava de todas, pois ao menor descuido estavam falando em casamento, isso não fazia parte de seus planos, embora gostasse de crianças, ainda tinha seus sonhos.

O melhor aconteceu, quando uma vez foram jogar em Paris, ficaram num super hotel, enquanto os outros depois do jogo estavam na farra, ele viu uma sala com um piano, como que atraído por um imã, foi até lá abriu o mesmo, viu que uma das teclas estava desafinada, a arrumou, se sentou, fechou os olhos começou a tocar uma das músicas preferidas de sua mãe, Blue Moon.

Quando terminou escutou um aplauso, era o dono do hotel, lhe perguntou se ele tinha vindo para a audição para a orquestra, em seguida se deu conta de quem era.

Ficaram conversando, tocou para o mesmo todas suas músicas preferidas, o encanto acabou quando dois companheiros que tinham ido ao banheiro, entraram bêbados no lugar.

Vinha pensando nisso, tinham se passado basicamente dois anos da morte de sua mãe, bem como a não renovação do contrato.

Tinha saído nos jornais, ele se negou a dar entrevistas explicando qualquer coisa.  Agora a vida era só sua, iria realizar seu sonho real.

Seguia gostando de jogar, lhe relaxava, mas profissionalmente nunca mais.

Afinal estava com 35 anos, era hora de sair a campo.

Entrou no edifico, achou estranho, a lâmpada da entrada piscava, como se tivesse um curto-circuito, nisso olhou o velho elevador, desses tipo gaiola, viu um pé para fora.

Olhou para ver quem era, não conhecia o sujeito.

Saiu, mas não deixou ninguém mais entrar, esperou a polícia que tinha chamado.

O inspetor o reconheceu rapidamente, Lion’s Shore, levantou as mãos para se chocarem, mas ele odiava isso.

Comentou com o mesmo, entrei, quando vi os pés fora do elevador, os chamei imediatamente, bem como uma ambulância, mas não sei se a pessoa está viva ou não.

O conheces ou conhecia, lhe perguntou?

Na verdade nunca vi esse homem na minha vida, pelo menos não me lembro.

As pessoas que viviam ali, ou eram proprietários, ou inquilinos antigos, só conhecia os mais antigos de todos, os mais recentes não.

O inspetor, mandou imediatamente os homens irem de porta em porta, para saberem se o conheciam, em seguida a ambulância levou o mesmo.

Ele se despediu do homem, subiu para o último andar, lamentado que estava atrasado para praticar, na porta estava um policial batendo.

Aqui só moro eu, foi dizendo abrindo a porta, fui eu que chamei a polícia.

Fechou a porta, tomou um senhor banho, enquanto a cafeteira prepara um café bem forte como ele gostava.

Se sentou ao piano, começou a tocar, de vez em quando parava para repetir algum trecho, ao mesmo tempo tomar um gole de café.

Escutou baterem na porta, foi atender de má vontade, era o tal inspector.

Queria saber quem estava tocando, o jazz é uma das minha debilidades.

Eu já respondi a todas as perguntas que o senhor me fez, tem mais alguma?

Não, mas não sabia que tocava piano?

Eu estudei administração de empresas, bem como música, sou formado pela Juilliard, se não sabe.

Porque deixaste o basquete no mais alto.

Ele respondeu como fazia sempre, porque sofro de vertigem.

O outro começou a rir, pelo menos tinha humor.

Entendo, eu sempre fui seu fã, nunca perdi nenhum jogo.

Se queres jogar contra mim, todos os dias de 7 a 9 da manhã, estou ali na quadra da praça jogando, pode vir, hoje como sempre estava lá, pode perguntar.

O homem relaxou os ombros, ele ficou observando o mesmo, de uma certa maneira era interessante, alto como ele, loiro de olhos azuis.

Estendeu a mão, Jarvi Smith, vou aparecer sem dúvida nenhuma.

Ficou olhando ele andar pelo pequeno corredor, até a escada, pensou tem uma bela bunda.

Voltou ao piano, trabalhou mais de duas horas, iria comer alguma coisa, com o professor, faziam sempre isso, ele vinha da Juilliard, gostava de comer num dos velhos restaurantes judio, que restavam na cidade.

Ele comia qualquer comida, tinha aprendido isso, só não gostava muito de coisas fritas, era gordura depois para eliminar.

Quando voltou para casa, parou na esquina, num velho armazém que tinha de tudo, ele tinha que andar pelo corredor de lado, por ser tão alto e grande.

Comprou coisas para comer, depois ia se dedicar a uma de suas outras paixões, ler.

No dia seguinte tinha uma audição, para substituir um pianista que faltava na orquestra sinfônica, tinha ensaiado a tarde inteira com o professor Joseph Conran’s, mais como um favor a um diretor da orquestra, que tinha sido seu companheiro na Juilliard.

Esse ia ter uma surpresa, pois tinha pedido socorro ao Joseph, este disse que tinha a pessoa indicada.

Sabia que essa noite sonharia como concerto, era um dos seus compositores prediletos, em se tratando de clássico, Prokofiev, piano concerto º 3, C Major, op-26.

No dia seguinte não foi jogar basquete, se dedicou a tocar uma parte que gostava que sabia que o público era exigente.

Depois as 10:30 tomou o metro, foi para o Lincoln Center, o professor lhe esperava ali.

O seu antigo companheiro, se surpreendeu ser ele, o escolhido pelo professor.

Não estás enferrujado?, disse isso rindo.

Não, nunca deixei de tocar.

Entraram na sala, o diretor rindo disse que desta vez iam ter que se apresentar com uniforme de basquete, pois quem iria tocar era um grande pianista e jogador de basquete.

Ele não lhe deu muito tempo, começou a tocar o pedaço que tinha ensaiado pela manhã, odiava as pessoas que falavam demais.

A orquestra sentou-se o acompanhando em seguida.

Depois voltaram a abertura, como se estivesse sempre estado ali, tocariam dentro de uma semana, combinaram o horário de ensaio, o diretor disse que o público iria querer um bis, se ele tinha alguma coisa preparada, disse que sim.

A semana voou, só um dia pode ir jogar antes de sair de casa, um dos rapazes disse que um homem tinha aparecido para jogar, mas não disse seu nome.

Os cartazes, além da publicidade, falavam num tal de L. Shore tocaria com a orquestra.

Sabia que estaria sendo filmado, por isso, falou com o Joseph, de bis tocarei a música preferida da minha mãe.

Tinha mandado lavar seu smoking, que não usava a algum tempo, bem como duas camisas brancas, antes tinha provado, estavam perfeitas.

Quando estava saindo de casa, antes escutou pela rádio que quem tocava hoje era nada mais, nem menos, que o grande jogador de basquete.

Já não gostou tanto, pois sabia que tinha sido o diretor, talvez não tivesse vendido tantas entradas como esperava, pois o pianista que substituía era famoso.

As pessoas ele sabiam, eram volúveis, muita gente ia porque se o concertista fosse famoso, podiam dizer que estava presentes.

Na hora que abriu a porta, deu de cara com o inspector.

Fiquei preocupado, pois fui esses dias jogar basquete como disseste, me diziam que não tinhas aparecido.

Sim estava fazendo outra coisa, lhe perguntou se gostava de música clássica.

Sim, muito.

Bom estou de saída, toco essa noite no Lincoln Center, queres vir.

Sim tenho o carro aí embaixo.

O mesmo foi comentando que o morto, não era morador do edifício, deve ter entrado já que a porta estava aberta, para se esconder, quando levou o tiro, mas como tem uma obra justo atrás, pode ser que ninguém tenha escutado.

Ali ninguém gostava de dar informação a polícia, isso ele sabia.

O fez entrar com ele, pela lateral, lá estava o Joseph, lhe pediu que arrumasse um lugar para o inspector, nos vemos depois.

Se vestiu tranquilamente, sempre tinha sido assim, antes dos jogos, gostava de estar sozinho, enquanto os outros faziam confusão ele se isolava, se concentrava, por isso diziam que ele era efetivo.

Entrou junto com o diretor, a sala estava lotada, lhe disse baixo, a propaganda de hoje de um jogador de basquete funcionou.

Não fui eu, mas sim o diretor da sala.

O aplaudiram em pé, ele se sentou depois de ter cumprimentado os da orquestra, como se fazia sempre, olhou para um pequeno camarote que estava justo pegado ao palco, viu que estava o Jarvi, junto com o Joseph.

Respirou fundo, se desligou, quando o maestro deu entrada na música, ela já estava inteira na sua cabeça, ao sinal dele começou a tocar sem parar.

Quando terminou, o público aplaudia em pé.

Em seguida como sempre, como não paravam, sabia que tinha que fazer um bis.

Tinha ensaiado em particular, com o do violoncelo, o saxofonista, fez um sinal, estes avançaram, pegando de surpresa o maestro.

Arrumou o microfone, como tinha pedido, viu que estava funcionando, antes disse que essa música era a preferida de sua mãe.  Começou a tocar e cantar Blue Moon, de novo o público que não espera que ele soubesse cantar, veio abaixo.

Teve que fazer um outro bis, sabia que o diretor da sala, devia estar espumando.

Começou a tocar uma velha composição do Joseph, disse quem era o compositor, sinalizou o palco, Joseph Conran’s, era um adagio muito bonito.

No final se levantou, a orquestra inteira aplaudia, depois Joseph diria, tinha nascido para o mundo, um grande músico.

O diretor da sala estava furioso, pois tinha atrasado a segunda parte do concerto, se via que uma boa parte do público ia embora, tinha vindo ver a ele, esperando ou um sucesso, ou um fracasso, imaginem um jogador de basquete tocando piano, ainda por cima o filho da puta canta, bem por sinal.

Saiu dali, foi tomar um champagne com os dois, Jarvis brilhava, nunca imaginei essa parte tua.

Ele só molhou os lábios, Joseph, não parava de agradecer, ele ter tocado uma música sua.

Pensei que já nem te lembravas mais desse adagio.

Disse exatamente o dia que o tinha tocado, numa apresentação final de curso da Juilliard.

Logo apareceram jornalistas para entrevistas, respirou fundo, escutou as perguntas mais idiotas, justamente como ele temia, como era isso de ser jogador de basquete, agora ser músico.

Vocês estão mal informados, eu sempre fui músico desde garoto, o basquete foi uma maneira de fazer universidade, bem como dar uma vida melhor a minha mãe.

Não se esqueça que sou filho de uma cantora de jazz, que meu pai é Jason Shore, então a música sempre fez parte da minha vida.

Fez todas as apresentações do contrato, lotava porque os jornais, a televisão tinha falado dele, o mostravam nos seus momentos de gloria do basquete, bem como agora tocando.

Lhe chamaram para vários programas de entrevistas, mas só aceitou participar de um de música, se sentou ao piano, enquanto o apresentador, lhe fazia perguntas.

Tocou algumas que ele gostava, mas tudo jazz.

O que ele ia fazer agora?

Bom espero poder seguir dando concertos tanto de música clássica, como de jazz.

Joseph que estava aposentado da Juilliard, resolveu ficar como seu agente, assim me movo mais.

Ele também tinha seus contatos, isso era excelente.

Jarvis um dia apareceu para dizer que tinham resolvido o crime, ao parecer o homem vivia dois quarteirões mais a frente, devia muito dinheiro a uma gang, sobre drogas, se negava a pagar.

Jarvis lhe perguntou por que seguia vivendo ali, se podia ir viver noutro lugar?

Fui criado aqui, o apartamento é meu, não vejo por que me mudar.

Isso era o que se esperava de alguém que fica famoso, que saia do buraco aonde foi criado, esquecendo o passado, mas sem esse passado não eres ninguém, quem dizia sempre isso era o Joseph.

Ele tinha sido sempre seu aluno preferido, não só porque realmente lhe escutava, obedecia suas instruções, como lhe respeitava.     Os outros bastava um pouco de fama, ou os cinco minutos como ele diziam, nunca mais falavam com ele.

Lion’s ainda tinha tocado o adagio.

Na semana seguinte discutiram muito, havia convites para tocar com as orquestras de quase todo o pais, mas a maioria queria que tocasse a mesma música, ele sabia que isso era um problema que enfrentavam todos os músicos clássicos, ficavam presos a compositores.

Só aceitou a repetir com a Orquestra de San Francisco.

Ao mesmo tempo aceitou um concerto com as músicas que tinha preparado numa sala de jazz de Chicago.

Agora pela manhã Jarvis sempre aparecia para jogar com ele, não era mal, o colocava no grupo contrário, os garotos disputavam quem jogaria ao seu lado, faziam duplas.

Ele era malandro, deixava os garotos ganharem, mas depois parava um bom tempo, lhes ensinando técnica.

Jarvis ficava impressionado, outro não faria isso.

Eu não sou outro, Jarvis, nasci aqui, tive as mesmas oportunidades que esses garotos, só espero que não caiam nas drogas.

Dois garotos o tinham procurado, queriam aprender a tocar piano, os ensinava, comprou para cada um, pianos elétricos, podiam treinar em casa, no caso, sem som.

Os matriculou para o semestre seguinte na Juilliard, depois de fazerem as provas.

Esses ficavam como loucos atrás dele, queriam ao mesmo tempo jogar como ele, bem como serem músicos, sonhavam como todos os jovens serem famosos.

Ele ao contrário como repetia sempre para o Jarvis, só esperava que não caíssem nas drogas.

Foi para Chicago, Jarvis apareceu no final de semana, ele tinha montado com dois rapazes que tinham sido alunos do Joseph, um pequeno grupo, um violoncelo, o outro saxofone.

Cantava suas músicas preferidas, acabou que um produtor publicou a mesmas em Cds.

Como tinha três meses para tocar em San Francisco, fez uma coisa, ajudado pelo Jarvis, foi a um lugar que vendia carros de segunda mão, comprou um furgão, o mais comum possível, negro, com um bom espaço atrás, assim podia ter uma cama ali, tinha colocado um estrado, por baixo levava suas coisas, inclusive um piano eletrônico, bem como duas caixas de som.

Fez a rota 66, Jarvis no último dia apareceu, segundo Joseph, este dizia esse sujeito está apaixonado por ti.

Ficou pasmo quando o outro se declarou, primeiro pediu para não ser esquecido, depois se levantou na ponta dos pés para beija-lo, acabaram na cama, rindo disse ao seu ouvido, realmente tens uma bunda deliciosa.

Quando chegou a Las Vegas, arrumou para tocar numa casa de Jazz, mas tinha realizado um sonho, tocar no deserto, soltar a sua voz, tinha sido uma experiencia fantástica.

Ficou tocando uma semana lá, quando disse aonde ia estar, Jarvis tomou um avião, veio ficar com ele.

Foi explicito com ele, odeio ciúmes, controles, pois no dia que assistiu ao show, ficou com ciúmes, pois as pessoas se aproximavam dele, colocavam as mãos nos seus braços, como dizendo estou aqui, ou lhe ofereciam alguma bebida, que ficava ali em cima do piano.

Em seguida desapareciam, a entregava para o garçom, sempre reclamando que não deixassem fazer isso, marcava o piano, bem como alterava o som.

Ele percebeu que Jarvis ficava com ciúmes.

Isso acontece quando jogas basquete, ou eres músico, as pessoas acham que vais lhes dar a oportunidade dos cinco minutos de fama, para dizerem, olha eu estou com fulano.

Sempre estive fora disso, descartava imediatamente.

Tinha outras preocupações, corria para meu apartamento para treinar no piano, lá me sentia inteiro.

Jarvis entendia, estava literalmente apaixonado, sentia não poder ir com ele a San Francisco, mas tinha que voltar para trabalhar, mostrou o roteiro que pensava fazer depois, no caminho tocaria um dia em Sacramento, depois de San Francisco, desceria para Los Angeles, em seguida iria pela parte de baixo, tocaria em Houston, depois iria para o que ele chamava o berço do jazz, New Orleans.

Caramba, que vontade de ir contigo.

Ias te aborrecer, em San Francisco, viriam os dois músicos que tocavam com ele, assim faria os bis acompanhado pelos dois conhecidos.

Joseph chegou reclamando, das muitas horas de voo, tinha me esquecido que era como atravessar o mundo, dizia exagerando.

Foi tudo bem, depois desceu com ele para Los Angeles, tocaria com a orquestra, no ano seguinte, dois concertos diferentes, assinou o contrato.

Estava ao mesmo tempo realizando um sonho antigo, aprender a tocar o saxofone, Joseph que tocava muitos instrumentos o vinha ensinando.

Quando dominou o mesmo, em Houston, tocou um trabalho antigo de seu pai.

Falava sempre com ele, quando disse que ia para New Orleans, ficou de se encontrar com ele, lá conhecia muita gente.

Nos primeiros dias ficou no hotel que ele estava, mas pensava em ficar muito tempo, Joseph chegou com Jarvis, ele tinha um pequeno contrato, vieram seus músicos, ao parecer o público gostava de ver aquele homem imenso, sentado perfeitamente no piano, nada de ficar curvado, com os olhos fechados, cantando boas músicas.

Deu uma surpresa ao público, cantando coisas do repertorio de Billie Holiday, quando lhe perguntaram a respeito disse que sempre tinha escutado sua mãe cantando músicas feitas para homens, sem problema nenhum, música é música.

O público vinha abaixo, com aquele homem imenso, que abaixava seu tom de voz, para cantar quase ao sussurro esse tipo de música.   Jarvis dizia que era como quando estavam na cama, que cantava no seu ouvido.

Cantava My Man, depois passava, Good Morning Heartache, por ultimo Speak Low.

Tinha arrumado um rapaz para fazer precursão, essa ele cantava no meio do palco, tirava o casaco, estava suado, a camisa pegada ao corpo, ia marcando o ritmo dançando, o público ficava como louco.

Jarvis ficava louco de ciúmes, embora depois dissesse que ele era seu.

Um dia parou o carro, deixa disso, vais provocar que nos separemos.

Resolveu ficar com um contrato largo aonde estava, seu pai trouxe algumas músicas antigas dele, para ele melhorar, se podia transformar em Jazz, até Joseph, trouxe uma música para ele trabalhar.

Conseguiu alugar a parte de cima de uma casa, na parte alta da cidade, daquelas casas famosas.

Sem o Jarvis por perto, trabalhava melhor, se sentia livre, comentou com seu pai, que gostava dessa sensação de liberdade, estar só para fazer o que queria, explicou, quando estava com a equipe, havia que trabalhar em equipe.

Contratou músicos dali mesmo, apareceu um negro, tão magro como ele, alto, queria mostrar como se virava no piano, o escutou, disse se ele estava disposto, o ensinaria a melhorar sua parte técnica, ele tocaria enquanto ele cantava.

Estava farto de cantar com um traje, procurou alguém que lhe desenhasse uma roupa, conheceu uma mulher que tinha trabalhado na Broadway, lhe disse o que queria, ela foi assistir um ensaio, ele estava de calças jeans, cantando no meio do palco.

Dias depois apareceu com uma calças negras, largas, uma camisa imensa negra transparente.

A estreou justo no dia que vinha o programa que ele gostava de NYC, gravaram seu show, foi um escândalo, aquele homem imenso, tão branco, com as sardas brilhando por baixo da camisa, parecia que era lentejoulas.

Pela primeira vez, cantou Blue Mon, como fazia sua mãe, dançando por dentro da casa, com passos miúdos, abaixou o tom de sua voz, ficava rouca, diferente.  Joseph, que vivia ali com ele, dizia vais deixar a moçada como louca.

No final incluiu uma maneira toda sua de cantar Moon River, quase a capela, acompanhado pelo seu aluno de piano, Silver Blaster, o público aplaudia de pé, ele ia até o piano o arrastava ao centro do palco.

Faziam um contraste impressionante, ele tão branco, o outro negro.

O show era transmitido em NYC, foi um sucesso, várias casas de show, chamaram o Joseph, ele disse que estava no momento com um contrato.

Ele em seguida, incluiu “fly me to the Moon”, descobriu que gostava de cantar dessa maneira.

Justo nessa época o dono do local, disse que vendia o mesmo, tinha um câncer, nenhum de sua família gostava disso, ele perguntou quanto queria.

Foi a NYC, com o Joseph, Silver, que não conhecia a cidade, foi ao seu banco, para ver realmente o montante do seu dinheiro, anos e anos economizando. Tinha que valer para alguma coisa.

O banco tinha filial em New Orleans, falaram com o diretor de lá que era cliente aonde ele cantava, concordaram em lhe dar um empréstimo para comprar, uma parte seria do dinheiro que estava no banco, iriam descontando de seus lucros.

Joseph, resolveu alugar sua casa, assim ele podia alugar uma pequena para ele, aonde podia dar aulas.

Silver era aluno seu, o venerava, como um pai, um dia contou que tinha sido criado por uma tia.

Quando deu de cara com Jarvis, um dia que foi a sua casa, mas antes foi jogar basquete com seus garotos, se matava de rir, ele dizia virei as costas esse diabos cresceram.

Fazia tempo que não sabia do Jarvis, apareceu com um companheiro de trabalho, entendeu que ele tinha agora alguém como queria.

Voltaram para New Orleans, soltou, parece que estou voltando para casa, chegaria o momento que teria que tomar uma decisão de vender o apartamento de NYC.  Jarvis contou para ele que estavam valorizando muito, o pessoal que vivia no Village, Soho, está se mudando para cá.

Encomendou mais roupas da senhora.

Seus cabelos agora estavam imensos, cantava com eles soltos, seu pai assistiu o último show, antes de fecharem para reforma, ele queria um palco um pouco maior, seria necessário avançar numa parte do armazém, tinha agora uma pessoa cuidando disso.

O comentário do velho foi, se fecho os olhos, sou capaz de tirar o piru para fora, me masturbar.

Silver, disse que as vezes sentia o mesmo.

Um dia chegaram em casa molhados até a alma, no que foi secar os cabelos do Silver, quando viu estavam na cama, tinha encontrado seu parceiro ideal.

Se exploravam até a exaustão, dormiram a primeira vez agarrado, ele se preocupava afinal era mais velho que ele.

Mas ria muito quando Silver dizia quando agradeciam, podem olhar, mas sou eu quem vai com ele para a cama.

Quando o local ficou pronto, convidou o programa de NYC, que ficaram surpreso, pois ele agora ficava no centro do palco, algumas músicas tocava o saxofone, com muita emoção, explicou que o piano, tinha aprendido com sua mãe, melhorei com o Joseph, dizia que ele agora estava cheio de alunos de jazz, mas o saxofone sempre me encantou.

Cantar foi uma coisa que surgiu espontaneamente.

Agora começa o show, encostado no piano todo de branco, com o saxofone na mão, cantando “what a difference a day makes”, no meio fazia um solo com o instrumento.

Com o tempo, passou a oferecer os dias da semana para outros grupos, selecionados pelo Joseph, só tocava e cantava a partir de quinta-feira, o resto dos dias ensaiava novas músicas, trabalhava a de seu pai, nem sempre era fácil transpor para sua voz.

Assim tinha um repertorio grande.

Recebeu um convite para tocar em Paris, no Olympia, resolveu tomar como uma férias, deixou a cargo do Joseph tudo, foi com seu pequeno grupo, fizeram sucesso, tiveram convite para mais lugares, acabaram ficando um mês.

Joseph, lhe disse que o queria matar, porque lidar com tantos egos, era difícil.

Era interessante, pois em seu grupo ele não notava isso.

Joseph morreu antes, o incrível, tinha dado aulas para tanta gente ali, que o cemitério estava cheio.    O sonho dele era morrer dormindo, em paz consigo mesmo, foi isso que aconteceu, ninguém sabia a idade dele real, quando olhou seus documentos, ficou com a boca aberta, tinha quase 99 anos.

Ele seguiu trabalhando, pois sentia um prazer imenso nisso. As vezes se preocupava com Silver, mas esse dizia que estava como queria, com o homem que amava, além de fazer música como gostava.

Agora dois dias da semana, ele levava o grupo, ele ficava de fora, tinha amadurecido muito.

Volta e meia aparecia alguém para ser orientado. 

Meses depois foi seu pai que morreu, os últimos anos, estava ali, sempre se repetia dizendo que tinha orgulho do filho que jogava basquete, mas esse que era músico, era o máximo.

Agora sua família era seu grupo, Silver, seguiu em frente, algumas vezes se cruzava com algum dos companheiros de basquete, mas seu mundo hoje era outro.

Viveu muito, tinha vendido o apartamento de NYC, para uma empresa, por muito dinheiro, então, viveu até os últimos dias tranquilo, seu herdeiro era o Silver, que seguiu levando a casa de Show, como ele gostava.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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