JEEP

 

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Meu nome é Andrew Rover, ou melhor como dizem os amigos, Andy o vagabundo, claro tem seus motivos, pois com os anos me tornei um cu, inquieto, nunca parando muito num lugar, de uma certa maneira com isso conhecia quase que o pais inteiro.

Quando sai de casa, acreditavam que eu saia com uma mão na frente outra atrás, com o velho jeep Rover do meu pai, nada mais longe da verdade, o velho era esperto.

Na verdade ele não era dono das terras, sim minha mãe, ainda por cima meu irmão mais velho.

Antes de morrer, eu tinha uns 17 anos, ele me levou para tirar documentos, carteira de identidade, de motorista, ele mesmo me ensinou a dirigir nesse velho Rover, que os dois tínhamos ao longo dos anos recuperado.

Ele tinha comprado o mesmo numa loja dessas de segunda mão, a beira da estrada, na entrada da vila mais perto da fazenda.

Me obrigou sim a estudar, minha mãe, que mal sabia assinar seu nome, dizia para que, se eu seria o serviço braçal do meu irmão mais velho quando ele herdasse a fazenda.

Mas ele insistiu, me levava até a entrada da fazenda com o jeep, sabia que horas o ônibus voltava, ia me buscar.    Ao contrário de minha mãe que não se interessava, ele queria saber o que tinha estudado nesse dia, se era geografia, ia falando as cidades que tinha conhecido nesse estado.

Não faça como eu, me dizia, enfrente a realidade sempre de frente, com a cabeça alta, o corpo reto, vá a luta, isso era uma ladainha.

Me ensinou a me defender dos abusos, sejam os bullying na escola, ou do meu irmão, esse era um bruto por natureza.

Foi nesse dia, que fomos tirar os documentos, que ele me levou ao banco, sem eu saber já tinha uma conta lá, desde o dia que nasci, agora me fazia oficialmente dono da mesma, aproveitou para depositar o que sempre fazia todos os meses, tinha na fazenda segundo ele, como um salário, metade ia para essa conta.   Sempre sonhei que terias um futuro, eu devia ter estudado mais, tentado ir à universidade, mas fiz a besteira de entrar para o exército, vi muita merda, que não quero para ti.  Pois aparentemente, a única saída que eu tinha, para escapar da fazenda era entrar para o exército, isso ele dizia que jamais.

O jeep, estava como novo, no último mês, pintamos o mesmo de verde escuro, assim é mais fácil de conservar.

Ele sempre me falava do mar, que tinha conhecido no exército, falava sempre de como era a experiencia de ter entrado no mesmo com os amigos.

Todos morreram, só eu sobrei, pois no dia que todos acabaram numa cilada, eu estava na enfermaria do quartel, com um problema estomacal, tinha comido alguma coisa dos vietnamitas que estava mal.

Foi o que me salvou, senão nem estarias tu aqui.

Ele me contou também como tinha vindo parar na fazenda, depois do exército, tinha ido dando tombos, por todos os lados, quando chegou na cidade, encontrou meu avô que procurava gente para trabalhar.  Foi quando conheceu minha mãe, nunca tinha sido bonita, mas estava gravida, meu avô propôs eles se casarem, ele ficava como administrador, pois ela era uma negação para isso.

Reconheceu meu irmão como seu, meu avô não queria que fosse chamado de bastardo, mas isso não invalidou que todos na cidade o chamassem assim, pelo seu mal caráter.

Quando eu nasci, ele se tomou de amores por mim, meu avô tinha acabado de morrer, mas no seu testamento, a fazenda ficava para a filha, mas ele era o administrador.

Foi quando como ele me disse, já que ficava lá prisioneiro, começou a depositar metade do que ganhava, na minha conta.

Quando reformamos o jeep, fizemos uma coisa, na parte detrás do mesmo tinha um reposto, uma vez tivemos problema, pois furaram os dois pneus traseiros, ele inventou uma maneira, tinha visto num carro, um outro pneu de reposto, embaixo do assento traseiro.

Ele adorava um mistério, no dia anterior a sua morte, ele ficou furioso com meu irmão que só faltava me bater, por não querer obedecer suas ordens, me dizia, veras, no dia que o velho morrer, vou te moer de pancadas, mas eu era mais alto que ele, além de mais forte, aprendi a lutar com meu velho.

Ele teve um enfarte, pois minha mãe, defendeu meu irmão, sempre fazia isso, me ignorava olimpicamente, dizia que bastava ter tido que me gestar e amamentar, só para satisfazer meu pai.

Ele me puxou para perto dele, disse, se eu morro, sabe aonde estão as chaves, mas não se esqueça do pneu embaixo do assento.

Na hora achei que ele estava delirando, me disse que eu me mandasse, que ali não havia nada para mim.

Do banco tinham me dado o número da conta, bem como um quartão de crédito, com um valor alto.

No outro dia, ele não melhorou, no meio da tarde, morreu, segurando minha mão, meu irmão, bem como minha mãe, nem se incomodaram.

Nessa noite, arrumei minha mochila, com o pouco que tinha, só levaria um livro dos muitos que tinha “on de Road” Jack Kerouac, que ele tinha lido mil vezes, me disse que tinha feito uma parte do percurso que ele falava, queria saber como era, mas já era tarde, tudo que ele viu, já tinha se transformado.

Sai de fininho, entrei no jeep, me mandei, mas fiz uma coisa, sabia que nenhum dos dois tinha inteligência para mexer em motores, na fazenda tinha uma caminhonete, sabia que meu irmão viria atrás de mim, por isso tirei um tubo do lugar, assim não funcionaria.

Dito eu feito, já estava a alguma distância quando o vi sair com uma espingarda que era do meu avô, entrar na caminhonete, a mesma não funcionar, ele ainda tentou atirar, mas já tinha uma bela distancia, passei no banco que abria nesse momento, retirei dinheiro, disse que meu pai tinha morrido.

Então espere, me disse o diretor, me mostrou uma carta do velho, se alguma coisa acontecesse, transferisse para a minha seu dinheiro, que tampouco era pouco, economizado todos esses anos.

Preferi o retirar, enfiar na minha mochila, ele me deu uma lista de cidades, aonde o banco tinha filial.

Lhe disse que não falasse nada ao meu irmão, ele vai herdar a fazenda, vai querer dinheiro.

Com a fama que tem, nada disso, me contou que tinha brigado com seu filho, o encheu de porrada, por causa de uma bebida.

Eu sabia, ele gostava de beber, mas não sabia se controlar, volta e meia dormia na cadeia, principalmente na época que os rodeios passavam pela cidade, o coitado sonhava em ser cowboy, mas era ruim até nisso.

Coloquei o pé na estrada, o diretor do banco me acompanhou até a porta, me viu sair pela direita, mal sabia que eu cheguei ao final da rua, virei, voltei pela rua detrás, fui em outra direção.

Ainda parei na primeira cidade grande, para comprar um saco de dormir, um fogão desse de camping, fiz compras no supermercado de coisas que podia usar se precisasse, tipo sopa em lata, tudo que eu pudesse comer, se parasse em algum lugar, no primeiro momento, não queria ficar em nenhum motel, pois meu irmão eu sabia que viria atrás de mim.

Três dias depois me relaxei, estava louco por um banho, mas mesmo assim preferi tomar num riacho, que vi uns caminhoneiros tomando banho.

Esperei que fossem embora, para fazer isso, não queria intimidade com ninguém.

Foi quando cheguei a Houston, lá sim fiquei num motel, a partir desse dia me registrava como Andrew Rover, o sobrenome dele, retirei do meu nome o de minha mãe.

Tempos depois tiraria novos documentos como Drew Rover.

Depois de conhecer a primeira cidade grande do meu caminho, pensei muito, o que deveria fazer, foi quando uma noite sonhei com meu pai, no final ele como se despedisse de mim, me disse claramente, olhe no pneu de reposto.

Numa parada no meio do caminho, resolvi olhar, imaginei que ele tivesse escondido alguma coisa embaixo.  Nada, mas o pneu pesava mais do normal, saia tranquilamente a parte do meio de metal, ali estava muito dinheiro, eram mil rolos de notas grandes, contei quanto tinha cada uma, era um bom dinheiro para qualquer lugar, foi quando me lembrei que minha mãe odiava os bancos, por não saber manejar as coisas, os lucros, ele tirava a parte dele, depois dava para ela o restante, ela fazia exatamente isso, fazia um rolo com as notas, uma parte dava para meu irmão, para mim, como se soubesse o que ele fazia, só me dava o necessário para comprar umas calças novas, ou uma bota.

Foi em Houston que eu mudei minha maneira de vestir, vi como faziam os jovens de minha idade, tinha também toda a documentação da escola, se quisesse ir a universidade.

Fui visitar a de lá, os rapazes me olhavam rindo, por causa de minhas botas de cowboy, nesse dia comprei meu primeiro par de tênis, camisetas, tinha duas calças jeans, mas as cuecas eram velhas, bem como camisetas para usar por baixo da camisa jeans.

Mas não gostava da cidade, queria ir para aonde ele vivia falando, tomei direção a Los Angeles.

Primeiro San Antonio, adorava escutar essa maneira de falarem, soltarem alguma palavra em espanhol, depois fui para El Paso, aproveitei para realmente mudar meu nome, ali era uma bela confusão, pois do outro lado da fronteira estava Ciudad Juarez, aproveitei para descansar uns dias, tive minha primeira relação sexual, com um mexicano, muito bonito, moreno de olhos verdes, me disse que seu pai era descendente de irlandeses.

Me disse com uma cara de sem vergonha que eu devia ter sangue irlandês por causa dos meus cabelos meio vermelhos, além da quantidade de sardas pelo corpo e pela cara, além de meu olhos verdes.   Bonito não era, mas tinha um tipo.

De lá fui para Albuquerque, a parti desse momento ia pensando no que gostaria de estudar, quando comentei com um rapaz que conheci na universidade, sempre ia olhar o que ofereciam, me perguntou se eu ia para Los Angeles com ideia de fazer cinema.

Nesse dia, quando parei o jeep no meio do nada, essa conversa me veio a cabeça, pois esse era um dos meios que meu pai adorava, aos domingos íamos sempre ao cinema, ou ver um filme de cowboy, ou de detetives, que ele adorava, se o ator não funcionava, ele fazia uma bela critica, vê, tem cara de macho, mas quando o filma em cima do cavalo, não sabe se comportar.

Ou um detetive, olha como o sujeito anda, parece que esta de sapatos altos, fazia como o sujeito devia andar, ficávamos os dois as gargalhadas, minha mãe, parava na porta, zangada pois nos estava chamando para comer, a comida diga-se de passagem era sempre uma merda, cozinhava muito mal.

Quando fiquei mais velho, saiamos do cinema íamos comer por ali, ou num mexicano, ou hamburger.

Ela ficava uma fera, pois quando chamava para comer, ele dizia simplesmente, já comemos na cidade, guardava os pratos, para comermos no dia seguinte.

O rapaz me disse, que em Los Angeles na universidade tinha um curso de cinema.

Foi o que fiz, no primeiro dia que cheguei, a cidade era imensa, me informei, mas fiz uma coisa, procurei um lugar para ficar, um motel desses com estacionamento, tinha que deixar meu jeep em algum lugar.   Assim também tinha um endereço, no dia seguinte, fui primeiro a universidade, me informei a respeito, olhei quanto tinha que pagar, o fiz com cartão de credito, depois me informei de um banco por perto, transferi minha conta, comecei a procurar um apartamento pequeno, ali estava cheio de studios para estudantes, consegui um por camaradagem com um homem da secretária da universidade, me levou até lá, no meio da conversa me soltou que eu tinha tipo para fazer cinema, que conhecia gente que fazia pontas em filmes, que ele mesmo tinha feito.

Tinha um bom dinheiro no banco, bem como o que estava na roda do carro.

Mal me mudei, retirei o dinheiro do pneu, levei o mesmo para colocar como devia ser.

O homem elogiou como estava o jeep, se eu quisesse vender arrumava gente.

Lhe disse que o tinha recuperado com meu pai.

Ele me disse de uma oficina que fazia isso ali perto, telefonou para alguém, me disse como ir até lá.

O homem examinou o jeep todo, elogiou o que tínhamos feito, estava recuperando um Thunderbird vermelho, muito maltratado, o consegui numa garagem, estava abandonado.

Eu disse que só podia trabalhar de tarde, que de manhã, faria universidade.

Muito bem, não me perguntou o que.

Me disse quanto podia pagar, ele trabalhava de manhã, numa delegacia, já não sou um policial, levei um tiro, me colocaram para atender as pessoas, faço o turno logo cedo, de 7 da manhã, até as 2 da tarde, assim tenho tempo.

Vi que poderia pelo menos ir ganhando um dinheiro, dava para pagar o aluguel do studio, me sobrava algum, o que fiz a partir desse dia, cada vez que ele me pagava, ia ao banco, depositava com o meu salário, com mais algum do pneu, até que depositei tudo.

Levamos muito tempo recuperando o carro, pois atendia a muita gente conhecida dele, principalmente algum policial, sempre me olhava de cima a baixo.

Tinha vontade de dizer, como é gostou.

Quando começaram as aulas, vi que eu era um zero a esquerda em termos de cinema, pois estava acostumado ao que via com meu pai, mas não dei o braço a torcer, nunca seria um aluno brilhante, pensei, mas prestava atenção no que dizia o professor, ao analisar qualquer coisa, fiz um grande gasto, comprei na época um aparelho para DVD, pois os filmes tinham sido transformado para isso.   Quando ele comentava de algum, nessa noite, me sentava, com um sanduiche, na frente da televisão, alugava o filme numa loja perto da oficina, me dedicava a analisar tudo o que ele tinha falado, inclusive como funcionava os atores, algumas vezes pensava o ator secundário é quem da vida ao filme, é melhor que o principal.

Alguns velhos atores, roubavam as cenas pequenas que faziam, eu adorava, a alguns eu chegava a bater palmas, depois ria, pensando se alguém me escuta fazendo isso, vão pensar que estou louco.

Nunca comentava com ninguém o que fazia.

Tinha um dos professores, que dava aulas de roteiros, analisava os roteiros, nos dizia para ver tal filme, se tinham usado bem o roteiro, as vezes comentavam do livro que tinha sido tirada a história, eu acabava gostando mais do livro.

Ele elogiava minha analise, mal sabia que eu não era metido a intelectual como a maioria, era muito pé no chão para tudo isso.

Para as férias, nos deu uma série de livros e filmes para ver, eu só aproveitei para ir à praia, tinha ido algumas vezes, mas não tanto como queria, fui com o meu chefe, ele me levou a Venice Beach, aonde ia se encontrar com velhos amigos, eu fiquei como louco, pois todos faziam surf.  Um que ia sempre a oficina, me disse que podia me ensinar.

Depois meu chefe me diria, cuidado ele gosta do que tens no meio da perna.

O tipo era interessante, quando soube que eu estudava cinema, me falou que tinha feito uma serie de filmes, policiais, vestindo o meu uniforme mesmo, era um tipo feio, com cara de macho, acabei na cama com ele, tinha um corpo estupendo.

Tu não precisas, já fazes exercício na oficina mecânica.   Queria me ver sempre, lhe disse que era impossível, pois tinha que estudar, que levava isso a sério.

Foi bom, pois percebi que o tipo era controlador, por duas vezes o vi, passando pela universidade, estacionado perto do meu jeep.

Mas não voltei a sair com ele, não queria estar preso a ninguém, tampouco podia dizer que eu era um galinha, pois fazia um roteiro todos os dias, saia cedo para a universidade, nem parava como os outros para tomar café, tomava em casa, estudando alguma coisa, depois aulas, comia na lanchonete de lá, pois era barato, depois ia direto para a oficina, de lá comprava alguma coisa para comer, ia estudar o resto da noite.

Todo o trabalho que o professor tinha falado, devorei, o que mais gostei, foi um que ele frisou muito, vejam as duas versões, o livro tinha sido escrito por um escritor francês, tinham feito o filme lá, depois uma versão americana.

Era como ver duas coisas distintas, gostei da primeira a francesa, inclusive cheguei a ver sem dublagem, queria escutar a voz do ator, a maneira de representar era mais séria, mais dura, a americana era comercial, vamos dizer assim que o mesmo vendia seu peixe, mas não se aprofundava como o outro.

Quando comentei isso em aula, descobri depois que era o único que tinha chegado até os dois filmes, três se contasse a versão não dublada, ele me elogiou, que tinha feito um belo trabalho.

Me deu uma bela nota, os outros começaram a me olhar de outra maneira, para a maioria eu era um caipira com ideias de grandeza.

Me saia bem, ele me deu uma lista de livros e filmes franceses e italianos, foi quando descobri Fellini, comentei com ele, que no final de semana, tinha alugado todos que tinham no vídeo club, que tinha amado La Doce Vita, mas Amarcord, foi emocionante.

Ele me trouxe na aula seguinte, um filme de Vittorio de Sica, “Ladrão de Bicicletas”, amei, me sugeriu ver “Duas Mulheres” com Sofia Loren, eu estava descobrindo outro mundo.

Ele francamente me disse, que só eu para me interessar por esses filmes, eu falo nas aulas a maioria passa, querem ser diretores como os daqui.  Um dia me sinalizou uma série de alunos, os pais por um acaso era atores, ou diretores, mas esses nunca chegaram a nada.

Me convidaram para uma festa numa mansão, de um deles, como meu chefe dizia que tinha que me enturmar com os da minha idade, pois seus amigos eram muito mais velhos do que eu.

Fui para dar uma olhada, eu cheguei com meu jeep, ali só tinham carros do ano, um mais impressionante que o outro.

Quando vi que marijuana, rolava solta na casa, bem como cocaína, de fininho, depois de falar com o que tinha me convidado, fui como uma serpente me esgueirando, fui embora.

Soube depois que houve uma batida policial por lá, com gente altamente colocada.

Nunca mais aceitei nenhum convite deles, tinha na cabeça que eram filhinhos de papai, eu não dava um duro danado na oficina.

Um dia, um apareceu, levando o carro do pai, tinha batido com o mesmo, quando me viu trabalhando, ficou só observando, no dia seguinte todo mundo sabia que eu era mecânico de carros, evidentemente me colocaram de lado.

O professor, ao contrário só me perguntou a que horas eu me dedicava a ver os filmes recomendados, lhe disse que de noite, lhe expliquei como fazia, me sento com um bloco ao lado, vou anotando tudo que me parece importante no filme.

Lhe contei como meu pai fazia, os comentários sobre o comportamento dos atores.

Me disse um dia, que estavam fazendo um casting para um filme que ia de carros, o ator principal, era também o produtor, adorava carros, um dia apareceu com o mesmo na oficina.

Meu chefe o conhecia, tinha recuperado um carro que ele tinha destroçado, numa dessas corridas clandestinas, eu nem sabia que existiam, disso ia o filme.

Me levaram até um determinado lugar, me explicou de que ia o filme, eram dois carros competindo, tinha que me proteger, para fazer algumas cenas.

Eu achei o máximo, os dois carros era dele, meu chefe foi também.

Acabamos os dois fazendo o filme, um dia nos convidaram para ver o copião, fui preparado, com um bloco para anotar coisas.

Analisei a cada cena que aparecia, ele se matava de rir comigo, aqui por exemplo, poderia ter feito melhor.

O diretor do filme, gostou, me convidou para fazer o casting, para um filme policial, tinha claro corrida de carros, mas seria filmado num final de semana, nas ruas vazias de San Francisco.

Me pagavam bem, fiz, mas acabava a filmagem, voltava a fazer aulas, me recuperava de tudo que tinha aprendido.

Estreou o primeiro filme, todo mundo de repente virou meu amigo, me convidando para festas, eu me desculpava, pois tinha que trabalhar, o Thunderbird, tinha ficado pronto depois de quase dois anos trabalhando nele nas horas vagas, meu chefe o vendeu por um absurdo de preço, me deu uma parte, pelo meu trabalho.

Foi para o banco como sempre.

Logo um outro diretor me chamou para fazer um filme, o papel principal, era de um desses galãs, que gritam quando vem uma barata, mas era um tipo macho, acabei na cama com ele, era uma dama, ficamos amigos.

Mas quando o filme ficou pronto, ficou uma fera, eu me saia melhor que ele nas cenas juntos.

Não gostou muito, depois cada vez que me chamava para fazer um filme, tentava me vetar.

Era o dos como dizia meu pai, não sabia andar a cavalo, tampouco andar na rua, como andaria um machão.

Eu a cada filme, ia engordando meu dinheiro, como acabei a universidade, me mudei para um apartamento melhor, um sala quarto, com uma varanda, da qual de longe via o mar, mas alugado, ainda nem pensava em comprar.

O diretor do primeiro filme, me chamou para fazer um casting, era um filme que seria rodado em NYC, faria um capo da máfia irlandesa, o teste seria lá.

Me informei, aonde viviam essa gente, cheguei dias antes, fui até lá, andei observando, me sentava num pub, ficava olhando o comportamento deles, como andavam, se armando todo para dizer, sou macho.

Um desse me encarou, perguntou se eu era irlandês, que aquele lugar era deles, eu disse que sim, fazendo o mesmo que ele fazia, o tinha observado durante dias, era o tipo estereotipado de gangster, ficou me olhando, quando sai do bar, ia pegar o jeep que tinha alugado, ele entrou do meu lado.

Estava me imitando, lhe expliquei que estava estudando o comportamento deles, para fazer um casting para um filme.

Se interessou no momento, me levou para outro lugar, falava sem parar, eu ia bebendo essa maneira dele, acabamos na cama, foi fantástico, pela primeira vez, eu encontrava alguém como eu, que gostava de explorar o outro.

Me passou seu telefone, só o voltei a ver no dia da estreia, que apareceu com a namorada, teve a coragem de dizer para ela, que tinha me inspirado nele.

Fiz o casting, consegui o papel, depois discuti o dinheiro, não tinha nenhum agente, o diretor me conseguiu um.

Mas ganhava como o ator principal, isso me bastava, nunca comentei com o mesmo sobre isso.

Arrumei um pequeno apartamento em NYC, para ficar esse tempo, o meu agente logo me mandava roteiros de outros filmes, eu que tinha estudado para ser diretor, pensei, pelo menos assim vou pegando prática, entendendo a cabeça dessa gente.

Fui emendando um filme atrás do outro, sempre estudava os tipos que me ofereciam, nunca era o ator principal, nem me interessava, mas sempre ganhava bem.

Um dia ele apareceu numa filmagem que fazia em Long Island, fazia o papel de um italiano, era uma comédia, um sujeito que se mete com a máfia sem saber.

Me saia bem no papel de mafioso, que persegue o rapaz.

Me apresentou um diretor de cinema francês, eu tinha visto um filme dele, em DVD, comentei com ele, que tinha gostado.

Conhece meus filmes?

Não todos, esse eu vi, porque me interessava, falei o nome do ator, gosto como ele trabalha, era um ator antigo, que não fazia o papel principal.

Sim é um monstro sagrado lá, no dia seguinte o meu agente, me trouxe uma serie de filmes do sujeito.

Vi todos pela noite, já tinha terminado a minha parte no filme.

Ia como sempre anotando coisas do mesmo, observando as nuances que ele dava a história, uma por exemplo o papel do secundário pelo livro, pois fui atrás dele, era pequeno, mas o tinha transformado, como no que conta a história.

Me convidaram para almoçar, ele achou graça de que eu chegasse com um bloco, mal começamos a conversar, comentei o que tinha achado do filme, fui analisando o papel do coadjuvante, o principal não me interessava, pois para mim, ele era quem contava a história.

Me passou um roteiro, perguntou se eu podia ir a Paris, para fazer um casting.

Vou ler, mas terei que tirar inclusive um passaporte, nunca sai do pais, além não falar francês, só sei o que aprendi na universidade, bem como nos filmes que vejo.

Repeti um texto de um filme de Jean Gabin, que tinha visto mil vezes, que ele dava um banho de interpretação, na minha cabeça.

Ele se matou de rir, pois eu conseguia falar como ele.

Li o roteiro, era a história de um americano, que vai de férias, visitar parentes que não conhece, os mesmos são a máfia de Marseille, ele nem tem ideia de aonde se meteu.

Mas é um tipo sério, leva tudo na ponta da faca, quanto o tentam matar, ou inculpar da morte de alguém, ele se defende.

Imaginei o Jean Gabin fazendo esse papel, teria a cara imutável, me disse que a cena que teria que fazer como era, o dito cujo descobrindo que a família era mafiosa, mas não podia fazer cara de surpresa.

Fui para Paris, foi impressionante, nesse ponto era um caipira, só tinha atravessado de Los Angeles a NYC, além de conhecer o roteiro que tinha feito antes, quando tinha ido embora de casa.

No avião ainda pensei, pelo menos ninguém veio atrás de mim, sabia que meu irmão, nem minha mãe iam ao cinema, tampouco sabia que meus filmes passariam lá, pois só passavam filmes antigos de cowboy.

Fiz o casting, deixei meu agente discutindo o valor do contrato.

Me convidaram para almoçar num lugar chic, eu ri a bessa, me ofereceram escargot, eu nunca tinha comido, não sabia o que fazer, mas não tinha vergonha de reconhecer, o fiz rindo, como se come essa merda, foi o que soltei.

Uma atriz que estava junto, soltou esse pelo menos não finge que é fino.

Era a mulher do diretor, disse que a tinham feito ver uma cena que tinha feito, num filme, mil vezes, que minha cara diante do perigo era imutável, como se fosse a coisa mais normal do mundo, por isso ele te quer.

Depois fomos para Marseille, lá seria rodado o filme, amei, pois nos hospedamos numa praia perto.

Era diferente de Los Angeles, de NYC, eu reclamava era disto, não tinha praia.

Se matavam de rir, de me ver nadando como um louco, tanto que no filme ele colocou uma cena que eu fazia isso, tinha que chegar cedo para a filmagem, pois tinha que me colocar no corpo uma série de tatuagens que eu não tinha.  Nas cena da água foi complicado, pois saiam, até encontrarem uma maneira de na cena que saia d’agua, não caíssem as tatuagens

Nos meio da filmagem, apareceu um homem que ficou me observando vários dias, soube que era um amigo do diretor, fazia cinema também.

Um dia cheguei na minha roulote, lá estava ele, me entregou um roteiro, disse que o mesmo estava em francês, se eu sabia ler.

Disse que sim, podia ser que me faltasse alguma coisa, mas tinha um dicionário.

Ah, me falaram que estudaste cinema.

Sim e verdade, mas para ser diretor, não tive oportunidade ainda.

Me convidou para jantar, eu disse que ele escolhesse um lugar simples.

Me levou a um restaurante, achei estranho, pois escutava como uma outra língua.

Me contou que o filme era passado na Córsega, que o tipo era um politico corrupto, que tanto fazia coisas para o governo, como incentivava o povo contra esse mesmo governo.

Só terás que fazer uma coisa, escurecer teus cabelos, usar lentes de contato.

Bom vou ler com carinho, mas me interessa, nunca fiz papel de um político, eu sempre pensei que os mesmo eram como esse personagem.

Me disse a cena que tinha que fazer.   Quem me ajudou foi justamente a mulher do diretor do filme que estava fazendo.

Corrigia minha dicção.

No dia do casting, me colocaram uma peruca escura, bem como coloquei as lentes, não estava acostumado.

Mas fiz a cena como tinha ensaiado com ela, fazendo o texto.

No final, ela fez um sinal que tinha feito bem.

O diretor me pediu se podia fazer de novo, me deu o mesmo texto, agora cheio de palavrões, rapidamente decorei os mesmo.

Ele se matava de rir, pois eu exagerava um pouco ao falar os mesmos, disse que gostava assim, ninguém fala esses palavrões sem exagerar.

Fiz meu agente vir, veio reclamando, terás que conseguir um agente aqui, pois não posso ficar o tempo todo atravessando o atlântico.

Falei com Sira D’Angel, a mulher do diretor, me disse que se eu quisesse ela podia fazer isso, além de me ajudar a estudar o texto.

Na hora pensei que ela queria alguma coisa de sexo comigo, viu que eu ficava confuso, fui honesto a respeito.

Me disse na surdina que estava se separando do mesmo, não somos casados, tampouco quero outro relacionamento, se trabalho para ti, poderei abrir caminho nisso.

Muitos atores viram depois como ela me defendia, a contrataram também.

Ganhei foi um inimigo, seu ex não gostou muito, nunca mais me chamou para nenhum filme.

Fui com ela para Córsega, ele me arrumou um homem que foi me assinalando quem eram os homens parecidos com meu personagens, o tipo de político nada importante, mas corrupto.

Com um cheguei a cruzar numa festa, falei com o mesmo, o imitando, ele nem desconfiou.

O filme foi complicado de rodar, pois se falava nos problemas de lá.

Muita gente não entendia um ator americano, fazendo o papel de um corrupto da Córsega, eu simplesmente respondia que politico corrupto existe em todos os lugares.

Sira em seguida apareceu durante a filmagem com um diretor italiano, lá fui eu fazer um filme na Itália, trabalhei como um louco para aprender o texto, não queria ser dublado.

Logo voltei para NYC, o mais interessante era que competia como ator coadjuvante nos Oscar, com o último filme que tinha feito, nem me lembrava mais do mesmo.

Foi aquela roda viva.

Voltei para Los Angeles, fui visitar meu velho chefe, ele seguia igual, o pessoal fala muito de ti, dos teus filmes.

Fui a praia com ele, esperavam uma estrela de cinema, deram de cara com o mesmo sujeito de sempre, ele tinha cuidado do meu jeep.

O banco pagava meu aluguel, riram quando comentei isso, um ator que vai pelo mundo, mas vive num simples apartamento alugado.

Eu disse que só precisava de um lugar para estudar roteiros.

Quando vi, já tinha feito uma porrada de filmes, mas não tinha dirigido nenhum, mas agora tinha bagagem, sabia como trabalhavam os americanos, os franceses, italianos, fui fazer um filme na Inglaterra, justamente, faria o papel de um irlandês, o mais interessante era que o diretor era de Dublin, fomos filmar cenas lá, me senti em casa.

Um dia num pub, ele contava ao pessoal que eu tinha estudado para dirigir cinema, mas que não tinha tido oportunidade.

Na minha Roulote, pois as cenas era no meio do nada, apareceu um roteiro, o li de cabo a rabo, vi um nome, perguntei quem era, era um dos assistentes do diretor, o que ia corrigindo os roteiros.

Disse que me interessava.

Fiz uma coisa, telefonei para a Sira, que apareceu no dia seguinte, o pessoal ficava como bobo, pois era uma mulher classuda, ela leu o roteiro inteiro, começou a anotar coisas, atores que podiam fazer os papeis.

Voltamos para Londres, aluguei um apartamento como sempre, simples, aonde podia fazer reuniões como roteirista, começamos a montar o mesmo, ela a levantar a produção.

Faltava dinheiro no final, consultei meu banco, o diretor vivia reclamando que eu pagava imposto demais, pois o tinha aplicado, mas não gastava.

Tai, entrei como um dos produtores, ganharia mais, claro isso se o filme fizesse sucesso.

Era interessante, pois alguns atores, eram americanos, outros franceses, o diretor de fotografia, eu já tinha feito dois filmes com o mesmo.

Então foi fácil, ela se meteu em trabalhar com distribuir o filme, quando ficou pronto, fizemos uma apresentação para conhecidos.

Todos gostaram, ela muito esperta, alugou uma sala, para estudantes, todos tinham que responder perguntas sobre o filme, foi uma boa experiencia.

Fomos para participar de vários certames, começando por Sundance, depois Cannes, que ela conseguiu, outro na Espanha. Enfim, fez sucesso, finalmente estreou nos cinemas americanos.

A maior surpresa, foi selecionado como um filme inglês para os Oscar.

Ganhei como diretor revelação.

Logo em seguida fui procurado por um advogado, mal cheguei a Los Angeles, me disse que tinha herdado as terras todas, minha mãe tinha morrido, meu irmão também numa briga como sempre.

Havia dinheiro no banco, além da própria fazenda.  Tinha que ir até lá.

Fui, cheguei como uma pessoa de sucesso, num jatinho, alugado é claro, pois não ia enfrentar estrada outra vez.

A casa caia de velha, me lembrei aonde ela escondia dinheiro, enchi mais de uma bolsa com isso.

Chamei meu amigo de Dublin, perguntei se ele se arriscava a escrever o roteiro de um filme passado no meio do nada, um filme de cowboy.

Ele veio, contei para ele a história de meu pai, as minhas conversas com ele, as ida ao cinema, para ver filmes de cowboy.

Não coloquei a venda automaticamente o lugar, queria fazer lá, bem como filmar na cidade, o velho cinema ainda existia, embora fechado.

Quando falei com o pessoal da cidade, todos gostaram.

Fomos para Los Angeles, depositei todo o dinheiro no banco, eles se mataram de rir, perguntavam se eu tinha conseguido dinheiro da máfia, eu disse que era quase igual.

Mas abri uma conta, à parte, Sira veio, montamos uma empresa, agora ela era uma mulher respeitada, não só como agente, como produtora.

Eu me sentava todos os dias com meu amigo Brian, para rever o texto que ele ia escrevendo, nisso, aconteceu a festa do Oscar, eu não esperava merda nenhuma, competia com diretores famosos.

Acabei ganhando, ele ganhou de roteiro.

Isso ajudou, sem querer nas entrevistas tinha aquela famosa pergunta, agora, lhes disse que estamos escrevendo o roteiro da vida de meu pai.

A primeira parte, era como eu imaginava do que ele me contava, depois, eram flash dele na guerra do Vietnam, ele voltando, depois minha infância, indo ao cinema com ele.

O duro foi levar todo equipamento para lá, o pessoal da cidade adorou, pois muitos participavam, usávamos o velho cinema.

Aproveitaram para passar todos os filmes que eu tinha feito, a Sira claro usou isso como pretexto para nos permitirem de tudo.

Filmamos uma parte na fazenda, usando inclusive gado dos vizinhos, cavalos, o velho jeep também, foi usado.

O filme acabava comigo escapando para uma nova vida, com o jeep.

Foi o máximo, passou em todos os festivais, que fomos convidados.

Em alguns ganhei prêmios, outros o Brian.

Sem querer, eu que nunca tinha tido um romance, ou um parceiro, um dia nos enrolamos, tinha encontrado o parceiro ideal para o resto da minha vida.

O melhor mesmo, vendi a fazenda, ganhei mais dinheiro, um dia ele me mostrou um roteiro que ele estava escrevendo, um romance entre dois homens do IRA.

Claro sofremos o boicote na Irlanda, mas fez sucesso fora de lá.

Eu fazia o papel do pai de um deles, um sujeito asqueroso, me sai bem.

Era candidato como coadjuvante, aos Oscars, não ganhei, mas nem tinha ido também, estávamos já no meio de outro filme.

Quando vi, a vida tinha passado, estávamos os dois velhos, vivendo em Venice Beach, mas nos querendo da mesma maneira.

Apostávamos quem morreria antes, mas tínhamos um pacto, o outro o seguiria, para não ficar sozinho do outro lado.

Ah o velho jeep segue aqui, pois ainda o usamos, adoro me meter na garagem para sempre dar uma olhada no seu motor.

 

 

 

 

 

 

 

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