MENEZES DE BRITO
Sou conhecido assim Menezes de Brito, que
na verdade são meus sobrenomes, mas na verdade me chamo Jorge Menezes de Brito
Neto, pois meus dois avôs se chamavam Jorge.
Sou músico, talvez tenha realizado o sonho
do meu pai, mas ao contrário, enquanto ele sonhava ter uma samba enredo, ou que
um samba seu fosse cantado por todo mundo.
Não colou, nunca conseguiu, mas ao mesmo
ele era um funcionário público, daqueles que entraram por concurso na
Petrobrás, depois ficou no mesmo cargo até se aposentar, nunca fez nada, nenhum
mínimo esforço para subir dentro da hierarquia.
Já minha mãe, era uma dessas garotas de
Ipanema, filha de gente rica, que vivia num puto apartamento ali em frente à
praia.
Meu avô Jorge Alcantara Menezes, tinha
herdado do pai, fabricas lá para os lados de Olaria e Madureira, eu sempre fui
seu querido, com ele aprendi a amar outro tipo de música que não fosse o samba.
Não que meu pai, fosse mulato, ou negro,
era sim moreno, com os cabelos pretos, cacheados, com o famoso bigode de
malandro, seus pais viviam ali na Tijuca, meu outro avô Jorge também era
funcionário público, da Caixa Econômica Federal, o mandaram para Brasília, mas
odiou, achou aquilo uma merda como dizia.
Voltou para o Rio de Janeiro, comprou esse
apartamento na Tijuca, na planta, o último andar, com varanda, churrasqueira,
mas nunca soube porque nunca tive muita ligação com eles, foi minha avô quem
arrastou o filho para a Escola de Samba, ela era do Salgueiro, doente, saia
todos os anos na escola, menos nos anos que viveu em Brasília, meu pai era
garoto, não se lembrava dessa época, sua primeira lembrança me contou um dia,
era que em sua casa, se escutava samba o dia inteiro, que minha avô limpava a
mesma, sambando com a vassoura, inclusive imitava as porta bandeira, com a
mesma, que meu avô se matava de rir.
Ele ia a escola de Samba, mas ficava o mais
longe possível da bateria, de preferencias no bar da entrada, tomando uma
cerveja com os conhecidos.
Minha avô materna era fina para caralho,
como dizia meu avô Jorge, os dois eram descendentes de judeus.
Ele de portugueses que vieram para o Rio,
com uma mão na frente, outra atrás, para cobrir as vergonhas dizia ele, mas
ficaram ricos, depois seu pai, criou as fabricas, ele sonhava outra coisa, mas
não lhe restou remédio, teve desde jovem, ir trabalhar com o pai.
Tinha três filhos, os dois mais velhos,
eram homens, minha mãe a caçula, os dois depois de estudarem no Rio, nos
melhores, colégios, foram fazer universidade de Administração de empresas nos
Estados Unidos, ela, minha avô quando viu que só queria praia, surfistas, a
mandou estudar na Suiça, com as filhas de uma amiga, num colégio interno.
Só saiu de lá para voltar, para fazer
universidade na Puc, Ciências Sociais, mas como dizia doutor Menezes, para que,
se rico fosse entender de pobre, era na verdade para ver se conhecia um filho
de rico, segundo minha avô.
Um verão, vieram umas amigas francesas
dela, passar as férias no Rio, queriam conhecer as escolas de samba, ir a praia
ali no Arpoador, surfistas, festas, eram de família judias, daquelas ricas mas
fechadas, queriam aproveitar a vida, antes que os pais lhes arrumassem um
casamento rico.
Minha mãe falou com seu Otavio, o faz tudo
do meu avô, motorista, braço direito, conforme o caso esquerdo também, ele no
fundo foi meu terceiro avô.
Bom disse que o melhor eram as meninas irem
ao Salgueiro, pois lá tinham muitas famílias.
Meu pai estava tentando com uns amigos,
emplacar um samba enredo, tinha sido selecionado, entre os cinco finalistas,
estava eufórico.
Lhe tocou a ele cantar, foi quando desde o
palco viu aquele bando de garotas brancas, que tentavam sambar.
Um do seu grupo disse que eram francesas,
tinha escutado as mesmas falando entre si.
Se aproximou, para tentar emplacar alguma,
quando começou a falar com elas no seu francês macarrônico, riram dele, a única
que não, foi minha mãe, lhe disse num bom português, são frescas, filhinhas de
papai, além de tontas.
Ah você é brasileira?
Estudei com elas na Suiça, como castigo por
querer me enturmar com a turma do surf, mas acabo de voltar.
Gostas de samba?
Sim, mas não sei sambar, assim começou a
conversa deles.
Acabaram se enrolando, mas claro estava
fadado a não dar certo desde o começo, ele mostrou para as amigas dela o Rio de
Janeiro, sem a presença do seu Otavio, é claro.
Saíram pela noite, casas noturnas de samba,
desde as do centro da cidade, depois subúrbio, Madureira e adjacências.
Quando viram estavam juntos, ele vivia na
Gloria, tinha estudado, era engenheiro, mas funcionário público, exigência de
seu pai, que achava que assim estava em segurança para o resto de sua vida. Segundo ele, nenhum funcionário público
pedia demissão.
Evidentemente ela reclamava de ter que ir a
PUC, desde a Gloria, sua mãe que tinha fortuna própria lhe deu um carro, com
uma condição, era uma mulher moderna, podes viver com ele, mas casar não.
Ela seguia tendo as mesmas amigas de
sempre, que estavam ali, para arrumar um marido, ela ao contrário tinha um
namorado.
Um dia estava com umas amigas num bar de
Ipanema, saiu correndo tinha vontade de vomitar, mas não se deu por aludida,
escondeu de todo mundo, as vezes dormia na casa dele, só nos finais de semana,
quando ia com ele a quadra do Salgueiro.
Ele adorava exibi-la, afinal tinha fisgado uma garota rica, mas sambar
isso não era com ela.
Um dia estava lá, estava horrorizada, tinha
ido ao banheiro, nem tinha notado que tinha barriga, uma mulata, lhe perguntou
de quantos meses estava, olhou para a outra com cara de terror, foi quando se
deu conta, correu a um médico para fazer um aborto, mas nada, estava já de
cinco meses, não se podia fazer.
Falou com sua mãe, que a levou uma clínica
especial, mas nada.
O único ao parecer que ficou contente, foi
meu avô, segundo seu Otavio, entrou no carro um dia, disse, meu amigo te
prepare, vou ser avô.
Minha mãe, voltou para o bem bom da casa
dos pais, minha avó, fez tudo para esconder que a filha estava gravida, mas
quando finalmente conheceram meu pai, viram que dali não saia nada.
O jeito minha filha, é que pareça que os
pais, somos nós.
Meu avô, disse que tudo bem, desde que
levasse o seu nome, não sabia que o outro também se chamava Jorge.
Quem nos levou para o hospital, foi seu
Otavio, meu avô avisou meu pai, que estava na quadra, defendendo mais um samba,
que não ganhou.
Ele não entendia, que lhe faltava alguma
coisa, que não tinha o requisito real para ser um bom sambista, era branco
demais.
Eu nasci, nada mais entrar no hospital.
Depois foi uma briga impressionante, os
dois Jorge se conheceram, inclusive o outro era vizinho do senhor que era
gerente de uma das fabricas.
Riram muito, concordaram que o garoto se
chamasse Jorge Menezes da minha mãe e Brito do meu pai.
Mas ela ficou morando na casa dos pais,
estava farta da experiencia de viver na Gloria, pois não sabia cozinhar, nem
lavar um prato, dirá fritar um ovo.
Minhas duas avós, tampouco se bicaram, uma
era dona de casa a tempo completo, a única coisa de movia sua vida, era samba e
carnaval.
Já a outra era uma dondoca completa, tinha
fortuna própria, adorava jogar bridge com as amigas ricas, a dinheiro.
Claro Ipanema já não era o real lugar para
os ricos, agora volta e meia tinha que se chamar a polícia, pois as putas e os
travestis eram donos das calçadas.
Como o apartamento ela tinha herdado dos
seus pais, o colocou a venda, escolheu uma puta cobertura na Barra da Tijuca,
num edifício que viviam todas suas amigas.
Lá fomos nós, meu avô até gostava, pois era
mais fácil ir para as fabricas.
Meus tios retornaram dos Estados Unidos,
cheios de ideias para as fabricas, meu avô fez uma coisa, levou com ele o
gerente que era seu amigo, deu para os dois administrarem a fábrica que na
verdade era herança da mãe deles.
Ele nunca tinha tocado nos lucros de lá,
depositava inteiro para ela. Mas antes
tiveram que assinar um contrato com ela, tinham que prestar contas como meu avô
fazia, essas coisas todas.
Não gostaram muito, por incrível que
pareça, ela ficou preocupada com seu patrimônio, passou a ir as reuniões, para
saber, o que esses garotos estavam fazendo.
Um dia se sentou com meu avô, disse que não
confiava nessas coisas modernas que os dois queriam incluir na fábrica, ao
mesmo tempo os dois começaram a discutir, pois cada um queria fazer prevalecer
sua vontade.
Acabou que um saiu, foi trabalhar numa fábrica
moderna em São Paulo, de um companheiro de universidade, só ficou um.
Mesmo assim, acabou que meu avô teve que
ceder um dos gerentes da sua, para a outra, assim ela sabia como andavam as
coisas.
Ficou com o outro, lhe disse bem, para ti
podia ser importante, mas isso não vai dar certo, para que sejas o culpado no
final, prefiro que fiques aqui, aonde nos entendemos.
Nessa época ele começava a pensar em se
aposentar.
Minha mãe depois que eu nasci, vivia
mergulhada em depressão, primeiro pós parto, depois porque tinha estudado uma
carreira, que no Brasil, era para cuidar de pobres, ela odiava a pobreza.
O jeito, foi Idalina, trazer uma sobrinha
para cuidar de mim, a escutava dizendo ao Otavio, isso não vai acabar bem.
Um dia minha mãe resolveu ir com uma amiga
a um Guru, lá em Sepetiba, o mesmo vivia era mesmo na Chapada Diamantina,
segundo seu Osorio, o mesmo misturava tudo, candomblé, com espiritismo,
psicologia, ou seja era um engana tontos.
Lá foi ela, com mais duas amigas como ela,
para a Chapada Diamantina, claro me levou junto, com minha baba.
Quem vai para um lugar esotérico, levando
uma baba?
A mesma meses depois arrumou um jeito,
telefonou para o seu Osorio, contou o que acontecia, que eu estava cheio de
mordidas de pulgas, que tinha piolhos, que minha mãe, vivia tomando alguma
droga que o sujeito dava para dominar as mulheres que estavam ali. Afinal era um tipo bonitão.
Seu Osorio, disse ao meu avô, de uma
maneira muito sutil, vinha com ele da fábrica, parou o carro no meio do Alto da
Boa vista, pediu aos seus Orixás, forças para contar direito ao seu patrão
tudo.
Doutor Menezes, tenho que lhe falar uma
coisa.
Meu avô pensou que ia pedir as contas, nem
pensar, ele adorava, confiava no seu Otavio.
Nada disso não senhor, tenho que lhe contar
o que a baba do seu neto me disse, quando o velho escutou tudo, vamos para
casa.
Chegou bufando, perguntou a minha avó, se
sabia aonde era.
Foi para o aeroporto, alugou um jatinho, se
mandou com seu Otavio para lá, esse depois me contaria, que tinha medo até de
peidar, se cagar nas calças de medo.
Alugaram um carro, seguindo indicações do
pessoal, chegaram aonde estávamos, ficou uma fera, a filha disse que ficava, lá
era feliz.
Ele foi a vila mais próxima, lá tinha um
juiz, desses mequetrefes, lhe soltou dinheiro, me deu a guarda para meu
avô. Como meu pai nunca aparecia, agora
eu era dele.
Voltou furioso, com a baba, comigo, fomos
os dois imediatamente ao médico, mandou examinar a garota também, os dois
tínhamos piolho, picaduras de mil coisas.
Ela disse a higiene desse pessoal, é pior
que a dos que moram nas favelas.
Minha avó, passou olimpicamente do
problema, não era com ela, desde que eu não ficasse correndo pelo salão, quando
ela estivesse com as amigas, sem problemas, eu sempre tive babas para meus
filhos, só os tive por que querias herdeiros, olha a merda que fizemos, uma
agora esotérica, um em São Paulo, outro aqui, que se tem que controlar, pois
vive fazendo merdas, era melhor não ter nenhum.
Nisso o gerente da fabrica que era amigo do
meu avô, concordava, seu Ernesto, era um solteirão para ninguém botar defeito,
tinha suas namoradas, mas quando elas falavam em casar, ter filhos, ele caia
fora. Nasci numa família imensa, éramos
9 para comer e vestir, ir à escola.
Ele tinha um sonho, ter um sitio, começou a
olhar lá prós lados de Araras, Vassouras, Itaipava.
Arrastou meu avô com ele, numa das subidas,
foram olhar alguns perto de Itaipava.
Ele não gostou de nenhum, mas meu avô sim,
um que tinha uma subida, a estrada estava uma merda, ele voltou no outro final
de semana com seu Otavio para olhar, me levou junto.
O carro sofreu para chegar lá em cima da
estrada, tinha marcado com um homem da imobiliária, que estava cuidando da
venda.
Este contou que o antigo proprietário,
tinha morrido, os filhos quando ficou doente o vieram buscar, o enfiaram numa
casa de pessoas de idade, o coitado morreu em seguida, dizem que de tristeza.
Meu avô se matou de rir, comigo, dizia que
eu estava correndo como um louco, que ria muito, na volta, disse, meus amigos
mudaram para cá.
Mas ele pensou que era uma coisa de
criança.
Meteu a mão nas suas economias, ele sempre
tirava dos lucros, duas partes, uma para que eu estudasse o que quisesse, bem
como outra para ele.
Com esse dinheiro, como bom judeu, negociou
com os herdeiros, pagou menos do que queriam, porque era dinheiro limpo, não
tinham que ficar esperando que o comprador pedisse um empréstimo bancário nada
disso.
A casa não era grande, tinha um salão,
ligado a uma cozinha, que no lado de fora, tinha uma churrasqueira, uma piscina
precisando de reforma, dois quartos de um lado, com banheiro, do outro tinha
como um puxado, com banheiro também, ali virou a pousada do seu Otavio.
Segundo meu avô foi a melhor coisa que fez
na sua vida.
Minha avó, odiava campo, ele antes de
arrumar a estrada a levou até lá, foi reclamando o tempo todo, depois dizia que
tinha muitos bichos voadores, aquela piscina tinha água suja.
Ou seja nunca mais voltou.
Meu avô fazia uma coisa, me colocou numa
escola em Botafogo, aonde ela não quis que os filhos estudassem, era uma escola
para judeus.
Faziam um caminho complicado para a
fábrica, me deixavam lá, eu ficava o dia inteiro.
Nos finais de semana subíamos os três para
Itaipava, para o sitio Menezes.
As vezes meu outro avô Jorge ia também,
adorava.
Foi ele quem chamou a atenção do meu avô,
pois eu ficava sempre brincando ali perto aonde começava um pedaço da Mata
Atlântica, eu parecia de longe estar falando.
Seu Otavio que era malandro velho, sabia,
tinha consultado um amigo que era pai de santo, riu muito quando esse disse o
que era, deixa o menino em paz.
Finalmente teve que explicar, ele esta
brincando com seus amigos imaginários.
Nada eu estava brincando com os dois que
tinha conhecido aonde estava com minha mãe, que agora estavam lá, tinha um
adulto, vestido com uma tanga, que eu pensava que era o pai deles.
Os meninos vestiam igual ao adulto, que
ficava sentado nos olhando brincar.
Um dia, seu Otavio, com uma desculpa
qualquer, eu nesse dia não tinha aula, estava aborrecido no escritório do
velho.
Ele disse que tinha que resolver umas
coisas, me levou na casa do pai de Santo, lá pros lado da subida da Rio/São
Paulo.
Eu desci do carro correndo como sempre
fazia, tinha uma árvore imensa, meus amigos já estavam lá, como o homem também.
Virei para o seu Otavio, meus amigos vivem
aqui também nessa árvore.
O Pai de santo, dava um beijo no rosto do
seu amigo Otavio.
Meu filho, ele é de Oxóssi, os meninos
podemos chamar de vários nomes, Curumim, Cosme e Damião, Erê, Ibeji, são os
grandes amigos e protetores dele.
Mas seu pai de cabeça é esse Oxóssi,
imenso, como vai ser esse garoto no futuro.
Chamou rapidamente uma Yao, lhe disse para
preparar um banho para os dois.
Falou comigo quem eram meus amigos, eu
perguntei, porque só eu podia vê-los, me explicou o que era um Orixá, ou
espirito.
Ele me deu umas quartinhas, quando íamos
para Itaipava, a primeira coisa que eu fazia era levar água para elas.
Meu avô pensava que eu ia molhar alguma
planta, ficava por isso mesmo.
Um dia, achei no corredor, um violão, achei
interessante era do antigo dono, pois todas as coisas da casa tinham ficado.
Me sentei na varanda, nunca perguntei como,
mas sabia que o mesmo estava desafinado, fui escutando, arrumando as cordas,
meu avô estava deitado na rede do outro lado da varanda, me observando,
imaginava o que esse menino estava fazendo, mas ficou de boca aberta quando
comecei a tocar.
Ele tinha o hábito de pedir ao seu Otavio,
para colocar musica clássica no rádio, principalmente levava na época era o que
havia uma fitas K7 de Villa Lobos, eu adorava, tinha verdadeiro horror de ir ao
samba, uma vez quando era pequeno, escutei a bateria, queria ir embora em
seguida, não era a minha.
Eu comecei a tocar a que ele mais gostava
de ouvir, não sabia o nome da mesma, mas era que sempre escutava quando
subíamos.
Ficou pasmo, fez um sinal chamando seu
Otavio, que estava preparando comida para os três, lá em cima ele era o rei da
cozinha.
Ficou na porta com uma colher de madeira
nas mãos, depois diria esse garoto é uma caixa de surpresa.
Semanas depois, minha avó disse que queria
falar com ele, pensou que era alguma loucura que ela queria.
Disse que a fábrica não ia bem, que o filho
estava enterrando a mesma, herança do meu pai, daqui a pouco não vou ter
dinheiro, um já perdemos, pois meu tio que tinha ido para São Paulo, nunca dava
notícias, minha mãe, seguiam aonde estava com seu guru, as vezes telefonava
pedindo dinheiro a velha, ao meu avô não, pois ele tinha avisado que nada de
dinheiro, se ela queria ficar lá, problema dela, era maior de idade.
Estava comentando com o Otavio que não
sabia o que fazer.
Este pensou um momento, lhe perguntou se
alguém lhe esperava na fábrica.
Não, por quê?
Se o senhor confia em mim o vou levar para
falar com alguém que sim pode lhe dar conselho.
O levou para o pai de Santo, que a primeira
coisa foi perguntar por mim.
Meu neto já veio aqui?
Depois eu explico disse o homem.
Esse mandou a Yao lhe preparar um banho dos
fortes, depois ele se sentou só de camisa e calças, com os pés no chão, como
gostava de estar em Itaipava.
Pai Jeronimo, começou a jogar, virou-se
para o lado, falou alguma coisa.
Ah, é o protetor de seu neto falando.
Sim seu filho vai enterrar a fábrica, mas
se o senhor o tirar de lá, vais criar um problema com tua mulher. O mais fácil, é fazer ela ver isso, que a
decisão seja dela.
No momento que ela fizer isso, seu filho
vai correr para o senhor, para cuidar da sua.
Tire o seu da reta, pois vai fazer
igual. Ele se acha acima do bem e do
mal, porque estudou fora, mas as regras de lá nem sempre se aplicam aqui, tem
sim a cabeça cheia de vento.
Se fosse o senhor, venda sua fábrica, pois
vão precisar do senhor em outra coisa.
Que coisa?
Cuidar da carreira de seu neto, ele será um
dos maiores músicos brasileiros, não aqui, mas lá fora.
Como sabe disso?
Ele indicou a árvore, ele está me dizendo
isso, que o menino que ele protege será importante, espere uns dois anos, aí
faça o que eu estou dizendo, por enquanto vá se livrando de seu filho.
Justo dias depois a professora de música da
escola o chamou, já que constava ele como responsável.
Disse que seu neto Jorge tinha dado um
verdadeiro concerto na escola, para os amigos, tinha tocado piano, pois lá não
tinha violão.
Melhor o senhor o levar para um professor,
indicou um que era da Escola Nacional de Música, no centro da cidade.
Ele conta, que eu com doze anos, quando
entrei, fiquei com um sorriso imenso, ali estava uma sala, cheia de
instrumentos musicais, fui passando a mão em todos, como dizendo, olá, estou
aqui.
A professora tinha ido junto, ali, estava
um piano de cauda, mostra para o senhor o que você sabe tocar.
Me sentei fechei os olhos, toquei um
concerto de Mozart.
A senhora ensinou esse menino, muito bem.
O senhor me desculpe, eu não ensinei nada a
esse garoto, imagina uma sala de aula com 30 alunos, quando muito ensino
solfejo, a cantar alguma música para o final de ano.
Mas seu avô tampouco sabe tocar nenhum
instrumento, isso é dele inato.
Me deu um violão, eu comecei a tocar, a do
Villa Lobos.
Disse que eu parei na metade, perguntei
para ele, posso tocar naquele ali, mostrei o violoncelo, me parece que vai mais
com essa música, pois eu escuto isso no carro com meu avô.
Esse se matava de rir, o culpado sou eu,
adoro os compositores clássicos brasileiros.
Disse que o violoncelo era grande para mim,
mas o toquei em pé.
Aqui fica melhor o senhor não acha.
Meu avô pagava para a professora me levar
todos os dias depois da aula, para fazer classe com esse homem, foi quando
aprendi as notas musicais, ler partitura, embora se escutasse uma vez a música
era capaz de tocar.
O velho professor, dizia, pelo menos
morrerei sabendo que passou pelas minhas mãos um dos grandes.
Quando fiz 15 anos, avisou ao meu avô, que
havia um concurso que eu podia participar, pela primeira vez no Rio, faziam o
mesmo, seria no Municipal do Rio, pois o de São Paulo estava em obras, queria
me inscrever.
Eu ia concorrer com piano e violoncelo.
Meu avô achava precipitado, eu só tinha 15
anos, mas o professor disse, que era justamente para isso, jovens.
Me ajudou a preparar 4 músicas, para cada
instrumento.
Num final de semana, subindo para Itaipava,
o Otavio colocou na Radio JB, num programa novo.
Estavam tocando uma música do
Piazzolla. Fiquei elétrico no carro.
Nessa época o instrumento preferido era o
violoncelo, adorava o som que tirava dele, meu avô tinha comprado um antigo,
que ficava lá.
Mal sai do carro, fui colocar águas nas
quartinhas, agora ele sabia o que eu estava fazendo, virei para o Oxóssi, venha
escutar o que aprendi, está dentro da minha cabeça.
Me sentei na varanda, tirei o violoncelo da
caixa, comecei a tocar a música, que nem sabia o nome, só tinha escutado que
era de um compositor da argentina.
Meu avô tinha comprado todos os lps, dos
compositores brasileiros, Camargo Guarnieri, Santoro, todos os outros que a
maioria era de São Paulo, mas adorava que eu conseguia tocar, Carinhoso de
Pixinguinha, que ele gostava muito.
Eu quando olhei, ali na varanda estava
vários espíritos, que habitavam ali na mata, bem como estava cheio de beija
flores, voando por ali.
Meu velho estava encantado.
Na semana antes, fomos ver o pai de santo,
eu como sempre fui falar com os que estavam na árvore, comentei com ele, que no
dia que tinha tocado para os meus amigos, tinha aparecido vários que habitavam
ali na Mata.
Uau, soltou aquele homem, quero ir. Tinha uma coisa interessante, era um pai de
santo branco, loiro de olhos azuis.
No final de semana ele veio, chegou ali,
abriu os braços, ficou rezando, segundo ele comungando com a natureza.
Me sentei na varanda, tocando minha música
preferida de Villa Lobos, ele não se conteve soltou uma gargalhada, é verdade
menino, estão todos aqui, meu avô queria saber quem.
Ele lhe colocou um dedo na testa, depois de
pedir licença, levou um susto, passou a ver todos que estavam ali escutando.
Não se preocupe, iras em frente, o senhor
se lembra o que lhe falei, chegou o momento, um estrangeiro vai se interessar
por sua fábrica, peça que o pagamento seja lá, não aqui, pois o senhor ira por
muito tempo, acompanhando seu neto.
Participei do concurso, o velho professor
tinha sido esperto, nada de tocar os compositores que sabiam que os garotos de
outros lugares iam tocar, Mozart, Beethoven, por ai vai.
Tudo que eu toquei era diferente.
Fiquei em primeiro lugar em Violoncelo,
piano fiquei em segundo, pois o garoto era bom demais, estudava desde garoto.
Me disse num intervalo, não conhecia essas músicas
que tocas, estou farto das minhas, ele era extremamente técnico, além de tocar somente
piano.
Quando me pediram um bis, depois que
ganhei, falei no microfone, essa música dedico ao meu avô Jorge Menezes, ao meu
outro Jorge Brito, ao seu Otavio.
Minha avó que estava ali, não gostou muito,
de que eu falasse no Otavio, depois iria me chamar a atenção, com aquela famosa
frase que os ricos sempre dizem, o que vão pensar de mim.
Meu pai não foi, achava um absurdo eu não
gostar de samba.
Toquei Pixinguinha para eles, pois sabia
que os dois gostavam.
O publico veio abaixo, um dos
coordenadores, me perguntou quem tinha feito o arranjo, bati na minha cabeça
dizendo que estava ali.
Ele disse ao meu avô, que eu devia estudar
composição, bem como regência, dentro de alguns anos.
Teria agora que ir para Paris, me
apresentar no concurso lá, meu avô entendeu, realmente dias depois apareceu um
homem que disse que estava interessado na fábrica, queria fabricar ali, para
não ter que fazer importação da França para lá, queria abranger o mercado brasileiro,
bem como Argentina, Peru, Chile.
Meu avô era um homem de seu tempo,
concordou em vender, mas com uma condição, 20% seriam meus, não íamos
interferir, mas apenas receber bonificações, além de pedir que seu gerente
continua-se.
Só depois do negocio fechado, depositariam
o dinheiro para ele, em Luxemburgo, assim teria dinheiro na Europa.
Minha avó, ficou uma fera, não conseguia se
decidir com seu filho, que só fazia merdas, meu avô lhe avisou, se segues por
aí, acabaras vivendo em Madureira.
Só de pensar nisso, ela pensou muito,
colocou o filho para fora, dando autonomia ao gerente, a quem o filho sempre
desautorizava.
Esse como dizia o Otavio arrumou seus panos
de bunda, se mandou para a América.
Meu avô tentou falar com minha mãe, mas
soube que ela estava no Amazonas com seu guru, experimentando não sei o que.
Só balançou a cabeça, fomos nos aprontando,
fomos tirar passaporte, ele se virou para seu Otavio, meu velho amigo, preciso
de ti conosco.
Minha avó, apesar de ser para a Europa,
sabia que não seria o centro das atenções, estava era tentando localizar a
filha, reclamando que nessa família todos tinham cabeça de vento.
Se esquecia que tinha sido ela que os tinha
educado assim.
Fomos um dia jantar na casa dos meus outros
avôs, meu pai tinha uma certa inveja, pois imagina eu tocando vários
instrumentos, ele quando muito como se dizia arranhava o violão.
Não podia fazer nada, meu avô tinha minha
guarda.
Lá fomos nos para o concurso europeu.
Não sei por que, o concorrente de piano
desistiu, eu como tinha ficado em segundo lugar, teria que me defender nos dois
instrumentos.
Na véspera, fomos de passeio, assim
relaxas, chega de tanta música, fomos andar pela cidade, eu adorava pois para
seu Otavio, que dizia que tinha saído de Olaria para o mundo, rimos muito com a
história do voo, meu avô teve que lhe conseguir uma pastilha para dormir.
Só dizia uma coisa, que ali faltava arroz
com feijão que ele fazia lá no sitio de Itaipava.
Chegou o dia, me apresentei, me sentei com
o violoncelo, quando olho para a lateral do palco, lá estavam meus amigos, eu
quase ri, pensando ainda bem que essa gente não os vê, pois estavam nus como
sempre.
Toquei Bachianas Brasileiras, nº1 de Villa
Lobos. Em seguida ao primeiro acorde, eu
já não estava ali, era como se eu estivesse lá na varanda de Itaipava, toquei
relaxado, em minha cabeças, lá estavam todos meus amigos da mata.
O publico aplaudiu de pé, foi como se
tivesse despertado.
No dia seguinte teria que tocar a de piano,
substituindo o rapaz que não tinha vindo, toquei Choro para piano forte do
Camargo Guarnieri.
Foi bom, mas eu tinha visto os outros
concorrentes, a minha única vantagem era que eu tocava compositores que eles
não conheciam.
Fiquei em segundo lugar.
Tive que me apresentar outra vez para a
final, quando me pediram o primeiro bis, sem querer me veio na cabeça a música
que tinha visto a orquestra ensaiar, Pavane op. 50 de Fauré, fiz isso sem
avisar ninguém, tudo que via era aquele homem ali ao lado, me olhando, me
fazendo seguir os compassos.
Depois descobrir que era ele.
Emendei em seguia só respirei fundo para
Fuga e Mistério de Astor Piazzola.
Tive que voltar ao palco, aí toquei olhando
para meu avô sentado ao lado do Otavio na primeira fila, Carinhoso.
Começou minha andada, meu avô alugou um
apartamento em que eu pudesse ensaiar. Era o último andar de um edifício, ia as
lojas de músicas, tinha um professor que me orientaria, ele se matava de rir
comigo, dizia que eu bebia da fonte.
Escutava uma vez, se errava era eu que dizia a nota e quando tinha
errado.
Preparamos um repertório diferente, além do
brasileiros, inclui, Fauré, Nino Rota que ele me mostrou, Ennio Morricone,
quando tocamos na Itália, pensavam que eu tocava porque eles eram de lá.
Quando saiu o primeiro CD que gravei, foi
que viram que não, fazia parte do que eu tocava.
Tinha gravado tudo com a Orquestra da Radio
France.
Foi genial, o maestro se matava de rir,
pois eu as vezes parava, dizia que instrumento tinha errado, o que, mas falava
baixo.
Assim viajamos quase o mundo inteiro,
Otavio depois da primeira viagem longa, ficou em Paris, quando chegamos, disse
que nem queria saber se era longe, mas ele nunca mais ia ficar para trás.
Meu avô falava sempre com sua mulher, até
que recebeu um documento, lhe pedia o divórcio, se sentia abandonada, mentira,
se casou logo em seguida, com o homem que dirigia a fábrica.
Anos depois encontraram minha mãe, metida
numa seita no amazonas, tomando não sei que ácido, a trouxeram para o Rio, foi
internada em seguida.
Levamos mais de 10 anos sem voltar ao
Brasil, tive que concordar com o Otavio, meu avô estava velho, queria seu pouso
de guerreiro, em Itaipava.
Tive que me apresentar no Municipal do Rio
e de São Paulo, até meu pai foi me assistir, com um terno e gravata que nunca
usava.
O homem que apresentava falou dos meus
logros, os lugares que tinha tocado, bem como as orquestras.
Tinha ido falar com o pai de Santo, ele
disse que agora eu devia estudar composição, bem como regência. Teu avô o Otavio cuida dele, venha sempre que
puder.
No Rio, apresentei minha primeira
composição, foi um sucesso, com direito a orquestra batendo palmas em pé. Nessa hora sem querer, olhei meu pai, ele
estava chorando.
Para finalizar, toquei primeiro o Adagio de
Albinoni, que tinha descoberto a pouco tempo, depois olhando meu velho, toquei
com todo coração, pois devia tudo a ele Carinhoso.
O público veio abaixo.
No dia seguinte fomos para casa, como meu
avô chamava Itaipava, desceu do carro, abriu os braços, enfim em casa Otavio.
Apareceram o meu outro avô, que ficou
abraçado comigo, venceste meu filho, depois meu pai, se sentou comigo, eu quase
lhe perguntei, quem ele era.
Meu avô tinha mandado levar meu piano, para
lá. Depois eu desenhei uma sala grande
aonde ficariam meus instrumentos.
Me sentei ali, sem que meu pai soubesse,
comecei a tocar um samba, ficou rindo, pelo menos eu tenho uma participação.
O que ele não esperava era que eu cantasse,
tinha uma voz afinadíssima.
Semana depois fui embora, ele veio me
buscar para ir ao aeroporto, eu era mais alto que ele, tinha uma maneira de
andar, levantado, com meus cabelos compridos, com meu violoncelo na mão.
Me ofereceram ir na primeira classe, pois
um dos pilotos tinha me assistido.
Foi quando verdadeiramente comecei a viver
um outro caminho, agora sozinho, vivia no mesmo apartamento que no inicio me
pareceu faltar sempre meu velho. No
primeiro concerto que dei com a orquestra na Opera de Paris, ao final me
levantei deixei meu violoncelo encostado na cadeira, fui até o piano, me sentei
tranquilamente, comecei a tocar e cantar Ne me quite pás, de Jacques Brel, no
dia seguinte estava em todos os jornais, me chamavam de caixa de surpresas.
No dia seguinte toquei minha primeira
composição a que vinha trabalhando a algum tempo, o pessoal levou um susto,
pois me apresentei com só o grupo de percussão, era um ponto para Oxóssi, mas
comigo tocando o violoncelo.
Depois o tornei a tocar dias depois com a
orquestra, nunca mais parei, um dia Otavio me chamou, meu velho tinha estado no
hospital.
Foi quando voltei, o mais interessante,
todas as músicas que tinha feito, era de Menezes de Brito, que ninguém sabia
quem era. Levei sem saber todas minhas
gravações, para meu pai, bem como para o meu velho.
Infelizmente ele morreu logo em seguida,
foi um enterro interessante, muita gente, a velha veio acompanhada de seu novo
marido, os dois filhos, apareceram, queriam era saber o que havia de herança.
Quando o advogado marcou, me entregou antes
um envelope largo.
Me dava posse das terras de Itaipava, bem
como do dinheiro que ainda existia em Luxemburgo.
Ele tinha vendido o resto da fábrica para o
mesmo, o dinheiro estava todo lá.
Tinha uma carta dele para mim.
Quem estava abalado era o Otavio, tinha
vivido basicamente desde jovem, em função do Doutor Menezes, como o seguiu
chamando a vida inteira.
Não havia nada para ninguém, ele deixou um
apartamento em Ipanema, para os filhos, Itaipava era para mim.
Aproveitei para descansar, meu outro avô
agora subia, as vezes arrastava meu pai, que estava perdido, foi quando lhe
mostrei a música de Oxóssi, lhe pedi ajuda, afinal ele entendia de percussão,
ficou todo bobo quando falei.
Tocamos no Rio e São Paulo, falei antes com
o meu pai de Santo, que riu muito, agora tens que fazer uma para os meninos, o
fiz sentar-se na plateia do Municipal, me sentei ao piano e comecei a tocar,
ainda estou trabalhando.
Queria que houvesse alguma coisa, para
Oxóssi.
A música por si só basta.
Meu pai trouxe vários da bateria do
Salgueiro que eram seus amigos, demoraram para entender a música, sem querer
soltei, quem é Ogan aqui. Entenderam
chamaram uns quantos mais, expliquei o que queria, levei dois dias com eles,
ensaiando, ajudado pelo meu pai. Esse
pela primeira vez ria horrores comigo, pois misturava palavras em português em
francês que era minha segunda língua.
Foi um arraso, avisei a Paris, vieram
filmar e gravar para um disco, iria passar na televisão lá.
Antes de começar a música, falei de Oxóssi,
bem como dos meus amigos Curumim.
Foi interessante, repeti o mesmo no Teatro,
sozinho no meio do palco, na plateia estavam meus outros avôs, meu pai, o pai
de santo, Otavio.
Apontei para ele, foi o primeiro que
descobriu quando eu comecei a falar em criança dos meus amigos da mata, ele
entendeu, existem vários nomes para se referirem a eles Curumim, Cosme e
Damião, Erê, Ibeji, com eles sempre estava meu pai Oxóssi, essa música é para
ele que me protegeu durante essa travessia toda.
Rindo contei que quanto tinha me
apresentado em Paris, no concurso, eu estava relaxado, olho para a lateral, lá
estavam eles, como eu os via sempre com sua tanga, nada mais.
Eu quase soltei uma gargalhada, pois fiquei
imaginando se o público pudesse vê-los.
Comecei a cantar o ponto de aonde tinha
tirado minha composição, os músicos foram entrando, claro com a percussão, era
diferente, também era minha primeira regência.
Segundo Otavio e o pai de Santo, eu parecia
estar incorporado, não sei, mas a música saia de dentro, agora sabia como seria
a outra.
Disse ao meu pai, para ele tirar uma
férias, o levei comigo para Paris, primeiro ele se matou de rir, pois imaginava
esse apartamento como um luxo total, só tinha uma coisa de luxo, a varanda
aonde eu gostava de tocar, o resto tudo era simples, parecia uma extensão de
Itaipava.
Ele foi comigo as aulas de composição e
regência, um dia me disse, perdes teu tempo, já está tudo dentro de ti.
O vídeo gravado no Brasil, fez um sucesso
impressionante, queria reproduzir lá, mas claro fui claro, esse pessoal da
percussão era de uma escola de samba.
Duas orquestras a de Paris e Berlin,
bancaram a vinda deles, dei dinheiro para meu pai, foi até lá conseguiu trazer
esse homens, que se deslumbraram.
Imaginem de uma bateria de escola de samba, agora tocarem em Paris e
Berlin.
Foi corrido, o que me pagaram dei para
eles, assim podiam melhorar suas vidas.
Quando a outra música achei que tinha
ficado pronta, fiz diferente, fui ao terreiro do meu velho amigo, pedi Ogans
realmente que pudessem tocar comigo.
Vieram a Paris, para gravar, tinha passado
uns dias em Itaipava, com meu velho amigo Otavio.
Teu avô ia ficar orgulhoso de ti.
Me contou uma história que eu não sabia, um
dia teu avô me contou isso, na hora pensei que era coisas da sua cabeça.
Me disse que devias ser a reencarnação do
irmão dele, que amava a música, mas que o pai deles não gostava, seu irmão
tinha escapado do pai, indo para Israel, acabou morrendo numa das guerras por
lá.
Ele na verdade nunca gostou da fábrica, a
levava como uma obrigação, depois dizia que era um meio para chegar ao que
queria.
Verdadeiramente foi feliz, aqui, era seu
canto sonhado, quando tua avô pediu o divórcio, para ele foi como soltar um
lastre, nunca disse nada.
Gravamos com a Orquestra Sinfônica a música
dos meus amigos, começava como eu me lembrava deles, lá na chapada Diamantina,
aonde me sentia só, me levavam para a mata, para olhar os pássaros, os bichos,
tomar banho numa cascata, a música ia contando tudo isso, do nosso reencontro
em Itaipava, depois eu fazia uma brincadeira com o ponto de chamada dos Erês,
ia num galope desenfreado, como quando começávamos a correr pela mata.
Contei isso para um vídeo Maker, que ficou
como um louco, fez tudo em desenho animado, ganhou um festival nos Estados
Unidos.
Quando passei para eles em Itaipava, eu já
tinha meus cabelos todos brancos, antes do tempo me dizia o velho Otavio.
Um dia me contou como tinha conhecido meu
avô, estava dormindo a dias na Praia, ele me viu lá de cima, eu tinha saído de
um orfanato, tinha medo de tudo, ele desceu veio me perguntar porque estava
dormindo ali.
Lhe disse a verdade, perguntou se eu sabia
dirigir, lhe disse que não seu Doutor, mas posso aprender.
Me levou para cima, na área dos empregados,
me mandou tomar um banho, a Deolinda preparar comida para mim.
Tua avó fez o maior escândalo, quando ele
pediu meus documentos, arrumou tudo para mim, me colocou numa aulas para
aprender a conduzir aquele carro velho, que ele adorava, fui saber depois que
era do irmão dele.
Nunca mais sai do lado dele.
Ao escutar sua história, comecei a imaginar
como música, um dia meu velho amigo não levantou, morreu dormindo com um
sorriso na cara, a mão direita parecia que estava estendida para alguém.
Meus amigos avisaram, teu avô o veio
buscar.
Tinha montado uma sala de música completa
ali em Itaipava, minha solidão só se quebrava com as visitas de meu pai.
Um dia creio que ele tomou coragem me
perguntou se eu nunca tinha tido ninguém na minha vida.
Rindo lhe perguntei, como se nunca parava
em lugar nenhum. Mostrei para ele a
música que estava fazendo para o Otavio, inclusive uma parte que era
representando o primeiro voo dele para a Bahia, para irem me buscar.
Ele se matou de rir com a história, me
disse sinto inveja de ti, que consegue ver através da música tudo isso, eu aqui
tentando a vida inteira emplacar um samba.
Se aposentou antes, foi comigo para Paris, se
não fosse ele eu passava o dia inteiro dentro do studio escrevendo,
reescrevendo alguma coisa que não gostava.
Finalmente a música ficou pronta, ele se
matava de rir, pois as pessoas me cortejavam, um dia soltou, homens e mulheres
ficam atrás de ti, pois eres um homem bonito, mas na verdade cheguei a
conclusão que não vês ninguém.
Quando a música finalmente foi gravada,
apresentava em Londres, Berlin e Paris, voltei para Itaipava.
Tinham entrado lá, precisava de alguém para
ficar quando eu não estivesse, pedi para os meninos, isso eu sabia que eles me
fariam. Um apareceu um negro, era a
cópia cuspida e escarrada do Otavio, se fosse filho dele, seria perfeito.
Me perguntou, seu Doutor não precisa de
ninguém, eu faço qualquer trabalho.
Foi ficando, virou como dizia meu avô do
Otavio, meu braço direito, esquerdo e as pernas.
Meu pai foi viver lá em cima.
Lhe perguntei é o samba?
Ao caralho com o samba, nunca me deu nada,
me fez perder isso sim. Lhe perguntei se
tinha suas poucas músicas gravadas.
Me mostrou cheio de vergonha, eu comecei a
trabalhar em cima delas, ele se matou de rir, me ensinando a pensar como
músico.
Um samba enredo, que ele tinha escrito a
letra, era sem pé nem cabeça, rimos muito com isso, mas me explicou se analisa
um samba enredo, é como o samba do criolo doido.
Rimos muito, meu outro avô agora subia,
dizia que adorava ver finalmente pai e filho juntos.
Quando nos viu trabalhando juntos, foi o
máximo, um dia fomos ao Salgueiro, ele juntou os seus, para trabalharem a parte
musical do projeto.
Infelizmente ele não viu a estreia, ninguém
sabia, nem seu pai, estava com câncer, com poucas soluções, tinha fumado como
um louco a vida inteira, não quis nem cuidados paliativos.
Um dia despertei com ele tossindo muito,
pensei comigo, tenho que o levar a um médico, quando olhei meu Oxóssi esta ali
nos pés da minha cama, me disse, acaba de partir.
A estreia da música foi muito emotiva, fui
mais uma vez a Paris, para apresentar, depois vendi o apartamento lá, que era
meu, reuni o dinheiro todo, voltei para o Brasil.
Já não sairia mais de Itaipava, algumas
músicas surgiam na minha cabeça, fui ao enterro do meu pai de santo, me levou o
Januário, o rapaz que me cuida.
Depois fui ao do Jorge de Brito, meu outro
avô, pensei estou ficando sem ninguém.
Agora me chamavam para ser júri do mesmo
concurso que eu tinha saído, mas me enchia o saco, que os professores só
preparassem esses meninos para tocarem as mesmas coisas que todos tocavam.
Nunca tinha tido esse problema, isso dizia
meu curriculum, sempre tinha tocado os menos famosos.
Um dia desses entrarei na mata com meus
amigos, depois já se vera.
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