T.F.P. PALAVRAS, PALAVRAS
Escutava “Palore, Palore” com Mina, uma
cantora italiana de sua época de jovem, concordava, as palavras hoje em dia era
vazias, quem o visse agora ia pensar que estava louco, pois dançava no meio do
seu estúdio, ao som da música, cantando junto com ela.
Quando olhou pela porta de vidro que dava
para a praia, ali estava seu vizinho, com certeza vinha reclamar da altura da
música.
Abaixou o volume, abriu a porta, este
sorriu, queria saber quem tinha o bom gosto de escutar essa música, estendeu a
mão dizendo Niko Accorsi.
Ele disse o seu André Luiz Figueiredo, que
bom, pensei que ia reclamar.
Mas como faria isso, o melhor foi vê-lo
dançando, ficou rindo, ele estava só de cuecas, como gostava de pintar, com o
corpo cheio de tinta.
Admiro seu trabalho, tenho um quadro seu em
San Francisco.
Qual, fez a pergunta sem querer.
A dos meninos caveiras jogando bola.
Ele começou a rir, esse quadro é imenso, aliás
é um tríptico.
Sim, o comprei em Paris, mandei levar para
lá, esta na entrada do meu escritório.
Nos vemos, foi embora se despedindo. Tchau.
Ele ficou rindo, era um homem bonito, devia
ter a mesma idade dele.
Muita água tinha passado embaixo da ponte
como costumava dizer.
Saber que um quadro seu estava nos Estados
Unidos, lhe dava prazer.
Não gostava de fazer exposições, por aí,
adorava seu canto, tinha demorado muito a ter um, por isso o valorizava ao
máximo. Embora quem visse sua casa, não
podia imaginar que hoje ele tinha dinheiro.
Essa parte debaixo, era um grande espaço
sem nada, em cima ficava o resto. Ali o
antigo proprietário guardava seus barcos, ele não tinha nenhum.
Voltou ao quadro que estava trabalhando,
devia convidar o mesmo para ver todos os desenhos, eram do carnaval de Veneza.
Sem saber porque nessa noite teve o mesmo
pesadelo que o perseguia toda sua vida, o abuso sexual por um padre, na
sacristia da igreja.
De como ele tinha reagido, ali na mesa
tinha um abre cartas, ele conseguiu se virar, enfiar o mesmo na barriga do
padre, além de o retirar, ali ficou jorrando, enfiou em seguida no olho do
mesmo o deixou ali, saiu correndo, vivia perto, quando chegou em casa, cheio de
sangue, sua mãe ficou assustada, lhe contou o que tinha acontecido, ela levou
as mãos a cabeça, era dessas carolas de ir todos os dias na missa, sua família
era parente do bispo de Belo Horizonte, todos da família eram da T.F.P.
Tradição, Família, Propriedade, se protegiam entre si, sob o manto da Igreja
Católica, apostólica Romana.
Seu pai quando escutou, correu para a
Igreja, ainda deu uns bons tabefes no padre, chamou um médico amigo da família,
no dia seguinte o mesmo tinha desaparecido.
Escutou seu pai dizendo que o filho da
puta, ficaria cego para o resto da vida, mas agora esse menino está manchado.
Acabou o ano escolar, foi com eles para o
Rio de Janeiro, toda a família tinha um casarão ali no Cosme Velho, aonde os
maiores da família, iam para estudar.
Cuidariam dele, segundo dizia seu pai, não
o queria na cidade, para que não falassem dele, iria agora quando fosse férias,
natal, coisas assim, para a casa da família em Belo Horizonte.
Foi matriculado numa escola que também
pertencia a igreja, ali já quase Laranjeiras.
Os primos cada um tinha um quarto, a
maioria estava no primeiro ano da universidade que estivessem fazendo, só um
repetia pela milionésima vez o ano, pois vivia na farra.
Segundo escutou um deles falando, só tinha
ido uma aula este ano, o resto estava na farra, a família era rica, podia. Os outros não diziam nada, pois ele nunca
estava em casa mesmo.
Assim não incomodava.
De uma maneira geral, não conseguiu se
entrosar com os primos, pois os mesmos iam sempre a missa, ele tinha jurado que
nunca mais.
Quando tinha que ir, na da escola, se
sentava no ultimo banco da igreja, ficava desenhando.
Um dia um professor o viu, pois ficavam
andando pelo meio da passagem, olhou, mas não disse nada. Depois falou com ele, desenhas muito bem,
devia estudar artes.
Falou com uma professora de uma turma só de
garotas, foi com ele levando seus dois blocos de desenhos que tinha.
Ela o aceitou em sua turma, foi uma bela
confusão, pois ele atravessava o pátio, cheio de garotos jogando futebol, o
porteiro abria o portão que separava as duas partes da escola.
Era o único entre tantas meninas, dali no
futuro, só uma seria alguma coisa, mas isso depois do divórcio.
Quando foi nas férias, memorizou a cara de
todos da família, que se reunião sempre pelo final do ano, mas um era mais
falso que o outro, querendo dizer que tinha mais dinheiro.
As caras as vezes eram grotescas, não se
davam conta.
A conversa com os pais, era o que iria
estudar na universidade, a mãe queria que ele fizesse medicina, o pai, direito,
falta um na família.
Seu irmão mais velho, vivia no Vaticano, ia
ser padre.
Coitado pensava.
Mas na igreja, nunca se sentava junto aos
pais, sim no último banco, nesse ano antes de ir a universidade, o padre, um
homem gordíssimo, falava dos pecados, principalmente o da gula, o desenhou,
sentado como na santa ceia, com um peru imenso na sua frente.
Um dos primos viu, riu a bessa, isso mesmo.
Sua mãe depois, como tinha mania de fuçar
seu quarto viu, ficou horrorizada.
Ele a olhou, lhe disse na cara, não seja
hipócrita, esse homem falando do pecado da gula, quando ele é a viva imagem do
pecado.
Aliás para a senhora saber, eu adoro tudo
que ele diz que é pecado, nem faça essa cara de assustada, pois sei que a
senhora come todos os doces da cozinha, depois vai vomitar, nem toque no
assunto, pois falarei isso na frente de todo mundo.
Chorou, pediu perdão.
Ele não disse uma palavra. Só pensou, malditos mineiros.
Tinha escutado um amigo comentando o que
dizia um escritor, que mineiro só era solidário no câncer.
Acho que nem assim pensou.
Antecipou sua volta ao Rio, com a desculpa
que tinha que estudar para o vestibular, foi conversar com o professor, que sem
querer tinha virado seu conselheiro.
Esse o levou para conversar com um amigo
dele psicólogo, este lhe aplicou um teste.
Este falou que tudo que saia, eram artes,
arquitetura, nada de medicina, ou direito.
Ele se inscreveu para medicina, por causa
da mãe, mas arquitetura.
Um dos primos nas vésperas lhe disse, temos
que relaxar, o arrastaram para Ipanema, para a praia, nesse tempo todo nunca
tinha ido a praia.
Quando se jogou na água, foi como
descarregar de alguma coisa que o incomodava.
Esse primo estava aprendendo fazer surf,
ele se juntou a ele, depois com o tempo, sairia melhor que ele.
Descobriu que um quarto que estava sempre
fechado, ali se guardavam o que ninguém queria.
Foi jogando tudo isso no lixo, na surdina, arrumou
um lugar para estudar, longe dos outros que falavam muito.
Fez as provas se classificou bem, tanto
podia fazer uma como a outra. Comentou
com sua mãe, ela de presente disse, que ele olhasse sua conta no banco.
Tinha depositado uma boa soma, aproveitou,
foi a uma papelaria, comprou uma quantidade de blocos grandes de desenho, com
bom papel, o local estava fazendo uma promoção, iam fechar, comprou tudo que
viu pela frente, lápis de cor, caixas de tinta, teve inclusive que ir de taxi
para casa.
Resolveu fazer arquitetura, pois medicina
não lhe interessava, mas para todos efeitos como nenhum deles fazia medicina, as
duas eram no Fundão, ele se levantava cedo, ia até a Praça XV, de lá outro
ônibus, até a universidade.
Só não gostava de matemática, cálculo de
estrutura, mas as aulas de desenho eram sua paixão.
Os professores o elogiavam.
Um deles, lhe falou do Parque Lage, ias
gostar de estudar lá, podes fazer cursos livres, de noite.
Disse como tinha que ir, foi lá se
informar.
Lhe disseram que trouxesse o que desenhava,
para dois professores verem.
Os dois adoraram seu trabalho, mostrou o do
padre sentado na mesa, devorando um piru, depois desse tinha detalhado o homem,
imenso, com as mãos que mais pareciam as garras de um urubu.
Num outro, tinha o mesmo, com o corpo de um
urubu, comendo carniça, em cima de uma mesa.
Um dos professores riu horrores, penso
igual a ti, falam tanto do pecado da gula, mas são os mais gordos.
O outro que era católico, não gostou muito,
mas elogiou seu desenho.
Começou a fazer aulas com os dois, acabou o
ano na universidade, mas disse que não iria ao Natal em Belo Horizonte, que
tinha arrumado um estagio num escritório.
Sua mãe tinha lhe escrito uma carta, já que ele nunca atendia o
telefone, que se sentiam frustrada, sonhava tanto em ter um filho médico, mas
nem respondeu.
Agora sabia que tinha que ter cuidado com
seus primos, aproveitou que todos estavam fora, mandou trocar a fechadura do
quarto que usava para desenhar, pintar, já se atrevia a isso.
Participou sim de uma exposição coletiva
numa galeria do governo, o professor disse que escolhesse ele mesmo dois
desenhos.
Ele perguntou se tinha limite de tamanho,
quando o outro disse que não, ele fez um imenso da santa ceia, com o puto padre
gordo no meio. A outra era de um mendigo
que estava sempre na porta da igreja, ali perto, dormia inclusive ali.
Via sempre os padres o expulsando na hora
da missa, um era na vertical, o outro na horizontal.
Levou para colocar num painel, o homem que
fez esse trabalho, elogiou, disse que eram esplendidos.
O duro, foi tirar os mesmo de casa, para o
local da exposição. Teve que contratar uma empresa de mudanças, cobriu os
mesmos com lençóis para sair de casa.
Quando o professor que montava a exposição
viu, ficou as gargalhadas, sempre espero muito de ti, mas são sensacionais.
Colocou os dois sozinhos numa única sala.
Ele ganhou o primeiro lugar, pelos
críticos, além de um dinheiro, colocou imediatamente, numa conta, nova em outro
banco.
No dia da entrega do prêmio, viu o
professor ao lado de um homem alto, com os cabelos brancos, o apresentou como o
dono da Petit Galerie, em Ipanema.
Esse disse como os quadros ali não se
vendiam, se permitia que esse os levasse para sua galeria.
Sorriu, dizendo só se ele pagasse o
transporte.
Quando acabou a exposição, o tinham
fotografado em frente ao quadro, que era o padre expulsando o mendigo, saiu
numa revista de arte, falando do novo grande descobrimento da pintura
brasileira.
Ele comprou outra, mandou para sua mãe, que
veio ao Rio, fez o maior escândalo, se ele não deixasse isso, o deserdaria.
Olhou para a cara dela, disse, a senhora me
deserdou no dia, que defendeu o padre que abusou de mim, enquanto ela falava
ele a desenhou.
Com a cara toda torcida de ódio, é assim
que a senhora aplica a caridade.
Ela só faltou ter um enfarte, mandarei essa
para colocarem na sala de jantar da família.
Só para a senhora ver como os imagino,
mostrou todos os desenhos que tinha feito do último natal.
Ela abriu a boca, pois ia identificando
cada membro da família. No final suspirou, se teu pai vê isso, vai ter um
enfarte.
Azar o dele, para não ser tão falso.
Os dois quadros se venderam rapidamente, um
para um colecionista francês.
Com o dinheiro alugou um apartamento
pequeno na Men de Sá, quando chegou o dinheiro do mês, com uma carta, com um
aviso, se ele seguia igual, deixavam de mandar dinheiro para ele.
No dia seguinte se mudou da casa do Cosme
velho, levou tudo que era seu do quarto que usava.
Nem voltou mais as aulas de
arquitetura. Só seu primo o ovelha
negra sabia, o tinha aplaudido.
Fez sua primeira individual, numa sala, era
o natal da família, um díptico imenso, depois de ambos os lados, dois quadros,
de mendigos na rua, buscando comida no lixo, eram dez quadros, o catalogo era
bom, foi quando conheceu o homem que durante um tempo seria seu
companheiro. Veio desde Paris, para a
inauguração.
Não se caíram bem desde o primeiro momento,
discutiram, mas ele comprou o quadro da família para sua coleção.
A única coisa que disse, estás perdendo teu
tempo aqui, vá para Paris, posso te apresentar a muita gente.
Ele guardou todo o dinheiro ganho, no
banco, em sua conta. Mandou o catalogo
para todos da família.
Seu primo, se matou de rir, contou como
tinha sido, eu fui entregando na mesa a cada um, ficaram, horrorizado, quase me
mataram, quando eu disse que os via exatamente assim.
Teu pai, colocou a mão em cima do coração,
fingindo uma enfarte, se mandou.
Nunca mais tinha olhado a conta no banco
aonde sua mãe mandava dinheiro.
Eles vieram ao Rio, foi quando descobriram
que ele não vivia mais lá, seu pai não via a tempo, encontrou um homem mais
alto que ele, com cabelos imensos, magro, com uma cara bonita como sempre tinha
tido.
Para falar com ele, tinha que olhar para
cima, com o dedo e riste, disse que ele tinha que parar com isso, aonde já se
viu falar mal da igreja, da família, se esquecia que eles o sustentavam.
Se o senhor for ao banco, verá que desde
que deixei de estudar arquitetura, nunca mais usei nenhum tostão seu, está tudo
lá, não preciso de vocês.
Aliás, aproveito a visita de vocês, vou
embora daqui, tenho um convite para expor em Paris, abriu a porta, adeus,
meta-se em tua vida, mãe a senhora, conhece a outra família do velho, tem duas
filhas com outra mulher. Disse o nome dela, se fosse a senhora o mandava a
merda, pois sem o teu dinheiro ele não é nada.
Ele ia fingir um enfarte, riu, dizendo,
comigo não cola, se vai ter um enfarte, o tenha na rua, para não sujar a porta
da minha casa.
Fechou na costas deles, a viu reclamando,
mas levaria muitos anos para decidir se separar dele, pois o que ia pensar a
sua família.
Ele telefonou para o homem que o tinha
convidado, com o dinheiro que tinha economizado, o da galeria, ainda veio ver o
trabalho que estava fazendo, levou tudo para a galeria, lhe pagou muito por
tudo, lhe disse não se esqueça de mim.
Boa sorte meu filho, brilhe lá fora.
Lá foi ele para Paris, Luc Saint-Andrés, o
foi buscar no aeroporto, sua bagagem era inexistente, uma bolsa com um pouco de
roupa. Mas a quantidade de blocos
grandes de desenho era grande.
Tinha tido sorte no embarque o rapaz, disse
que tinha visto sua exposição, seu trabalho é genial, retrata bem a hipocrisia
brasileira.
Não cobrou nada pelo excesso.
Ele tinha um contato, Luc Saint-André, o
levou para seu apartamento as margens do Sena, imenso, com muito luxo. Olhou tudo, sabia que ali não podia viver.
No dia seguinte se levantou muito cedo, foi
a uma imobiliária que tinha visto, disse o que procurava, a senhora olhou para
ele, tens cara de artista.
Venha comigo, o arrastou com ela, até
Marais, na época um lugar ainda cheio de drogados, mas ela era proprietária de
um apartamento imenso, no último andar, não tinha elevador, mas eres jovem,
podes subir sempre.
Disse o preço do aluguel, ele lhe pagou
três meses.
Foi ao do Luc, este tinha acabado de se
levantar, disse que tinha encontrado um lugar para trabalhar.
Ele ficou com a boca aberta, soltou pensei
que tinhas entendido, estou apaixonado por ti.
Vá com calma, nem pense que eu vim para cá
por tua causa.
Se viu contando para ele, tinha visto um
Militar, expulsando um mendigo, ali da igreja dos militares na primeiro de
Março, era o mesmo chutando o mendigo.
Saiu nos jornais, o ameaçaram, por isso
tinha se mandado.
Mas o quadro tinha sido vendido, descobriu
depois que para justamente o Luc.
Podes ser meu amigo, já veremos.
Esse meteu o rabo entre as pernas, foi com
ele olhar o apartamento, riu da dificuldade dele subir a escada, deves fazer
mais exercícios.
Só comprou uma cama, o resto já se veria,
foi ele mesmo levando seus dois catálogos as galerias, um deles com uma imensa,
riu, dizendo que ele tinha colocado as molduras no seus quadros comprados pelo
Luc, achei demais.
Quando queres fazer uma exposição?
Primeiro quero que olhes meus desenhos.
Tinha recebido um cartão postal do irmão em
Roma, dizendo que o fosse visitar.
Era como uma procissão de padres, cardeais,
estava trabalhando em cima disso.
Paul Ventresi, quando viu os desenhos, ia
separando o que queria, foram montando através do desenhos uma lógica, depois o
levou a um lugar que vendia material de pintura, ficaram de mandar para seu
studio, ele avisou das escadas, mande um jovem entregar.
Depois o arrastou a escola de Belas artes,
foi apresentando aos professores, dois deles conheciam o catalogo dele.
Dali foram almoçar todos com eles, falando
de arte, ele pediu que falassem devagar, falo, entendo francês, mas vocês falam
rápido demais.
Esses encontros duraram para sempre, o Luc,
ia as vezes, reclamava depois que se sentia a margem, tinha ciúmes.
Fez um jantar em sua casa, para o
apresentar aos seus amigos, tinha lhe mandado um smoking, ele foi de camiseta,
calças jeans, um tênis velho que tinha.
Soltou todo seu cabelo, esse pensa que vai me comprar.
Se surpreenderam que ele nunca bebesse, a
noite inteira com um copo de água nas mãos.
Luc lhe chamou atenção, pois na entrada,
tinha entregado ao empregado a roupa que ele tinha mandado.
Eu não sou francês, tampouco tenho donos,
se me queres assim, bem, senão, nada feito.
Ficaram depois que os amigos foram embora, ficou
olhando para ele, sei o que queres, o arrastou para a cama. Só não tinha pensado que iria gostar de fazer
sexo com ele.
Luc ficou como louco, aquele homem imenso,
com um corpo impressionante, fudendo com ele.
Assim começou o relacionamento dos dois,
nunca mais foi a nenhuma festa na casa dele, odiava.
Ameaçou o Luc, de fazer um quadro
retratando os amigos, a maioria ele tinha negócios, riu muito, me matariam.
Só fez um, do Luc, ele nu deitado como se
estivesse numa festa romana.
Os amigos pediram quadros, arrumou a
desculpa que estava preparando sua primeira exposição.
Além do padres e cardeais, na praça, a
partir do cartão do irmão, era um díptico imenso, fez uns quantos, que eram as
procissões de semana santa de sua cidade.
Tinha duas versões, uma eram as pessoas, as
mulheres todas de negro, algumas pessoas nas janelas, do outro lado, ficou um
quadro, que era quase igual, mas era como ele via essas pessoas, as que estavam
nas janelas, como putas, aonde os maridos depois iam.
O padre na frente, era como se fosse a
cabeça de um urubu, depois a crítica diria que ele tinha colocado um Anúbis na
frente da procissão.
No andor, um eram querubins, no outro, eram
garotos nus, brancos, negros, todas as raças do brasil, tudo isso saiu no
jornal de cultura, o cardeal de Paris, foi reclamar, não sabia que ele estava
na galeria, chegou dando a mão para o Paul beijar, esse fez uma inclinação,
afinal era descendente de Italianos, ele de longe memorizou a cara do mesmo,
quando Paul o apresentou estendeu a mão.
Ele perguntou se era para mostrar as unhas pintadas, eu sei lá aonde o
senhor andou enfiando essa mão suja, ficou segurando a mão do mesmo, Paul olhe
que unhas sujas, o senhor está podre e não sabe.
A cara do Cardeal era impressionante, pediu
que retirassem os quadros da galeria.
Paul disse que já estavam vendidos, mas se
negou dizer a quem.
Se o senhor tem culhão, venha daqui três
dias, terei um quadro seu aqui.
Ele fez um cara de nojo.
Três dias depois chegou com uns homens que
sempre levariam seu trabalho, o colocou na vitrine da frente da galeria, chamou
o Paul para ver, ele se dobrava de rir.
Tirou uma foto, mandou para o cardeal,
através de um serviço de entrega.
Chamou ao mesmo tempo um jornalista amigo
dele, contaram a história, o quadro no dia seguinte estava nos jornais.
Mandou o catalogo para o irmão, que o
convidou para ir a Roma num final de semana, que estava livre.
Não o via a tanto tempo, que era como
encontrar com um desconhecido. Agradeceu
o convite, mas era mais fácil vir ele.
O irmão quando o viu, era tão alto como
ele, andei sabendo de suas estrepolias, mas adoro.
Em Roma ias conseguir muita inspiração.
Odeio tudo aquilo, mas me enfiaram tão
dentro da cabeça, que está difícil.
Quando foram almoçar, o irmão se mexeu de
tal maneira, que ele viu as cicatrizes no seu pulso.
Acabaram de almoçar o arrastou para seu
studio.
Se sentou com ele, conversaram
abertamente. Porque não mandas tudo a
merda.
Não sei fazer nada, a não ser balançar a
cabeça.
Tudo que estudaste deve servir para alguma
coisa, no jantar falou com o Luc, esse no dia seguinte arrastou o João para a
Sorbonne aonde ele conhecia muitas pessoas, acabou que João não voltou mais
para Roma, largou tudo, ficou lá com ele.
Foi quando ele fazia sua segunda exposição,
o quadro do Cardeal, com as mãos estendidas, que pareciam garras, as unhas
sujas, a cara de antipático,
Ele tinha feito uma coisa, disse que seria
a última que faria sobre esse tema.
Andou por todas as igrejas, foi a Lourdes,
depois foi a Saint-Marie de La Mer, para a festa dos ciganos, com sua virgem. Era educado, pedia antes se podia desenhar
as pessoas, falava com elas, as escutava perfeitamente.
Tinha dois quadros que ficaram famosos, um
era uma garota em adoração com a virgem, a tinha encontrado na igreja rezando.
Era totalmente diferente do resto, outro
era um senhor cego, ao qual o neto, ia contando da procissão que passava.
A do final era o garoto, em cima de um
cavalo branco, ali da marisma, vestido de São Jorge, o dragão tinha a cara do
Cardeal.
Não sobrou nenhum quadro, o melhor foi que
seus pais apareceram, com a ideia de colocarem seu irmão, de volta para Roma.
Encontraram dois filhos diferentes, o de
Roma agora usava cabelos compridos, vivia já com o homem que seria seu
companheiro toda a vida, um professor da Sorbonne.
Os pais quando chegaram a galeria, lotada
de pessoas, foram olhando os quadros, um homem ao lado começou a falar com ele,
esse garoto é um gênio, consegue retratar realmente as pessoas como são, esse
filho da puta do cardeal, é pédofilo, a igreja o esconde.
Luc, os arrastou depois para uma festa em
sua casa, disse que eu me negava a viver lá.
No dia seguinte, sua mãe se sentou com os
dois, disse que ia se separar do pai, deles, entendi o que vocês encontraram
aqui, um caminho para a vida de vocês, creio que tenho direito de recomeçar a
minha, esse filho da puta, está roubando dinheiro da fazenda, para sustentar a
outra família.
Voltou para o Brasil, seu pai acabou preso,
pois ela denunciou o roubo que vinha fazendo, bem como dos irmãos dela.
Que família disseram os dois.
Fazia sexo com Luc, as vezes dormia lá com
ele, que sempre reclamava, que nunca saia com ele, só o convidava para ir a
exposições, ou ir algum museu que ele patrocinava, como todos os ricos, mas
viver com ele jamais.
Com o dinheiro que tinha podia trabalhar
tranquilo, nessa época Luc o convidou para ir ao Senegal, tinha negócios
lá. Foi, riu era um avião normal, mas
tinha primeira classe, só separada por uma cortina, mas os bancos era iguais,
na sua cabeça parecia uma coisa idiota, nem a comida era diferente, pagar mais
para dizer que estava na primeira classe.
Quando chegaram se hospedaram num hotel
cinco estrelas, no dia seguinte entrou numa agencia, se informou quanto custava
um guia com carro, para ir para o interior.
Tinha levado material para trabalhar, mas
comprou mais numa loja, o rapaz que o ia levar, disse que se queria o favor nas
aldeias, levasse, canetas bic, lápis, cadernos, encheram a traseira do carro.
Deixou um bilhete para o Luc, pois sabia
que se falasse o que ia fazer, iria protestar.
Levou uns vinte dias viajando, em nenhum
lugar chamou o Luc, o tal quadro dos garotos jogando bola, ele ficou horas
desenhando, os meninos jogavam bola com uma feita de pano velhos, quis comprar
uma bola para os garotos, mas o guia disse que ele ia provocar uma briga entre
os meninos, todos iam querer ser donos da bola, pague no final da partida um
refrigerante para eles.
A maioria dos homens de mais idade, estavam
sempre sentados embaixo de alguma árvore, as mulheres trabalhando, sempre dava
dinheiro para elas, que o rapaz trocava para ele, ia cuidando dele a viagem
inteira.
O tempo estava bom, aproveitavam para
acampar no meio do nada, tinha arrumado um saco para dormir.
Num lugar com uma plantação de mangueiras,
viu os garotos chupando mangas verdes, o outro lhe explicou, que essa garotada
estava sempre com fome, então comiam verde mesmo, claro depois tinha dor de
barriga, mas matavam a fome.
Comentou que não via gente jovem nas vilas,
o outro lhe explicou que iam para as cidades grandes trabalhar, só voltavam na
época da colheita para ajudar.
Quando voltaram a Dakar, soube que o Luc
tinha ido embora, riu, imaginando a cena, não se incomodou muito, foi para a
Ilha de Gorée, o rapaz foi com ele, ria muito com o jeito dele lidar com as
pessoas, ficaram dois dias por lá.
Conversando com o rapaz no meio da viagem,
esse disse que sonhavam em ir para Paris trabalhar, tinha feito universidade,
mas que ali, não tinha emprego.
Falou com o namorado de seu irmão João,
esse disse que trouxesse o rapaz, ainda ficou dois dias a mais, esperando ele
conseguir um passaporte.
O levou com ele, os dois de turística, que
era mais barato, contou para o mesmo sobre a primeira classe, riram muito,
seria seu amigo o resto de sua vida.
Jean Abdul, ria muito, os pais tinham lhe
colocado um nome francês, mas o sobrenome era árabe, pois eram mulçumanos.
Seu irmão João e o namorado, o foram buscar
no aeroporto, como sempre sua bagagem era blocos de desenho.
Jean foi ficar na casa deles, o iam ajudar
a fazer uma pós-graduação na Sorbonne.
Luc quando soube que ele tinha voltado
apareceu no estúdio, fez o maior escândalo, pois o tinha deixado a ver navios,
mas acabou tendo que se controlar, pois apareceu o Paul, para ver os desenhos,
amou um, adoraria ver esse na vitrine da galeria, para ver como funciona.
Foi o primeiro que fez, era de um garoto
chupando manga, de um lado a cara era do garoto, ele agora era mais
perfeccionista, era perfeita, na outra, tinha estudado desde que tinha chegado,
comprou um livro numa loja que vendia livros de medicina, como era os ossos da
cara de um esqueleto, era o próprio.
O quadro todo era em tons sépia de fundo,
mas o desenho era em branco e negro.
Durou dois dias na vitrine, entendeu que ia
pelo caminho certo, se fechou na estúdio, dias e dias, só saia para comer, só
deixava o Jean, bem como seu irmão entrar.
Luc andava furioso com ele, pois estava
cada vez mais arredio, poucas vezes estavam juntos, um dia fez a besteira de
dizer na frente de seus amigos, da École de Beaux Arts, que era assim que ele
agradecia o fato de o ter trazido do Brasil.
Lhe perguntou na frente de todo mundo, se tinha
sido ele que pagou o bilhete de avião, que se ele mantinha seu estúdio, pagava
seus gastos, suas tintas, só me ajudaste numa coisa, compraste quadros meus,
para tua coleção, nada mais. De resto
não de devo nada, aliás se fosse a puta como descreves, devia cobrar mais, pois
adoras chupar meu cacete, bem como sentar-se em cima.
A cara do Luc, foi ficando vermelha,
enquanto os outros o olhava assustados, nunca o tinha visto perder a calma.
Depois que o Luc foi embora, explicou, ele
pensou que eu ia morar no apartamento chic dele, frequentar as festas de seus
amigos ricos, nem pensar, prezo demais minha liberdade.
Soube depois que ele tinha ido falar com o
João, mas esse tirou o corpo fora, foi quando conheceu o Jean, pior foi que
pensou que o tinha trazido com ele, por ter feito sexo com aquele negro lindo,
na sua viagem pelo Senegal.
Jean ficou uma fera, ele nunca tinha sequer
pensado no assunto, soltou na cara dele, vejo bem que não conheces o André, ele
trabalhou como um louco em todos os lugares que estivemos, conversar, sim,
fizemos muito, mas ele é um homem sério, pensei que sabias disso.
Jean, acabaria casando com uma colega de
universidade, uma mulher loira de olhos azuis, ele seria depois padrinho de seu
primeiro filho.
Quando depois de quase um ano trabalhando,
tinha pronto os quadros sobre a viagem, foi feita a exposição, mas Paul, agora
era como seu representante, conseguiu o seguinte, expunha cinquenta por cento
do trabalhos, mas separava a outra metade, para uma exposição na galeria de um
conhecido dele em Berlin.
Com o dinheiro, ficou pensando em comprar
seu estúdio em Paris, negociou com a senhora, mas ela lhe contou a história do
mesmo, se um dia pensar em vender, será teu.
Nesse apartamento tinha vivido toda sua
família, quando começou a segunda guerra, a família desapareceu num campo de
concentração, só sobrou meu pai, que os seus, esconderam num colégio católico.
Levou anos para recuperar a casa familiar,
mas no final não aguentava subir os quatro andares, por isso te alugo, ele era
pintor também, mas morreu jovem.
O namorado do João, os convidou para ir
para o sul, no verão, durante as férias, foram para Montpellier, precisamente
para uma casa alugada numa vila, Le Grau-du-Roi, pertencia a Aigues-Mortes, ia
a praia com os outros, mas gostava mesmo era de ficar desenhando os pescadores
no porto.
Faziam passeios, foram a muitos lugares,
num deles encontrou o que seria seu paraíso, Martigues, uma praia pequena a
casa estava no final, havia outras pequenas antigas perto, tinha uma vantagem,
era ao lado de Marseille, aonde ele podia pegar o trem para Paris.
Quando a comprou, arrumou toda a parte de
baixo para ser seu estúdio, acabou o que estava fazendo, ainda sobre o Senegal,
pensando aonde iria agora.
Conversando um dia com Jean e a namorada,
ela tinha vivido muito tempo em Goa, a família era uma mistura de raças, embora
fosse loira.
Conversou com eles, se prepararam, ela foi
como a guia deles.
Fez sua última exposição sobre o que tinha
visto, havia muitos quadros de crianças, ele mesmo adorava um, que resolveu não
vender, era de um garoto pequeno que queria jogar bola com os outros, estava
vestido com uma camiseta toda esburacada, com o nariz escorrendo meleka, com os
olhos brilhando acompanhando os outros com o olhar.
Foi para a exposição, mas já com a marca de
vendido, o fotografaram diante do quadro, ele disse que essas crianças, era
agradecidas, que qualquer coisa era muito para elas.
Fico imaginando o futuro, será que esse
menino será um grande jogador de futebol.
Ele tinha dado dinheiro aos outros meninos,
para o deixar jogar, o sorriso da cara do garoto, estava em sua cabeça.
Viajaram os três, antes de ir, foi
conversar com Luc, que já queria outra vez patrocinar a viagem, para ir junto,
pensou que eles iram para Bombaim ou outro lugar.
Andaram a ilha de Goa inteira, usava um
macacão que tinha comprado, na verdade tinha comprado dois, era toda sua roupa,
mas quando chegou lá passou a andar como os nativos, com um pano em volta da
cintura, a namorada do Jean, perguntava porque ele não fazia fotos, era mais
fácil.
Lhe respondeu, que talvez quando fosse
velho, se é que chegava a isso, talvez, mas ele adorava esse momento, sentar-se
em algum lugar, desenhar, conversar ou tentar entender a pessoa em frente dele.
Ficaram todo um mês por lá, foram passar
uns dias num lugar que ela conhecia o proprietário, dono de uma plantação, de
chá, desenhou as mulheres ali, colhendo folhas, algumas desenhou de perto,
outras todas no meio daquela floresta de árvores baixas, que eram a plantação,
era como um jogo de garotas, agora apareço, depois desapareço.
Depois passou dias aonde faziam todo o
processamento de tostar o chá, as mulheres trabalhando como loucas,
Depois foi a casa delas, numa aldeia perto,
enquanto o senhor vivia numa bela casa, no alto da montanha, esse pessoal vivia
embaixo, ao lado de um rio todo sujo.
Apesar de pobres suas roupas eram
coloridas, sempre ofereciam um chá, para todos que apareciam.
Ele desenhou as crianças, como sempre que o
fascinavam, bem como as pessoas de mais idades. Era seus dois polos, crianças e
velhos, os jovens pareciam desaparecer das aldeias, era o mesmo problema, iam
para cidades maiores para trabalhar em alguma coisa, ganhar mais dinheiro que
ali.
Tinha aprendido nunca a fazer comentários
políticos sobre isso.
Quando voltaram, ele só ficou alguns dias
em Paris, conversou muito com o Paul, lhe disse que por causa das roupas,
demoraria mais tempo para fazer outra exposição, mas iria trabalhar em sua casa
em Martigues, não ficaria em Paris.
Paul fez uma coisa, foi ao estúdio, separou
quadros que tinham ficado por lá, tinha a chave ia levando para a galeria,
sempre tinha alguma coisa sua exposta.
Lhe falou do Luc, que tinha agora um
namorado, que poderia ser seu filho, que vivia com ele, a pouco tempo foram
parados pela polícia, estavam os dois drogados, ninguém sabe de aonde saiu o
rapaz, acham que o mesmo, é de algum pais de leste, vive com ele, mas não
trabalha.
Pensou em ir falar com o Luc, um dia vinha
de encomendar material para mandar para Martigues, quando encontrou um irmão
dele, foram tomar um café, enquanto tu, nunca quiseste viver a sombra do meu
irmão, esse rapaz, o está levando a ruina.
Ele não escuta ninguém, tentamos todos
falar com ele, mas inútil.
Entre os irmãos, o tiramos da empresa, pois
aparecia drogado para trabalhar, se o outro lhe chama no meio de uma reunião,
vai embora.
Meu outro irmão assumiu a empresa, pois
entre todos pensamos que era melhor.
Ficou com pena do Luc, ele adorava seu
trabalho, tinha feito a empresa ser internacional, agora tudo por causa de um
piru como ele dizia, perderia tudo.
Tomou coragem, telefonou para ele, marcaram
de se encontrar.
Ele apareceu com o rapaz, este estava meio
alcoolizado, ficou com pena, jovem mas claro se via que tinha vindo da miséria,
por como segurava o garfo para comer, a ânsia que tinha.
Falou com o Luc na frente dele, mas este o
olhou, me deixaste, nunca me quiseste como eu a ti.
É verdade Luc, sempre gostei de ti, mas
deixar meu trabalho por ti, jamais, vives um conto de fadas, mas a realidade, o
buraco é mais embaixo.
Estás perdendo tudo, pense bem no que vais
fazer.
Este perguntou se ele ia ficar em Paris,
não tinha contado da casa para ele, disse que precisava se concentrar, tenho um
trabalho complicado pela frente, irei para o Sul, preciso de sol.
Viu que tinha falado com uma parede, Luc
ainda lhe disse, que se ele estalasse os dedos iria com ele.
Mas sabia que a coisa já estava perdida.
Se concentrou no seu trabalho, tinha
comprado pedaços de tecidos, pelos desenhos intricados das roupas que as
pessoas usavam.
Adorava um desenho de um senhor com a parte
de cima de um terno, mas na parte debaixo o mesmo usava um pano na
cintura. Ele tinha trazido todos que
tinha comprado e usado.
Ou pintava usando uma cueca velha, ou com
um pano em volta da cintura.
No final do dia, ia para a praia ali
embaixo, fora da temporada não tinha muita gente, se jogava na água, era como
recarregar bateria.
Foi quando apareceu o Nico Accorsi, o tinha
visto uma vez no restaurante que ia sempre, estava com outras pessoas, o
cumprimentou de longe, este o convidou para sentar-se com eles, agradeceu, mas
estou pensando num quadro que estou fazendo, preciso de espaço.
Depois o tinha visto um dia no cais do
outro lado da vila, numa feira que tinha uma vez por semana, ele tinha ido
comprar frutas.
Ficaram conversando, perguntou o que ele
estava fazendo longe dos Estados Unidos, foi quando Nico disse que era
escritor, estou aproveitando para me curar de uma desilusão.
Na terceira vez, foi outra vez no
restaurante, desta vez estava sozinho, foi quando contou que tinha vivido muito
tempo com um professor da universidade de Los Angeles, que o mesmo, com a
história de não ter vivido sua juventude, o tinha trocado por um homem muito
mais jovem.
Ele riu, o outro perguntou por que estava
rindo.
Pois eu não ia perder um homem como tu, por
um mais jovem.
Nico era extremamente masculino, como ele
gostava, nesse dia voltaram conversando para casa, ele o convidou para conhecer
sua casa, entrou, só saiu no dia seguinte, depois de saciar a fome que tinha um
do outro.
A partir desse dia, ou dormia na casa dele,
ou vice-versa, iam devagar se conhecendo, ao contrário do Luc, tinham muito que
conversar, leu os livros que ele tinha escrito, traduzidos para o Francês, era
o único que via o que estava pintando, as vezes ficava escrevendo no fundo do
estúdio, enquanto ele trabalhava.
Havia uma sintonia entre eles, mesmo na
cama, era uma coisa completa, não como nos últimos anos com o Luc, que ele
queria só uma coisa, talvez agora esse jovem lhe desse isso.
Um dia Paul o chamou de Paris, Luc estava
preso, tinham provocado um acidente, a família tinha pago a fiança dele, mas
quem conduzia o carro era o rapaz, dele não pagaram.
Tornou a chamar dias depois, Luc tinha sido
encontrado morto em seu apartamento, aparentemente era um suicídio, mas tinham
roubado coisas, o rapaz pertencia a um grupo, como estava preso, alguém entrou
no apartamento, tinha roubado muitas coisas.
Telefonou para o irmão do Luc, soube quando
era o enterro, o velório seria em Paris, mas depois levariam o corpo para
enterrar na cidade de origem da família.
Ele foi com Nico, não vou te deixar sozinho
nisso.
Em Paris, Nico conheceu seu irmão João, o Jean,
foram todos ao velório, lá o irmão do Luc o convidou para ir ao enterro na vila
na Bretanha.
Sabia que Luc comprava muitos quadros, mas
nem todos estavam no seu apartamento.
Seu irmão falou que estavam todos num
armazém, aonde ele guardava tudo.
Terás que ir ao enterro, pois constas no
seu testamento.
Lá foram os dois, depois do enterro, quando
conheceu o resto da família, ficou surpreso na leitura do testamento, Luc
deixava o seu apartamento de Paris para ele, bem como toda a sua coleção de
arte.
Não gostou muito da história, foi andar
pela cidade com o Nico, não sei se isso é uma maneira de me comprar mesmo
depois de morto.
Viram uma mansão, com o sobrenome da
família. Quando perguntou ao irmão dele, disse que pertencia a família.
Fez uma proposta, ele abria mão do
apartamento, podia ser vendido, restaurar essa mansão, trazer todos os quadros,
objetos de arte, montar um museu com o nome do Luc, ou mesmo da família.
Ficaram surpresos, creio que o Paul
Ventresi, pode fazer isso por vocês, ele conhecia tudo que o Luc tinha
comprado. Fizeram o acordo, comentou
com o Paul, como se sentia, era como se me comprasse depois de morto, nunca
gostei desse apartamento, me lembro o dia que cheguei aqui, vinha do meu
pequeno apartamento da Men de Sá, entrava nesse apartamento de luxo francês, a
primeira coisa que pensei, não posso viver aqui, tampouco depender dele.
Sabia que Nico tinha negócios em Los
Angeles, foi quando disse que depois da exposição dele tinha que ir até lá
acertar negócios da família, bem como negociar seu livro, já tinha mandado a
uma cópia revisada, isso era uma verdade ele revisava mil vezes, bem como tinha
aproveitado para escrever como um roteiro para cinema, sempre querem comprar
para fazer cinema, mas nunca quero.
A exposição foi bem como sempre, inclusive
os críticos elogiavam seu trabalho, agora tão detalhista, as roupas pareciam
verdadeiras, bem como o rosto das pessoas, alguns detalhes de mãos dos velhos
era impressionante, as tinha desenhado a parte.
Tinha dúvidas se devia ir ao não, mas como
Nico sempre estava presente em tudo de sua vida, resolveu tirar como umas
férias.
Quando chegaram a Los Angeles, a casa do
Nico era em Malibu, em frente a praia, lhe comentou que na verdade era da
empresa familiar.
Sua família era tipicamente uma família
italiana com todos falando alto, ao mesmo tempo, viu que Nico ficava
incomodado, quando viram os catálogos que este tinha levado, para mostrar seu
trabalho para as galerias de lá, riram muito das com o cardeal.
O velho, o patriarca da família, dizia que
odiava a igreja.
O aceitaram bem, Nico estava feliz, nunca
aceitaram meu namorado anterior, mas a ti, te tratam como da família.
Depois entenderia, viu seu quadro dos
meninos, na entrada do edifício da família, riu pois se lembrava da cena.
Um dos irmãos dele, o mais velho, lhe
perguntou diretamente se ficavam.
Nem pensar, minha vida é lá, não aqui.
Queremos que Nico volte a se ocupar dos
negócios da família, os livros, ele pode levar como um passatempo.
Não disse nem um pio, não era com ele, mas
se preocupou.
Nesse dia Nico chegou em casa arrasado,
tinham tido a mesma conversa com ele.
Filhos da puta, sempre o mesmo, me querem,
mas para levar a parte dos negócios que não gostam.
O que achas que devo fazer.
Não respondeu, lhe perguntou do livro?
Temos que ir a NYC, meu editor é de
lá. Foram no dia seguinte, sem avisar
ninguém, iam publicar o mesmo, quando viram o roteiro do livro para cinema,
ficaram contentes.
Financeiramente não preciso deles, tinha
mostrado para o editor os catálogos dele, esse convidou para um jantar em sua
casa, foi quando conheceu seu marido, pois eram casados, tinham uma belíssima
galeria, agora em Chelsea, numa velho armazém, que ele tinha comprado, não vou
fazer como antes, tinha um lugar grande em pleno Soho, mas alugado, o dono me
pediu um preço impressionante para o renovar o aluguel, esse comprei.
Viu o do último trabalho, lhe perguntou se
tinham sobrado quadros?
Eu ainda não acabei essa serie, creio que
dentro de uns dois ou três meses, sim, mas isso terá que negociar com o Paul
Ventresi, meu marchante em Paris.
Eles voltaram com eles, o irmão do Nico
ainda os alcançou em NYC, mas levou na cara a resposta que não esperava, não
necessitava deles, seguiria com sua vida na França.
Paul ainda tinha alguns quadros antigos
dele, que guardava para colecionistas, eram como ele dizia os especiais, Douglas
o dono da Galeria de NYC, comprou vários, por um preço incrível, ele brincando
ainda disse, não preciso trabalhar por anos.
Seu irmão João estava com problemas, tinha
descoberto um câncer desses agressivos, agora se dividia entre Martigues e
Paris, para cuidar do irmão uma semana sim, outra não, assim seu companheiro se
relaxava, o levava as seções de quimio, mas não resistiu muito tempo, mas
antes, avisou sua mãe, que largou tudo em Belo Horizonte, veio ficar com o
filho, agora ela levava os negócios da família.
João, disse na frente de todos, que não
queria que seu corpo fosse para o Brasil, odiaria ser enterrado em Minas
Gerais, prefiro ficar em Martigues, sua mãe foi passar um final de semana com
ele, sempre pensei que meus filhos me enterrariam, agora ver meu filho mais
velho morrendo, vejo a merda que é a fragilidade da vida.
Contou para ele, que seu pai estava na
ruina total, com a outra família, que era complicada, mas ele se meteu nisso,
que resolva seus problemas.
Suas duas irmãs, estavam casadas, uma
delas, trabalhava com sua mãe, essa parece que despertou, estudou administração
de empresas, sei que nunca voltaras para administrar as fazendas os negócios
que temos, por isso acho natural que elas levem isso em frente.
Ele concordou com ela, voltaram para Paris,
pois João, estava tendo uma reação adversa aos medicamentos, quem ajudava muito
era o Jean com a mulher.
Quem os tinha apresentado tinha sido
justamente seu irmão, era padrinho da menina que tinham.
Ele só relaxava quando estava em Martigues,
pintando, por sorte como dizia, tenho o Nico, assim tenho alguém na minha vida.
Sua mãe, fez um comentário interessante,
vocês, levantam conversando um com o outro, sempre tem algo para trocar de
ideia, te vejo inclusive parando para pintar para almoçar, antes não fazia
isso, ele cuida de ti.
Procuro corresponder a isso, leio seus
textos, agora está escrevendo muito para as revistas daqui, finalmente vivemos
na mesma casa, estamos pensando em nos casarmos.
João quando soube, pediu que fosse antes
dele morrer, na verdade foi a última reunião com eles, morreu dois dias depois
dormindo.
Fizeram o que ele tinha pedido, arrumou um
lugar no cemitério de Martigues, o levaram para lá.
Agora quando queria pensar, ia se sentar na
beira do tumulo, para conversar com o irmão.
Ele tinha pedido uma coisa, a mãe não
gostou mas acabou aceitando, nada de cerimonia católica no seu enterro, ele
tinha visto demais.
Ela voltou para o Brasil, mas vinha sempre
no inverno de lá, passar o verão com eles, ficava na antiga casa do Nico.
A exposição, em NYC, fez sucesso, se vendeu
tudo, quem organizou o transporte foram o Douglas e o Paul, agora ele negociava
através dele, outra em San Francisco.
Mas ele pela primeira vez, fez uma coisa,
foi com o Nico ao Brasil, andaram pelas cidades histórias de Minas Gerais,
depois estiveram no Rio.
Andou pelas favelas, com suas roupas
simples era fácil conversar com as pessoas.
Um dia foi abordado por um homem, cheio de
guias no pescoço, foi ao terreiro dele, ali na favela da Santa Marta, o mesmo
jogou para ele, aproveite tua vida, seguiras trabalhando muito tempo.
Disse que ele devia ir a Africa outra vez,
desta vez ao Benin, o berço do Candomblé.
Foram quando voltaram, Nico disse que por
nada desse mundo, perderia essa aventura, bem como não ia deixar seu marido
dando sopa por ali, isso falava as gargalhadas.
Jean foi junto, agora tinha três, filhos.
Foram para passar um mês, ficaram três,
Nico escrevia alguma coisa que tinha surgido na sua cabeça ao conversar com os
jovens, que não viam futuro, o que impressionava os do lugar, era que eles se
adaptavam as circunstâncias.
Nico soube de uma história que o
impressionou, quando voltaram procurou por todos os meios o rapaz da história,
o ajudou.
A história era de dois rapazes, que saíram
andando do Benin, até o Marrocos, para passar para Espanha, através do
estreito, depois irem para França, um deles morreu nessa travessia, num barco desse
que cabem cinco pessoas, mas levam cinquenta.
Escreveu um livro sobre isso, o rapaz ficou
como um filho para eles, um dia começou a trabalhar no restaurante ali da
praia, foi ficando, agora era o dono do local, o tinham ajudado a comprar.
O interessante era que Nico agora escrevia
em francês, tinha feito um curso ali mesmo, aprendido a escrever, tinha uma
senhora, uma velha professora, revisava com ele seus textos, nada de escrever
em inglês, seu livro anterior, acabou sendo filmado lá mesmo, ele reescreveu o
roteiro para trazer a história para Paris.
Depois escreveu um livro, que se chamava Palavras,
Palavras, que falava do encontro deles dois por causa da música.
Agora os dois estavam beirando os sessenta
e cinco, um dia brincando, porque Jean Abdul, reclamava dos seus filhos irem à
universidade, tinham tudo muito fácil, nem tem ideia de aonde sai, quando falo
de ir ao Senegal, me olham como se eu tivesse falando uma heresia.
A única vez que consegui que fossem,
olharam tudo horrorizados, quando disse que era de aonde tinha saído, me
olharam como a um estranho.
Nico lhe comentou depois, esses meninos
depois que fizerem a universidade, irão desaparecer.
Dito e feito, quando Jean ficou viúvo, veio
viver ali com eles, ajudava a administrar o restaurante do rapaz de Benin,
nunca mais voltou a Paris, dizia eu lhes dei tudo, errei, devia ter ido morar
num subúrbio cheio de emigrantes para ele darem valor.
Nico dizia que isso não mudaria nada.
Ele agora levava muito tempo pintando um
quadro, ainda pintava coisas que tinha visto no Benin, a cultura do animismo
sendo devorada pelo mulçumanos.
Dizia ao Jean, é a mesma coisa dos teus
filhos, parece necessário, ir borrando o passado, para sobreviver.
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