UNSEEN

 

                

 

Voltava correndo para Los Angeles, menos mal que já tinha feito seu trabalho na última escavação, chegava ao fim da temporada.

Ruiz, como chamava sempre Diego, tinha conseguido lhe contactar, o que nem sempre era fácil, chamou a Embaixada no Cairo, explicou a situação, mandaram uma pessoa falar comigo.

Na hora fiquei parado, meu avô era uma pessoa muito importante na minha vida, afinal tinha me criado, dirigiu minha vida a um porto que ninguém podia imaginar.

Tinha sido um ator respeitado, para não dizer famoso em sua época, sempre manteve dois lados, de um se chamava Robert Vaughn, de outro seu verdadeiro nome Joseph Isaac, filho de um emigrante judeu, vindo da Polonia.

Era um garoto quando chegou a NYC, mas era diferente dos irmãos, todos loiros de olhos azuis, ele tinha saído a mãe, cabelos castanhos escuros, olhos verdes quase marrons, alto demais, segundo ele, na sua juventude foi desengonçado, com as pernas meio arqueadas, talvez por andar tanto a cavalo na fazenda do pai.

Era o mais novo dos filhos homens, depois dele vinham duas mulheres.

Seu pai, com o dinheiro que conseguiu trazer, viu que viver em NYC com uma família numerosa não ia dar certo, sempre tinha vivido no campo, então se embrenhou para o interior dos Estados Unidos, indo parar no Wyoming, comprou umas terras perto de Douglas, com o tempo foi comprando mais.  Tinha uma vantagem, tinha cinco filhos homens para trabalhar, em pouco tempo, nem se lembrava que tinha nascido na Polônia, que inclusive era judeu, por ali não havia sinagoga.

O único que se interessou em estudar, foi justamente meu avô, embora para isso, tivesse que ir a cavalo, até a estrada mais perto aonde passava um velho ônibus escolar.  Deixava o cavalo bem escondido, ia a pelo, nada de arreios, isso depois o ajudaria na sua carreira de ator.

Descobriu uma das suas grandes paixões, livros, segundo ele leu tudo que existia na escassa biblioteca da escola, depois a professora passaria alimentar essa sua paixão, dizia que era o único aluno que gostava de ler.

O irmão mais velho se casou com uma garota de Douglas, seu pai, como faria com os outros a medida que fosse casando, lhe deu um pedaço de terra que tinha acabado de comprar, com direito a casa e tudo.

Ele olhava tudo aquilo, ajudava nos trabalhos, quando voltava faminto da escola, levava um sanduiche que sua mãe lhe dava, mas a fome era sempre grande.

Descia do ônibus, esperava este desaparecer na primeira curva, ia por seu cavalo escondido, saia a galope para casa, claro lhe restava o trabalho que os outros não queriam fazer.

De noite enquanto os outros discutiam por qualquer coisa, ele se refugiava na cozinha, perto do fogo, principalmente no duro inverno, lia o livro que a professora tinha lhe emprestado.

Seu pai falava corretamente, mas não sabia ler, ele ensinou a sua mãe a falar direito, bem como a ler e escrever perfeitamente, era ela então que levava as contas, banco, etc.

Não tinha muitas opções, de proposito, falou com a professora antes, repetiu o último ano da escola, embora fosse um dos melhores alunos, ela fez uma coisa, conseguiu que ele fosse para a capital Cheyenne, estudar na casa de uns parentes dela.

Para isso teve que chamar sua mãe a parte, esse menino tem futuro, creio que o devia deixar ir.

Ele foi, vivia nos fundos da casa, o irmão de sua professora era pastor protestante, ele para garantir, seguiu sua orientação, finja que é, crie um personagem para ele.

Ia aos cultos, cantava, fazia de tudo para ajudar na casa.

Foi o melhor aluno, ganhou uma bolsa de estudos, foi estudar Literatura em Denver, contra a vontade de seu pai, quando foi passar o final de ano em casa, falou principalmente com sua mãe, quero seguir em frente.

Um dia foi com ela ao banco, tirou uma boa quantidade de dinheiro, não diga a nada, volte para Cheyenne, depois vá para Denver.

Foi o que ele fez, o curso não era o melhor, um professor lhe disse que ele deveria ir, ou para NYC, San Francisco ou Los Angeles.

Ele tinha descoberto o cinema, adorava, se meter em um, nos dias livres.

Arrumou foi um emprego, pois assim o dinheiro que sua mãe tinha lhe dado, ficaria seguro num banco.

A bolsa de estudos lhe permitia ter aonde viver, compartia um quarto com dois companheiros, esses eram filhinhos de papai, que estavam ali por um diploma, nada mais.

O melhor que com isso, desapareciam nas farras, ele podia estudar em paz.

No final do primeiro ano, viu que realmente devia era ir embora, conversou com o professor, esse tinha estudado em Los Angeles, a meca do cinema.

Fez o trajeto todo de ônibus, ele se comunicava com a família através de cartas com sua mãe, ela lhe escrevia contando o dia a dia da fazenda, ele como ia levando o curso.

O que tinha gostado era a imensa biblioteca da universidade.

O trajeto era daqueles, que parecem que nunca vai acabar, ele foi olhando a paisagem, menos quando era de noite, que paravam em algum lugar, para trocarem de condutor.

Mesmo assim, ele ia escrevendo tudo que via, era o começo de seus inúmeros diários.

Depois escreveria sobre as filmagens que tinha participado.

Tinha um tipo, se matriculou na universidade, escutou várias vezes o comentário, que ele devia tentar cinema.

Na universidade, se interessou por fazer teatro, tinha uma memoria estupenda, decorava o texto, inclusive dos colegas, quando ensaiavam ele corrigia os mesmo, o professor que dirigia o grupo, se matava de rir.

Pois ele fazia as vozes dos outros personagens, ou como imaginava os mesmos.

Só não gostava de uma coisa, papel principal, dizia sempre, que era os mais tontos, os que menos davam trabalho.

Se destacava no que fazia, gostava de papeis complicados, já estava a dois anos fazendo teatro, tinha que equilibrar seu tempo, pois tinha que trabalhar também, seguia sem tocar no dinheiro que sua mãe tinha lhe dado, caso necessitava, para a matricula, ou algo mais sério, usava, mas depois devolvia para o mesmo.

No teatro começou finalmente a ter uma vida sexual ativa, lhe dava igual, homens ou mulheres, mas escrevia já nos seus diários, que preferia os homens, aparentemente era menos complicados, pois as garotas, logo falavam em casamento, isso ele não queria, se lembrava sempre sem querer de sua mãe, com suas eternas obrigações, era a mão de obra mais barata da fazenda, a que mais trabalhava, depois de um dia de trabalho se sentava com um livro para anotar gastos.

Ele tinha aprendido com ela isso, fazia sua própria contabilidade, anotando o que ganhava, como gastava, os companheiros diziam que ele não aproveitava essa fase de sua juventude, não estava para festas, bebidas, aliás nunca gostaria de álcool, quando faria filmes depois, as cenas que tomava um whisky, tinha que ser algo falso.

Estava representando nos finais de semana uma obra de Shakespeare, tinha aceitado a fazer a contra gosto Macbeth, mas sabia todos os outros papeis.

O professor, levou um agente e um diretor de cinema para assistir, o agente foi falar com eles depois da função, arrastando o diretor de cinema.  Esse quando o viu de perto, ficou impressionado com sua altura, estava só de cuecas no camarim que dividia com outros.

Tinha tomado um banho, sempre seria assim, via os outros atores, quando muito tirarem a maquilagem, dizia que tomar banho, o livrava do personagem, quando souberam que ele fazia isso, analisando a representação, se tinha cometido algum erro, riram dele.

Mas nunca se importou com isso, era uma coisa pessoal sua, como sempre ele dividia isso, o pessoa, do personagem, anotaria depois tudo que tinha pensado no seu diário, que estava sempre numa bolsa.

O diretor quando viu suas pernas meio arqueadas, perguntou se ele sabia montar a cavalo?

Sempre, contou que como fazia para ir à escola.

O agente, lhe deu um cartão, perguntou seu endereço, dois dias depois chegou um roteiro de cinema, para ele ler, bem como falava do casting.

Era um dos famosos filmes de Cowboys que fazia Hollywood, ele gostou do personagem do bandido, analisou o mesmo, como seria esse homem com sede de vingança, que passa para o outro lado, o diretor depois iria rir dele por isso.

Foi fazer o casting, acompanhado do agente, lhe deram para ler justamente o personagem do mocinho, o homem de bem do filme.

Perguntou se não podia fazer o outro papel, o do bandido.

Todo mundo riu, pois não era o papel principal, mas teve a coragem de dizer que era o personagem mas impessoal do roteiro.

Ele tinha imaginado a cena do bandido, chegando ao bar, se enfrentando ao xerife, que era o mocinho do filme, a discussão dos dois, porque não tinha prendido os bandidos que tinham matado sua família.

No filme ele iria matando um a um, com o xerife atrás dele.

Fez a cena como imaginava.

O agente, começou a discutir com o diretor, sobre o contrato, ele interrompeu, disse que só podia fazer depois dos exames da universidade, só poderia depois de uns 20 dias, antes disso nem pensar.

Com isso lhe aumentaram o que iam lhe pagar, para ele terminar antes.

Estudou como um louco, nos intervalos, para se relaxar, lia o roteiro, foi anotando coisas, maneiras de falar.

Foi ver nas noites que tinha livre, vários filmes de cowboys, riu muito depois, analisava isso, depois nos seus diários, que alguns sempre repetiam a fala do outro, além de repetirem posturas.

No primeiro dia de filmagem, apresentou ao diretor, o texto, todo escrito, falas, que ele tinha visto em mais de um filme, isso me parece uma repetição idiota do personagem.

Mostrou uma cena, em que o bandido, fala com outro, isso me parece uma besteira, eu faria essa cena, dele conversando com seu cavalo, como se fosse um monologo.

Se imaginou no cavalo, falando a mesma, usando inclusive o texto do que lhe falaria o outro, para analisar o personagem.

Fizeram assim, ele depois se acostumaria, a isso, nunca sabia que cena ia filmar, mas no que o diretor falava, ela já a tinha na sua cabeça.

Quando o filme ficou pronto, tinham ido rodar o mesmo no deserto, perto de Las Vegas, a menor folga os atores, fugiam para lá, para encherem a cara, jogar, isso não era com ele.

Preferia ficar ali, sentado em alguma duna, imaginou a cena justamente ali, estavam os cavalos num cercado, ele tirou o que usava, o trouxe para perto dele, fez uma fogueira, ficou ali sentado falando com o cavalo, o diretor, assistiu de longe.

Deu razão a ele, fizeram a cena como ele tinha imaginado, pois sem querer dessa maneira contava ao publico como tinha se transformado.

O filme fez um relativo sucesso, pois era dos famosos classe “B”, ele acabava chamando mais atenção que o papel principal, que era feito por um tipo macho alfa, mas que nunca sabia seu texto.

Fez mais dois filmes com esse diretor, ao final disse ao seu agente, que mais nenhum, pois me parece estar repetindo o mesmo papel.

O agente se matava de rir com ele pois tinha um sentido de humor impressionante, comparava as cenas, já fiz isso, imitava o diretor dirigindo, na verdade o mesmo, nunca deixaria de ser um diretor de filmes “B”.

Um dia o agente lhe trouxe um roteiro, mas só uma página, era um filme de detetive, ele riu, conhecia o livro, era de um escritor de novelas negras, mortes, dinheiro, ambição.

Buscou o livro, a cena inclusive que lhe davam, se preparou, sabia que o personagem era alcoólatra, foi a uma série de bares, observar, ficava sentado na barra no final de noite, tomando uma coca cola, observando os que provocavam brigas, os que mal se aguentavam em pé. Os que usavam terno, com as gravatas abaixadas, a camisa meio aberta, os gestos que faziam.

Fez assim a cena, o personagem, voltando para seu esconderijo como dizia o mesmo no livro, ou seja a sala que usava para tudo, era sua casa real.

Fez a cena, começando que ele procurava as chaves, não encontrava, quando encontrava, como elas caiam no chão, aonde ele acabava de joelhos, reclamando, fazia isso, dizendo o texto, o contrataram, mas ele frisou uma coisa, exigiu isso no contrato, ele não beberia nem uma gota de álcool, já tinha visto como acabavam as pessoas, tinham que fazer um chá, que ficasse da mesma cor da bebida.

O filme acabou sendo bem recebido pela crítica, o autor do livro veio falar com ele, estava por cortesia acompanhando a filmagem, entendeste o personagem, isso foi o melhor, pois desvirtuaram o mesmo.

Sim, procuro seguir o que escreveste no livro, me baseei nele para compor o personagem.

Depois esse daria uma entrevista falando sobre isso, quando um ator realmente busca o personagem.

O seu dinheiro ia aumentando, colocava o que ganhava no banco.

Na estreia do mesmo, teria que ir com uma atriz do filme, uma tonta como dizia ele, a típica loira burra.

Mas assim que pode se livrou dela, já tinha visto o filme na montagem, se escapou por uma saída do cinema.

Tinha que estudar, tinha uma prova importante para ele.

Seus colegas de turma, não entendia, ele fazendo cinema, seguia vivendo no mesmo quarto da universidade.

Um dia em classe lhe perguntaram, sua resposta deixou os outros de boca aberta, preciso separar as duas coisas, são duas vidas distintas, o que faz cinema, é um, o outro é um estudante nato, que adora estudar, trabalhar o que faz.

Já usava nessa época o nome de Robert Vaughn, pois o agente disse que um ator chamado Joseph Isaac, não encaixava nos padrões.

Foi quando de uma certa maneira, compartimentou sua vida, nas filmagens, lançamento de filmes, entrevistas, era Robert Vaughn, mas na vida normal, contas de banco, etc., era Joseph Isaac.

Escrevia para a mãe, ela contou que tinha ido a cidade para ver seu filme de cowboy, ri muito pois é como se fosse outra pessoa.

Isso ele diria anos depois para ele, que muitos atores, são eles mesmo falando um texto, ele queria ser outra pessoa.

Acabou a universidade, com mais dois filmes na bagagem.

Foi ao banco analisou sua conta, tinha um bom pecúlio, disse a um dos diretores, como fazia para investir o mesmo, queria comprar um apartamento, nada de luxo.

O diretor lhe indicou uma pessoa, iria descobrir depois que era seu irmão, esse tinha pensado que ele sendo ator queria alguma coisa para impressionar.

Fez uma coisa, o levou aonde vivia, preciso só um pouco mais de espaço, nada do gênero de que tenho que mostrar opulência.

Acabaria com esse homem em sua cama, mais tarde um grande amigo.

Esse então lhe mostrou o que queria, nada de luxo, ele na verdade só queria um extra, uma cama em que seus pés ficassem dentro da mesma, tinha passado desde sua juventude, dormindo com os pés fora da cama.

Agora já fazia filmes melhores, seu agente que seguia sendo o mesmo, o respeitava, quando lhe devolvia um roteiro, dizendo que esse tipo ele não faria, tampouco queria contratos que o prendessem ao studio, tinha aprendido a lição, quando foi obrigado a fazer três filmes seguidos de cowboy.

O autor do livro, do filme de detetive, mostrou um outro roteiro para ele, fiz um curso, para que não me estraguem o texto do livro, nem que o personagem fique descabeçado.

Ele gostou, mas claro faltava um diretor, mostrou o texto para o agente, que disse que ia cuidar disso.

Ele leu o livro primeiro, depois leu o roteiro, convidou o escritor para sua, casa, começou a trabalhar o mesmo com ele, agora sabia o que funcionava num filme e o que não.

Ele só teria que fazer uma coisa, aprender a dirigir, nunca tinha feito isso, no filme que tinha feito, essa cena tinha sido feita por um extra.

Se matriculou numa escola, foi fácil, logo tinha carteira de conduzir, mas pagou a um extra para lhe ensinar, como devia funcionar num filme.

O filme foi acidentado, numa das cenas, ele caiu, quebrando o braço, tudo por culpa de um dos atores, que tinha chegado bêbado na filmagem.

Quando tirou o gesso, fez todas as cenas que devia, de uma tacada só tinha acompanhado as filmagens, as cenas que não participava.

Passou a entender como funcionava a cabeça de um diretor, aproveitar o máximo o cenário, fazer todas as cenas passadas ali.

O filme foi lançado com um certo sucesso, lhe faziam entrevista, ele depois quando lia nos jornais, ria, pois era o Robert Vaughn quem falava, não ele.

Mas quando lhe perguntavam sobre algum outro ator do filme, ou atriz, se negava a responder, dizia simplesmente, faça essa pergunta a essa pessoa.

Tinha uma coisa, não fazia sexo, com os companheiros de filmagens, ignorava as insinuações, ou tudo que levava a isso.

Tomava um certo cuidado, nas relações sexuais, principalmente com as mulheres, não queria deixar nenhuma gravida.

Num dos filmes, conheceu minha avó, uma das famosas loiras burras, mas ela ao contrário sabia o que queria, era canastrona nos filmes, mas sonhava em viver num mundo, cheio de dinheiro.

Conseguiu fazer sexo com ele, logo estava gravida, mas ele se negou a casar-se com ela, gostava de ir por livre, aliás ela quando viu sua casa, pensou aonde fui me meter, pois imaginava que ele já tendo certa fama, viveria numa mansão.

Quando nasceu meu pai, aceitou a registrar o mesmo, foi então que ela descobriu que ele era outra pessoa, Joseph Isaac.

Passaria a pagar todos os meses uma ajuda ao garoto.

Ela logo arrumou um trouxa rico, se casaria mais cinco vezes, até mesmo velha, toda repuxada por operações estéticas, pensava em ficar cada vez mais ricas, nunca mais teve nenhum filho.

Quando seu segundo marido disse que não gostava de criança, mandou o filho para um internato.

Disse ao meu avô que não precisava mais dele, para nada.

Ele ainda de vez em quando ia ao internato, lhe dava pena, mas como só tinha reconhecido o filho, os advogados disseram que ele nunca teria o filho sobre sua guarda.

Cada vez que ia fazer um filme, o avisava aonde estava, se precisas de alguma coisa, chame o meu agente.

Ao contrário dele, meu pai, amava a música, tinha sido sua escapatória.

Com 16 anos escapou da escola que estava, a mãe nessas alturas vivia em Miami, numa bela mansão, nunca ia vê-lo.

Foi para a casa de seu pai, disse que estudar não era o seu, queria estudar música, meu avô o colocou numa escola de música, mas antes lhe falou do álcool, das drogas.

Nunca mais procurou sua mãe, se tornou um músico de Jazz, anos mais tardes se mudou para New Orleans, aonde ele dizia que se sentia um peixe n’água.

Meu avô seguiu seu trabalho, agora lhe apareciam papeis na Broadway, ele aceitava, só avisava não gostava de temporadas muito grandes.

Comprou um pequeno apartamento perto da zona dos teatros, que com os anos iria se valorizando cada vez mais.

Ele quando voltou a Los Angeles, para fazer um filme de cowboy, que diria depois, que era o melhor final que ele tinha feito, não era o papel principal, mas ganhou um prêmio com ele.

Era um personagem que é perseguido o filme inteiro, por ter matado uns quantos que tinham acabado com sua família, já não era o típico, filme de cowboy mocinho, bandido, mas sim alguma coisa mais consistente.

Eu acabaria vendo o final do filme mil vezes, pois a cena final ele adorava, já tinha matado todos que o perseguiam, estava à beira de um deserto, o local era interessante, era à beira de um riacho, do outro lado estava o deserto.  O personagem não tinha percebido que na última perseguição o cavalo estava ferido, chega um momento que o mesmo cai, para morrer, ele sabe que não pode voltar a trás, que sua vida, nunca mais será a mesma, sacrifica o cavalo, leva com ele o cantil, uma espingarda, nada mais, sai andando, atravessa o riacho, vai caminhando para o deserto, a cena final, é ele se arrastando pelo mesmo, a caminho da morte.

Junto quando voltou a Los Angeles, um dia andando na rua, se encontrou com um velho conhecido, Diego Ruiz, um extra, o que lhe ensinou os truques do carro.

Estava na rua pedindo dinheiro.

Se sentou com ele, para saber o que acontecia, esse disse que os filmes de agora, não precisavam de gente como ele, tenho os ossos do corpo inteiro partidos.

Meu avô, tinha acabado de comprar uma boa casa, não era uma mansão, mas uma boa casa nas colinas, tinha um panorama impressionante, ele gostou disso.  Levou Diego até lá, disse que precisava de um motorista, seguia não gostando de conduzir, essa foi a desculpa, pois nem carro tinha.

A casa tinha em cima da garagem um apartamento.

Diego se transformou em sua sombra, nessa época seu agente morreu, ele assumiu essa parte, meu avô lhe ensinou como trabalhar, como ler um contrato.

Meses depois meu pai apareceu, comigo nos braços, estava mal de saúde, tinha tuberculose, bebia demais, se drogava, tudo que o velho lhe tinha falado para não fazer.

Diego logo arrumou uma parente dele para me amamentar, meu pai nunca mais saiu de lá, só para o cemitério, tinha uma tristeza impressionante, Diego me contaria anos mais tarde, que tinha procurado sua mãe, mas essa estava na Europa, não quis atende-lo, soltou na sua cara, se não o tinha criado, agora um neto, o que iam pensar dela, que era velha.

Meu avô, sequer a avisou da morte do filho, para que, pensou.

Anos depois se encontrou com ela, em Paris, nem a reconheceu, ela sim a ele, pois seguia com a mesma figura, estava com umas amigas, o viu comigo, tinha uns 17 anos, perguntou quem eu era, ele soltou na cara dela, na frente das amigas, que era o neto que ela sequer quis conhecer.

Ficou branca, como ele diria depois as gargalhadas, fugindo como se tivesse visto um fantasma.

O motivo de estar em Paris, era que tínhamos ido dar uma olhada nos cursos de arqueologia, que eu queria fazer, fomos a Sorbonne.

Mas voltamos para NYC, agora ele fazia mais teatro, dizia que pelo menos ficava mais tempo no mesmo lugar, vivíamos no seu velho apartamento.  As estas alturas, ele e Diego viviam juntos, antes tinham tido como uma espécie de atração um pelo outro, depois tinham uma coisa, que ninguém poderia tirar, uma amizade profunda.

Diego é quem resolvia tudo para mim, quando era pequeno me levava a escola, se meu avô estava fazendo algum filme fora, ficava com ele, nos finais de semana, ia as filmagens.

Meu amor pela arqueologia nasceu, quando ele foi fazer um filme no Mexico, fazia um explorador, quando vi as pirâmides, objetos, lhe disse imediatamente que queria ser arqueólogo.

Metade do dinheiro das minhas mesadas, era para comprar livros sobre o Egito, as pirâmides do Mexico, enfim o que se falasse em arqueologia.

Ia aos museus com o Diego, ficava apaixonado pelo que via.

Em Paris, foi a mesma coisa, queria estar nos museus.

Ele se matava de rir, pois dizia que não sabia a quem eu tinha saído, não tinha conhecido minha mãe, pois ela tinha morrido antes que meu pai, segundo ele no parto.

Tinha me dado o nome de Josh Isaac, eu era da outra parte da vida de meu avô.

Ele me ensinou a não gastar dinheiro em besteiras, minha primeira viagem ao Egito, foi com os dois, nessa época, eu estava terminando a universidade, vieram comigo, ia participar com um professor de uma escavação, fizemos a famosa viagem de cruzeiro pelo Nilo.

Num dia ao entardecer, ele se sentou comigo, falando muito sério, nunca tinha falado nada do meu pai, tampouco o criticava.

Me pediu pelo amor de deus, que não usasse minha vida em vão, nada de bebidas, drogas, não sabemos nada a respeito de tua mãe, mas consultei um médico, se foste gestado ela estando drogada, podes te enganchar rapidamente, se me amas, como eu a ti, não faças nunca isso, qualquer problema me chames.

Eu estava sentado entre ele e Diego, esse que era como meu segundo pai, disse que qualquer coisa, ele iria até ali.

Foi minha primeira experiencia, quando voltei, estava como um louco, foi quando ele me mostrou seus diários, eram todos iguais, os comprava numa loja, todos tinha capa de couro, só eram numerados,

Ele os escrevia com uma letra fantástica, pequenas para durar mais tempo, mas fáceis de ler, me disse que eu devia fazer igual, anotar tudo o que via nesses lugares, nunca se sabe.

Me mostrou uma passagem que era na época um filme mais importante que tinha feito, ele anotava cada dia depois da filmagem, o que podia ter sido melhor, os erros, criticava o diretor, algum ator que estava ali para nada, pois não fazer direito para ele era isso.

Quando fui para Paris, fazer uma pós-graduação na Sorbonne, ele veio junto, insistia que eu devia aprender sempre a língua do pais aonde ia trabalhar, se fosse Egito, que falasse árabe, para entender as pessoas que faziam o trabalho pesado.

Eu agora todos os anos, durante a temporada, ia a alguma escavação, anotava tudo como ele dizia, inclusive se discordava do lugar que estávamos buscando.

Ia me lembrando disso tudo no avião, cheguei a Los Angeles, exausto, o fiel Diego, lá estava me esperando, a estas alturas, já tinha quase 90 anos, meu avô tinha feito 98 a meses antes.

Sua morte passou desapercebida de tudo, ele se tinha se afastado a anos de fazer filmes, dizia que fazer papel de velho não era com ele.     Tinha vendido sua casa, comprando uma em Malibu, gostava de ver o mar, da anterior, ele via de longe, dizia que estava ficando cego, preferia ver de perto.

Viviam os dois ali, segundo Diego eram os avôs da praia.

Segundo ele, tinha morrido dormindo, queria o enterro mais simples, possível, que fosse enterrado ao lado de meu pai, nada mais.

O filho da puta, comprou um ao lado, para quando eu morra, mas aguentei esse velho muito tempo, para querer ficar ao lado dele, me contou isso, com lagrimas nos olhos.

Eram poucas pessoas no enterro, alguém tinha publicado num jornal, mas só se dariam conta meses depois, fariam uma retrospectiva nos canais de televisão, andaram atrás do Diego para contar coisas da vida dele.

Mandou todo mundo tomar no cu, me deixem em paz.

Me deixou bem de dinheiro, nunca mais tinha voltado a fazenda de sua família, a única coisa a que tinha retornado, por um acaso conheceu um rabino jovem que vinha fazer surf ali em frente a sua casa, voltou a velha religião, esse rezou um Kadish para ele.

No ano seguinte eu iria para Israel, participar de uma escavação, misturada com franceses, hebreu.

A casa ficou para o Diego, que fez uma coisa no ato, seu testamento, que ficava para mim, o apartamento de NYC, ele já tinha passado para meu nome.

Depois do enterro, um dia Diego, me contou que minha avó tinha aparecido, tinha vivido como tinha sonhado, estava velha, sem dinheiro, nunca tinha economizado na vida, já nem joias tinha para pagar uma residência.   Ele pagou para ela, nunca perguntou do filho.

Mas ela tinha morrido antes dele, tinha deixado com um advogado como queria seu enterro, esse quando viu meu avô, este lhe soltou na cara, sempre viveu de sonhos, quanto muito posso pagar para que a enterrem aonde vivia, nem junto ao seu filho quero.

Meses depois morreu o Diego, me senti, realmente órfão, mas conviver esses últimos tempos com ele, tinham sido impressionante, falava da vida dos dois, de meu pai, tinha alguns cds, com música dele.

Se tinha uma coisa, meu avô odiava viver do passado, sempre era o futuro que lhe interessava.

Me preparei durante um tempo, antes de ir para Israel, estudando Hebreu, o tinha feito na Sorbonne, mas o rabino amigo do velho, me ensinou tudo ao respeito da religião.

Tudo em arqueologia em Israel, tem a ver com a religião, assim ficou mais fácil.

Eu fui para ficar uma temporada, acabei ficando anos.   Mantive só o apartamento de NYC, para quando precisava ir.

Fui para ficar um tempo, nunca mais sai de lá, agora, trabalho com um grupo da universidade de Tel Aviv, aonde dou aulas, encontrei meu lugar.

Mas nunca poderei esquecer de meu avô, nem do Diego.

A pouco tempo estava em casa, vi um filme na televisão, me matei de rir, pois era meu avô no famoso filme de detetive, quando disse ao meu companheiro, que era meu avô, ficou me olhando como se eu estivesse contando uma mentira.

Mas se o nome dele é outro?

Lhe mostrei os diários dele, procurei o que falava desse filme, aí acreditou em mim.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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